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Criado no governo Dilma, vale-cultura alcançou 1,4% do público estimado

No ano passado, 561,3 mil trabalhadores foram beneficiados. A então ministra da Cultura, Marta Suplicy, estimara adesão de até 42 milhões

atualizado

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Marcelo Camargo/Agência Brasil
Marta Suplicy – Marcelo Camargo-Agência Brasil
1 de 1 Marta Suplicy – Marcelo Camargo-Agência Brasil - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Sete anos após o lançamento, o vale-cultura — benefício de R$ 50 mensais pago a trabalhadores com carteira assinada para usar na aquisição de bens e serviços culturais — não vingou e segue como um programa do governo federal de baixa adesão.

Dados obtidos pelo Metrópoles junto à Secretaria de Cultura, do Ministério do Turismo, apontam que, no ano passado, 561,3 mil trabalhadores foram beneficiados pelo vale-cultura. O número é pouco maior que o registrado em 2018: 551,7 mil.

Ao longo dos últimos anos, o crescimento do número de trabalhadores beneficiados foi bastante tímido. Em 2013, ano de lançamento, 806 ganharam o vale-cultura — o programa começou a valer apenas em novembro.

No ano seguinte, em 2014, o primeiro em efeitos concretos, 369,2 mil brasileiros participaram da iniciativa; em 2015, 468,3 mil; e, em 2016, 520,5 mil. A partir de então, o programa ganhou menos de 20 mil trabalhadores anualmente, até chegar às cifras atuais.

Isso significa que apenas 1,4% do público estimado inicialmente pelo antigo Ministério da Cultura (transformado em secretaria pelo presidente Jair Bolsonaro) aderiu ao programa, voltado a quem ganha até cinco salários mínimos.

De acordo com projeções da pasta publicadas em outubro de 2013, véspera do lançamento oficial do programa, “o vale-cultura poderia chegar às mãos de 42 milhões de trabalhadores brasileiros que ganham até cinco salários mínimos”.

Na ocasião, a então ministra da Cultura de Dilma Rousseff (PT), Marta Suplicy (hoje sem partido), disse que o programa seria um “alimento da alma” para os trabalhadores. A senadores, afirmou que o vale-cultura viraria “a marca do ministério”.

“Ele é importante para o trabalhador, que vai poder ter mais uma opção de acesso à cultura”, disse, em São José dos Campos (SP). “Nós temos muita esperança de que as empresas se animem e entrem, porque vai mudar a qualidade de vida do seu funcionário”.

Conforme os dados mais recentes da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), cujos dados de 2019 foram divulgados em outubro pelo Ministério da Economia, cerca de 37,5 mil brasileiros ganham, atualmente, até cinco salários mínimos.

No entanto, o público que pode se beneficiar do programa é mais amplo, uma vez que o trabalhador que ganha mais que cinco salários mínimos também pode receber o vale-cultura — neste caso, parte do benefício é obrigatoriamente descontado na folha salarial.

Falta de incentivo

Professora de economia da área de cinema e audiovisual da ESPM, Neusa Nunes explica que o programa perdeu tração sobretudo após o fim do incentivo fiscal concedido às empresas que pagam o vale-cultura e que são tributadas com base no lucro real.

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Na legislação que cria o programa, o governo possibilitou às empresas beneficiárias a possibilidade de deduzir o valor do benefício em até 1% no Imposto de Renda devido. O dispositivo, porém, deixou de valer em 2016 e não foi prorrogado.

Dessa maneira, apesar da “interrupção” do incentivo fiscal, o que não impede que as empresas participem do programa, o vale-cultura deixou de ser atraente para o empresário, segundo Neusa.

“O vale-cultura deixou de ser um programa de política pública e passou a ser mais um benefício que as empresas poderiam oferecer ao mercado”, afirma a especialista, ao complementar com o lado das empresas operadoras do programa.

“Imagine o vendedor do Sodexo. Ele chega no cliente e diz que tem mais esse vale para poder oferecer ao funcionário. Se não tem um incentivo, o empresário vai enxergar apenas como um produto que se pode oferecer aos funcionários”, diz.

O problema é acompanhado por uma má gestão sobre o vale-cultura. Relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) publicado em 2017, ao qual o Metrópoles teve acesso, aponta que o programa não tem sido acompanhado pelo então Ministério da Cultura.

De acordo com o texto, tanto a Secretaria do Audiovisual quanto a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura não dispõem de qualquer metodologia de avaliação dos resultados dos projetos incentivados para as políticas públicas, como o vale-cultura.

“Ambas unidades não realizam a avaliação de resultados e essa fragilidade na execução da política pública vem sendo acompanhada por esta unidade técnica desde exercícios anteriores”, informou a controladoria, ao afirmar que o problema ocorre ao menos desde 2014.

Outro lado

A Secretaria de Cultura do Ministério do Turismo foi procurada, mas não se manifestou até o fechamento desta reportagem. A pasta foi questionada, dentre outros pontos, sobre quais os avanços que pretende apresentar em relação ao programa. O espaço segue aberto.

No fim de 2018, o Ministério da Cultura firmou parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para divulgação e expansão do vale-cultura. A ação, no entanto, não rendeu frutos, uma vez que o número de beneficiários praticamente não cresceu.

Além disso, o ex-secretário de Cultura do governo Bolsonaro Roberto Alvim — exonerado após publicar vídeo com referências nazistas — se comprometeu, em 2019, a avaliar as possibilidades de atualizar o valor do vale-cultura, que sempre foi de R$ 50.

Considerando o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o índice oficial da inflação, entre 2013 e 2019, o vale-cultura deveria pagar, pelo menos, R$ 73,85 para que os brasileiros que usam o benefício não perdessem poder de compra. O valor, porém, segue inalterado.

A ex-ministra da Cultura Marta Suplicy também foi procurada pelo Metrópoles para comentar o assunto, uma vez que foi uma das principais incentivadoras do programa, mas não se pronunciou sobre o caso.

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