Deputado quer Dia das Vítimas do Comunismo no Brasil. Tem lógica?
Intenção de Daniel Silveira (PSL-RJ) é equiparar o comunismo ao nazifascismo. Cientista político considera proposta como “absurda”
atualizado
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O deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) protocolou um Projeto de Lei (PL) para instituir o Dia Nacional em Memória das Vítimas do Comunismo no Brasil. Sem citar números de “genocídios” no país, sugere ainda a promoção de campanhas para “conscientizar” a população da “ameaça comunista”.
O deputado diz que a intenção é colocar, em pé de igualdade, o comunismo e o nazifascismo, ideologia desenvolvida pelos ditadores Adolf Hitler, na Alemanha, e Benito Mussolini, na Itália. Em nível nacional, o parlamentar compara o comunismo com a ditadura militar.
Para o cientista político Eduardo Grin, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a proposta do deputado do PSL é “absurda”. O especialista afirma que nunca houve uma ameaça verdadeira da ideologia no Brasil: no golpe de 1935, o então presidente Getúlio Vargas reprimiu; e, em 1964, o fantasma do comunismo não tinha base real.
“Houve vítimas da luta armada no Brasil, mas o número é incomparavelmente inferior ao de vítimas que foram mortas, torturadas e violentamente reprimidas durante a ditadura militar. Não dá para comparar uma situação na qual o Estado brasileiro prendeu e torturou cidadãos com o fato de que algumas pessoas foram vitimadas na luta armada”, avalia.
Daniel Silveira alega, por sua vez, que não é preciso mensurar qualquer número de vítimas. Ele diz que há muitos índices que aparecem na internet que não são “críveis”. Assim, segundo o deputado, “a gente só tem que relembrar as vítimas do comunismo, que foram em larga escala”.
“Aqui no Brasil, quando tivemos a intentona comunista em 1935, tivemos muitos paramilitares, muitos desses artistas eram comunistas. A própria ex-presidente Dilma Rousseff atentava contra quartéis, jogava bombas, assaltou bancos”, acusa Daniel ao Metrópoles. Em seguida diz que o Foro de S. Paulo também deixou “muitas vítimas”. O deputado não ofereceu qualquer prova para sustentar qualquer uma das duas afirmações. A ex-presidente não aparece como acusada de nenhuma ação armada pelos militares. O Foro de São Paulo é um grupo que reúne agremiações políticas da América Latina em defesa de políticas de esquerda, da área social à econômica.
A proposta de Daniel Silveira é que a data seja lembrada todo dia 31 de março. Não há explicações no projeto. Perguntado sobre o motivo de escolher o dia específico, o deputado disse que não pode falar. “Se eu colocar o porquê, ideologicamente eu seria suprimido”, disse. Em 31 de março de 1964 ocorreu o golpe que derrubou o então presidente João Goulart e instaurou a ditadura militar, que durou 21 anos.
“Tentar colocar as duas coisas no mesmo patamar para justificar que é necessário que o Estado brasileiro também passe a reparar as vítimas do comunismo é criar um falso argumento”, explica Eduardo Grin. “Basta lembrar que os próprios militares foram anistiados em 1979. O Brasil não colocou nenhum militar na cadeia até hoje”, complementa, ao comparar com Argentina e Uruguai.
Mestre em ciência política, Grin avalia que, na verdade, a intenção do deputado é “confundir as pessoas” ao criar uma comparação que não existe. “Uma total incompreensão da história”, resume o especialista.
“Por que um deputado apresenta um projeto como esse? É uma maneira de se manter conectado com a base eleitoral. Basta lembrar que foi ele quem quebrou a placa da Marielle (foto em destaque). Mas depois ele pode dizer que tentou fazer o trabalho dele”, finaliza o cientista político.