De violência a economia, 10 temas separam Lula de Bolsonaro
O ex-presidente e o atual ocupante do Palácio do Planalto pensam e agem diferentemente em todos os assuntos abordados pelo Metrópoles
atualizado
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A polarização entre o bolsonarismo e o petismo, iniciada nas últimas eleições, entrou em nova fase. Dois fatos recentes trouxeram elementos que ajudam a projetar os temas que estarão no centro da corrida eleitoral de 2022.
Primeiro, no dia 8 de novembro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi solto depois de um ano e sete meses preso em Curitiba. Fora da cadeia, o líder petista expôs em discursos algumas de suas intenções para tentar levar o partido de volta ao poder.
“Aos que criticam ou temem a polarização, temos que ter a coragem de dizer: nós somos, sim, o oposto de Bolsonaro”, afirmou Lula neste sábado (23/11/2019) durante o 7º Congresso Nacional do PT.
Na quinta-feira (21/11/2019), o presidente Jair Bolsonaro lançou a sigla pela qual pretende disputar a reeleição para o Palácio do Planalto. Com a Aliança pelo Brasil (APB), o chefe do Executivo mostra com mais nitidez o perfil do seu grupo político mais fiel.
Impedido de se candidatar devido à condenação em segunda instância, Lula não sabe se estará na cédula eleitoral na sucessão de Bolsonaro. De qualquer forma, caso continue solto, o ex-presidente terá papel importante nos palanques de 2022.
Com o centro político ainda disperso, as perspectivas para a próxima eleição permanecem em torno do confronto entre o atual e o ex-presidente. O Metrópoles selecionou dez assuntos com potencial para influenciar na escolha dos brasileiros para o Palácio do Planalto. Confiram.
1 – Economia/desemprego
Bolsonaro aposta na melhora dos índices econômicos ao longo do mandato para fortalecer o discurso eleitoral. Por enquanto, tem a apresentar a criação de 840 mil empregos com carteira assinada e sinais discretos de recuperação do comércio. A retirada de direitos trabalhistas, porém, relativiza o retorno eleitoral desse resultado.
Como estratégia, o presidente buscará comparar seus resultados com os números ruins do governo Dilma Rousseff. Pelas circunstâncias atuais, não terá cacife para se contrapor aos oito anos de Lula.
O petista recorrerá ao desempenho de seu governo. No final de 2010, último ano, o desemprego estava em 5,3%. Hoje, encontra-se em patamar superior a 11%.
2 – Corrupção
Ponto forte do discurso de Bolsonaro em 2018, o combate à corrupção certamente será explorado em profundidade nas próximas eleições. Nesse tema, Lula entra em larga desvantagem devido ao histórico do PT, fortemente atingido pela Operação Lava Jato.
Mas Bolsonaro ainda está no primeiro ano de governo. Não se pode prever se, daqui a três anos, serão descobertos casos de desvios de conduta.
Contra integrantes e aliados do governo atual pesam as denúncias do “laranjal” do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e as suspeitas de irregularidades no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio, onde trabalhava o ex-PM Fabrício Queiroz.
3 – Funcionalismo público
As relações históricas com os servidores, por meio dos sindicatos, tornam o PT majoritário nesse segmento. O fato de Bolsonaro apresentar medidas de arrocho e, também, pela intenção de flexibilizar a estabilidade nos empregos renovam a aliança entre petistas com o funcionalismo público.
Essa conexão, porém, tem efeito contrário na parcela da população crítica ao tamanho do Estado e dos benefícios conquistados pelos servidores a partir da redemocratização. Esse debate tende a se tornar mais acirrado à medida que a eleição se aproxima.
4 – Religião
Na eleição de 2018, Bolsonaro obteve retumbante sucesso na estratégia de apostar nos votos dos evangélicos. Tentará repetir a retórica conservadora e radical sobre família empregada mantida durante o governo.
PT não demonstrou ter uma fórmula para desmontar as alianças do presidente nessa área. Mas deve investir em críticas à intolerância religiosa dos pastores e fieis mais radicais.
5 – Meio ambiente
O aumento do desmatamento na Amazônia este ano e a reação desnorteada do governo em relação ao vazamento de óleo no litoral fragilizam Bolsonaro. Na mesma linha, os adversários ainda têm para explorar a flexibilização das regras para uso de agrotóxicos.
Nesse setor, os petistas também têm passivos, como a construção da usina de Belo Monte, responsável por um impacto negativo de grandes proporções para a floresta e para as comunidades locais.
6 – Democracia/autoritarismo
Admirador de ditaduras e do torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, Bolsonaro tem perfil oposto aos petistas nesse tema. A discussão sobre uma hipotética volta de atos institucionais reforça a afinidade do governo atual com o autoritarismo.
Formado durante a redemocratização do país, o PT busca resgatar o apoio da maioria dos brasileiros para os valores consolidados a partir do final do regime militar.
Possíveis manifestações de rua até 2022 servirão de termômetro para medir a disposição do capitão em arrastar o Brasil de volta para o obscurantismo político.
7 – Política externa
Nesse campo, o governo Bolsonaro demonstrou sólidos preconceitos ideológicos e flagrante despreparo. A tentativa frustrada de transferir a Embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém foi um dos maiores exemplos.
O apoio à tentativa de reeleição do presidente argentino Maurício Macri representou outro desastre de Bolsonaro. O discurso errático em relação à China, também.
O PT de Lula terá espaço para buscar aproximação com os setores empresariais prejudicados pelos movimentos sem sentido do governo. Acenará com o retorno da agenda internacional multilateral.
8 – Segurança/Violência
Esse foi um dos temas mais explorados por Bolsonaro para chegar ao Planalto. Também nessa área, o contraste do governo com o PT divide a opinião dos brasileiros.
A ênfase de Bolsonaro na flexibilização do uso de armas e a defesa da “excludente de ilicitude” para as forças policiais aprofundam as diferenças. Setores que sustentam o presidente, como os representantes do agronegócio e da “bancada da bala”, apoiam essas medidas. O aumento da violência nas administrações petistas e a redução dos índices nos últimos dois anos favorecem o governo.
Mas a morte de inocentes em operações policiais – como aconteceu com a menina Ágatha Félix – revela os riscos e a crueldade dessa política. O PT vai se contrapor com a defesa dos direitos humanos. Porém, ainda carece de um conjunto de propostas que reverta o desgaste dos maus resultados na segurança pública.
Os últimos desdobramentos da morte da vereadora Marielle Franco (PSol) acarretaram em desgaste para a família do capitão, em especial pela proximidade com milícias. Filho do presidente, o também vereador Carlos Bolsonaro está com o nome no radar da Polícia Civil do Rio de Janeiro na investigação sobre esse caso.
9 – Educação
Setor concentra alguns dos confrontos mais explícitos entre a esquerda e a direita. Em maio, manifestações contra a política educacional ocuparam as ruas de 129 cidades no país.
A agressividade do ministro da Educação, Abraham Weintraub, contra as universidades e a tentativa de controlar o ambiente escolar com critérios morais fornecem argumentos para o PT manter a hegemonia nesse segmento. Governos petistas quase triplicaram investimentos em educação.
10 – Militares
O capitão Bolsonaro contou com total apoio das Forças Armadas para se eleger presidente. Os militares se voltaram contra a esquerda nos últimos anos depois de convivência profissional com os governos petistas, quando contaram com significativos investimentos em projetos como a compra de aviões de caça.
Depois de solto, Lula disse que pretende se reaproximar dos quartéis. O fato de Bolsonaro ter descartado do governo generais prestigiados na tropa, como ex-secretário-geral da Presidência da República, Carlos Alberto Santos Cruz, não muda o pensamento antiesquerdista majoritário nesse segmento, mas levará os militares a refletir sobre o desgaste das Forças Armadas no governo do capitão.