Congresso: propostas de aumento de pena crescem 257% neste ano
Em 2019, nas duas Casas, foram 161 proposições de aumento de penas para uma variedade de crimes. Cenário preocupa especialistas
atualizado
Compartilhar notícia
O endurecimento de penas voltou a ser uma das principais pautas do Congresso em 2019. As proposições desse tipo enviadas até a última quinta-feira (20/11/2019) já superam todo 2018.
Entre janeiro e novembro deste ano, os parlamentares apresentaram 161 projetos de leis (PLs) que aumentam ou agravam penas dos mais variados crimes. O número representa aumento de 257% em comparação aos 12 meses anteriores, que registraram 45.
Uma análise mais aprofundada revela que desde 2015 a quantidade de proposições nunca foi maior do que o deste ano. Na ocasião, as duas Casas Legislativas receberam 95 pedidos.
O levantamento foi realizado pelo (M)Dados, núcleo de análise de grande volume de informações do Metrópoles. A equipe examinou todos os PLs dos últimos cinco anos. Para fazer a contagem, foram considerados os pedidos de aumento, agravamento ou causa de aumento de pena.
Na Câmara dos Deputados, foram 133 projetos do tipo, entre os 5 mil enviados em 2019 – o que corresponde a 2,6% do total. É o ano com a maior número e taxa desde 2015, revela o estudo.
A reportagem também considerou os partidos dos parlamentares que são autores dos projetos. Neste ano, a sigla que lidera o levantamento é o PSL, com 31 proposições. Em seguida, aparecem o PV, com 15, e o Podemos, com 13.
Por sua vez, no Senado Federal, os projetos são em menor quantidade. Foram 28, de um total de 1,1 mil apresentados na Casa (2,4%). Em quantidade absoluta, também foi o ano com mais PLs do tipo. Quanto à taxa, perde só para 2015 e 2016.
No Senado, contudo, a antiga legenda do presidente Jair Bolsonaro (hoje sem partido) não lidera o ranking. O PSL aparece na terceira posição, com 4 propostas, atrás de Podemos (12) e Rede (5).
Proposta populista penal
Professora e pesquisadora de criminologia e políticas criminais do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFRJ, Miriam Krenzinger explica que pautas dessa natureza são um fenômeno mundial.
A especialista classifica essas propostas como de caráter “populista penal”. Ou seja, o parlamentar acaba por usar o medo das pessoas como moeda política para chegar ao poder ou se manter nele.
“A questão do aumento da pena privativa de liberdade é uma grande falácia, um grande engodo na população, que se sente insegura e com medo”, destaca a docente.
Sistema carcerário
O crescimento de projetos com temática de agravamento de penas contrasta com um grande problema do país: a superlotação do sistema carcerário brasileiro.
Dados mais recentes do Ministério da Justiça e Segurança Pública revelam que, em 2017, foi registrada uma taxa de 171,62% de ocupação nas prisões brasileiras.
Assim, de 423 mil vagas existentes na época, havia 726 mil pessoas privadas de liberdade. Para piorar, a disparidade vem crescendo a cada ano, conforme mostra tabela abaixo.
Miriam destaca que, ao contrário do que acontece atualmente, o poder público deveria pensar em uma política criminal pelo desencarceramento.
Professor de Antropologia do Direito da UnB e pesquisador do Grupo Candango de Criminologia (GCCrim), Welliton Caixeta Maciel segue a mesma linha de pensamento e critica a quantidade de projetos com o objetivo de aumentar a extensão penal.
“Esse discurso acaba confrontado com a necessidade de pensar medidas alternativas”, salienta, ao pontuar formas mais humanas e efetivas de socializar os presos, como a tornozeleira eletrônica.
Welliton explica que essa população é vista como um depósito humano, e o Estado tem começado a olhar cada vez mais para esse contingente como uma fonte possível de lucro.
“Aumentar a pena acaba sendo nada mais que enxugar gelo. Hoje, o Brasil é o terceiro país com a maior população carcerária do mundo. Podemos chegar ao topo caso não se reverta esse ímpeto punitivista”, finaliza.