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De evangélicos à Opus Dei: como a religião influencia Geraldo Alckmin

O pré-candidato ao Palácio do Planalto está cercado de religiosos em busca de votos. O cristianismo acompanha o tucano desde criança

atualizado

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Eduardo Nocolau/Estadão Conteúdo
alckmin rezando
1 de 1 alckmin rezando - Foto: Eduardo Nocolau/Estadão Conteúdo

Católico fervoroso e declarado, o postulante à Presidência da República Geraldo Alckmin flerta também com os evangélicos em busca de votos nas eleições de outubro. O ex-governador de São Paulo pelo PSDB aumentou, nos últimos meses, sua agenda em igrejas e templos, além de receber pastores e demais lideranças cristãs, toda semana, desde que começou sua campanha para chegar ao Palácio do Planalto.

A influência religiosa na vida e carreira do tucano não é uma novidade, pelo contrário. Alckmin desde criança foi criado pelos preceitos do catolicismo e, frequentemente, é relacionado à Opus Dei, uma prelazia – ou diocese – mais conservadora da Igreja Católica Apostólica Romana. Desde que sua ligação com essa doutrina começou a circular de forma mais intensa, ainda em 2011, o pré-candidato nega participação na linha cristã.

“Meu pai era e minhas irmãs são da Opus Dei”, conta José Eduardo Rangel Alckmin, primo do presidenciável e filho do já falecido José Geraldo Rodrigues de Alckmin. Foi por conta do tio ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) que o ex-governador tucano começou a ganhar fama de pertencer à organização religiosa.

O Geraldo [político] morou com a gente durante um ano, ainda menino, quando ia prestar vestibular. Ele é um católico praticante, anda com um terço na mão. Tem até uma história engraçada, quando fomos andar de avião e ele estava com medo. Falei para a gente rezar o rosário com os cinco mistérios

José Eduardo Rangel Alckmin - primo do presidenciável Geraldo Alckmin

Porém, o parente – e também advogado de Alckmin – nega que o postulante ao Executivo nacional seja ligado à Opus Dei. “Nossos avós eram muito religiosos lá em Guaratinguetá, interior paulista. Com isso, os nossos pais sempre foram muito próximos também. Mas meu pai seguiu a linha da prelazia e virou membro, enquanto o pai do Geraldo tinha uma linha mais franciscana”, argumenta José Eduardo.

Ainda de acordo com o primo do ex-governador de São Paulo, o pré-candidato à Presidência da República pode ser definido como um devoto. Frequenta igrejas católicas na cidade paulista, principalmente a Nossa Senhora do Brasil, no Jardim América. No mesmo templo, foi realizada, em 2015, a missa de sétimo dia do filho de Geraldo Alckmin, Thomaz Alckmin. O rapaz morreu após uma queda de helicóptero.

Opus Dei x Franciscanos
Doutor em teologia pela Universidade de São Paulo (USP), o padre João Carlos Almeida explica a diferença entre a prelazia Opus Dei e a Ordem dos Franciscanos. As duas linhas católicas são citadas pelo primo de Geraldo Alckmin, pois determinaram os preceitos cristãos seguidos pela família do presidenciável.

“A Opus representa um catolicismo conservador, apesar de recentemente estar um pouco mais aberta e tolerante ao diálogo. Enquanto isso, os franciscanos têm um caráter de reforma e revolução”, descreve o religioso.

O líder espiritual faz uma analogia com as linhas políticas brasileiras, dando a entender que o candidato ao Palácio do Planalto pelo PSDB tem o perfil da prelazia da Igreja Católica. “O Alckmin representa uma força de centro-direita, assim como a Opus Dei. Já a Ordem dos Franciscanos tem um viéis de esquerda. Um integrante, por exemplo, é o teólogo Leonardo Boff – conhecido por sua defesa dos direitos dos pobres e excluídos”, completa padre Joãozinho, como é conhecido.

O fato de Alckmin ser político não impediria sua ligação com a Opus Dei. Com base em um texto divulgado pela organização, “os leigos incorporados à prelazia não modificam a sua própria condição pessoal, teológica e canônica, de fiéis leigos correntes, e como tal atuam em tudo. As autoridades devem abster-se totalmente até mesmo de dar conselhos nessas matérias”.

Além de boatos e da ligação do tio de Geraldo Alckmin com a organização católica, em 2011, o WikiLeaks vazou um telegrama assinado pelo então secretário de Subprefeituras do governo de São Paulo, André Matarazzo, confirmando a participação do tucano na Opus Dei.

RAFAEL ARBEX/ESTADÃO CONTEÚDO
Alckmin é católico fervoroso e há quem garanta que ele pertença à prelazia da Opus Dei – ala radical e conservadora da Igreja Católica

“Como um católico conservador é claro que Alckmin é membro da Opus Dei, apesar de não ser um dos líderes do grupo. Alckmin tem uma certa postura direitista no seu estilo de governar, o que ajuda a explicar por que ele tem o apoio de um segmento tão grande do empresariado”, diz o documento, de 2006, direcionado ao então cônsul americano Christopher McMullen. Procurado, Matarazzo preferiu não voltar ao assunto.

Vale lembrar que, quando era prefeito de Pindamonhangaba, em 1978, data do cinquentenário da Opus Dei no Brasil, o postulante ao Planalto homenageou o criador da ordem católica com um endereço da cidade. Na Vila Rica, a Rua Monsenhor Escrivá de Balanguery ainda segue com o mesmo nome. De acordo com fontes ouvidas pelo Metrópoles, o pré-candidato carrega também, na carteira, um bilhete com o ensinamento número 702 de Escrivá há quase 30 anos. O texto foi presente de seu pai.

Há ainda quem garanta que o então governador de São Paulo se reunia com um grupo de empresários, advogados e juristas no Palácio das Bandeiras, sede do governo estadual, para receber preleções da Opus Dei sobre a vida cristã a ser seguida. A ideia dos encontros teria sido de Carlos Alberto Di Franco, um dos membros mais influentes da organização no Brasil. Ele é representante no país da Escola de Comunicação da Universidade de Navarra, Espanha.

Outras pessoas influentes que participariam das reuniões no palácio paulista são João Guilherme Ometto, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Benjamin Funari Neto, ex-presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, e Márcio Ribeiro, ligado à indústria têxtil. Nenhum deles quis comentar os possíveis encontros ou a aproximação com o presidenciável.

Em nota enviada ao Metrópoles, a Opus Dei informou que o Alckmin não pertence à organização religiosa. “A prelazia não interfere na escolha profissional de seus membros. Eles exercem as mais variadas profissões: são médicos, professores, motoristas, garçons e engenheiros. O mesmo vale para alguém que queria exercer a política. Esse amor à liberdade vale também para quem queira sair do Opus Dei. Não conheço ninguém que tenha sido expulso”, afirma o comunicado.

Flerte com os evangélicos e contrário ao aborto
Não só da Igreja Católica deriva a influência religiosa do tucano. Dentro do próprio PSDB, há uma organização denominada de Núcleo Cristão, comandado por três pastores evangélicos do estado de São Paulo. O presidente é o diácono Edson Mota, da Igreja Brasil para Cristo. “O Alckmin vem atendendo os religiosos, nós [pastores] fazemos a articulação com os templos e acompanhamos o ex-governador nos cultos e reuniões”, explica.

Ainda de acordo com Mota, a intenção dos religiosos é expandir o núcleo cristão para todo o país, caso o postulante ao Planalto seja eleito presidente da República. “Durante as eleições, estamos fazendo agendas periódicas com o pré-candidato nas igrejas. Quando ele não pode ir, nós vamos e colhemos as demandas e apresentamos à coordenação de campanha. De todo modo, o núcleo se reúne semanalmente com o Alckmin. Sempre nos falamos por telefone também”, completa o diácono, que é filiado ao partido desde 2008.

Um dos fundadores do PSDB paulista, o pastor Geraldo Malta, da Assembleia de Deus, é presidente de honra do núcleo cristão da legenda. O religioso conta que, apesar de o presidenciável ser católico, “é uma pessoa de família, tem posicionamento contra o aborto, contra a identidade de gênero, vai sempre aos cultos” e, por isso, conta com o apoio dos evangélicos. “A aceitação dele nas nossas igrejas é ótima porque os principais líderes evangélicos do país moram em São Paulo e têm fácil relacionamento com o Geraldo”, completa Malta.

Para o professor em direito e especialista em religião Hector Vieira, essa relação entre igrejas e políticos que podem vir a dirigir o Estado é perigosa. “Nos últimos 20 anos, os evangélicos aumentaram e, hoje, podemos ver a influência disso no parlamento brasileiro. Essa mistura é arriscada a partir do momento que os interesses privados dos fiéis e seus comandantes passam a ser prioridade para o setor público”, pontua Vieira.

O especialista criticou, por exemplo, o fato de o diácono Edson Mota dizer, durante entrevista ao Metrópoles, que os evangélicos esperam “benefícios” de Alckmin, caso o tucano seja eleito à Presidência da República. “Estamos enfrentando dificuldades para conseguir o alvará definitivo das sedes das maiorias das igrejas. Em São Paulo, quase 70% dos templos precisam de regularização, acredito que o número seja parecido em todo o Brasil”, afirmou Mota.

Procurada, a assessoria de imprensa do ex-governador paulista não quis comentar a influência da religião e dos evangélicos em sua vida e carreira política. Em junho, durante sabatina realizada pelo portal, Alckmin comentou o assunto e afirmou que não há razão para tributar as igrejas. “O templo não produz, não é uma atividade produtora e a Igreja é, sim, uma atividade importante. Mas o governo deve ser laico, não pode haver vínculo entre Estado e Igreja, no entanto, isso não quer dizer que você é contra ela”, ponderou.

Sou uma pessoa que respeita os valores embutidos na Igreja. Ela só traz benefícios: ajuda a família, evangeliza, investe na parte social. 

Geraldo Alckmin, pré-candidato à Presidência da República

Davi Lago, mestre em política e estudioso do tema religião, afirma que evangélicos e católicos representam 87% dos brasileiros. Para ele, o tucano, enquanto membro dessas igrejas, dificilmente irá tentar propor mudanças “moralistas” para o país. “Não acredito que os fiéis vão determinar a escolha do presidente, ainda mais porque Jair Bolsonaro (PSL) e Marina Silva (Rede) também são cristãos e os votos serão divididos entre eles e o Alckmin. No entanto, na medida em que o debate político começar a ameaçar os valores desses religiosos, eles não vão aceitar”, assinala.

O Padre João Carlos Almeida deu uma dica do que os católicos não aceitarão de chefe do Executivo nacional que representa o meio cristão. “O Alckmin é um homem religioso, mas acredito que fará uma política leiga. Apesar disso, um político que se diz católico não pode votar a favor do aborto, por exemplo. Porque isso significa ir contra os preceitos da Igreja”, completa o líder espiritual.

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