Coaf aponta que Flávio Bolsonaro pagou título de R$ 1 milhão
Órgão não conseguiu indicar favorecido. Novo trecho do documento, obtido pelo JN, cita operações muito parecidas com as de Fabrício Queiroz
atualizado
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A edição da noite deste sábado (19/1) do Jornal Nacional revelou novo trecho do relatório produzido pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), sobre movimentações bancárias atípicas do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). O documento aponta que o filho do presidente da República fez um pagamento de R$ 1.016.839 de um título bancário da Caixa Econômica Federal. Contudo, o órgão ligado ao Ministério da Economia não conseguiu identificar o favorecido. Também não há data e nenhum outro detalhe do pagamento.
O documento cita que o senador eleito tem operações muito parecidas com as feitas por Fabrício Queiroz, seu ex-assessor, cujas operações financeiras foram consideradas atípicas pelo Coaf e são investigadas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. As datas, contudo, são diferentes.
Em comum, nos dois relatórios do Coaf, constam:
– os depósitos e saques eram feitos em caixas de autoatendimento dentro da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj);
– as operações eram em espécie;
– os valores eram fracionados.
Nessa sexta-feira (18/1), o Jornal Nacional já havia mostrado que um novo relatório foi pedido pelo Ministério Público do Rio ao Coaf, a partir da investigação de movimentação financeira atípica de assessores parlamentares da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
O objetivo era constatar se servidores repassavam parte de seus vencimentos aos chefes. O documento relatou quase 50 depósitos em dinheiro numa conta do deputado estadual e senador eleito pelo Rio de Janeiro Flávio Bolsonaro.
O MP pediu o novo relatório ao Coaf em 14 de dezembro e foi atendido no dia 17, um dia antes de Flávio Bolsonaro ser diplomado senador. Portanto, segundo o Ministério Público, ele não tinha foro privilegiado na ocasião. Por causa do primeiro levantamento produzido pelo Coaf, que constatou movimentações financeiras atípicas na conta de um dos assessores de Flávio, o parlamentar questionou a competência do MP.
Flávio Bolsonaro pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão temporária da investigação e a anulação das provas. Ele foi citado no procedimento aberto pelo Ministério Público do Rio contra Fabrício Queiroz. O ex-assessor de Flávio Bolsonaro é investigado por movimentação suspeita de R$ 1,2 milhão durante um ano.
Na última quarta-feira (16), durante o recesso da Corte, o ministro de plantão, Luiz Fux, recebeu a reclamação de Flávio Bolsonaro e decidiu suspender as investigações temporariamente até uma decisão de Marco Aurélio Mello, relator do caso. Segundo Fux, provas poderiam ser anuladas se não tivesse determinado a suspensão.
O novo relatório do Coaf analisa movimentações de Flávio Bolsonaro entre junho e julho de 2017. Foram 48 depósitos na conta do então deputado estadual, agora senador eleito, em apenas cinco dias.
Todos os depósitos foram no mesmo valor: R$ 2 mil – o limite permitido em dinheiro nos caixas automáticos da Alerj. No total, foram R$ 96 mil em cinco datas:
- 9 de junho de 2017: 10 depósitos, no intervalo de 5 minutos;
- 15 de junho de 2017: mais 5 depósitos, em 2 minutos;
- 27 de junho de 2017: outros 10 depósitos, em 3 minutos;
- 28 de junho de 2017: mais 8 depósitos, em 4 minutos;
- 13 de julho de 2017: 15 depósitos, em 6 minutos.
O relatório que analisou as operações na conta de Flávio Bolsonaro foi um desdobramento do primeiro documento do Coaf. Nesse levantamento apareciam as movimentações Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, que, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, movimentou R$ 1,2 milhão. Também chamou atenção do órgão do Ministério da Economia um cheque depositado na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, no valor de R$ 24 mil, e que seria devolução de um empréstimo concedido a Queiroz por Jair Bolsonaro.
O ex-assessor de Flávio recebeu 59 depósitos em dinheiro em valores fracionados que somavam R$ 216 mil. Entravam na conta de Queiroz no mesmo dia ou poucos dias depois do pagamento dos salários dos servidores. O ex-policial militar, desligado em outubro do gabinete de Flávio na Alerj, também sacou R$ 159 mil em caixas automáticos dentro da Casa.
Com base na análise dos dados do Coaf, o MP abriu 22 investigações contra funcionários e ex-funcionários da Alerj. Todas relacionadas a movimentações bancárias suspeitas.
Os relatórios do Coaf que citam Queiroz e Flávio dizem respeito a períodos diferentes. No caso do senador eleito, a maioria dos depósitos também foram feitos perto da data pagamento na Assembleia.
Segundo a reportagem do Jornal Nacional desta noite, o Coaf diz que não foi possível identificar quem fez esses depósitos, e que o fato de serem valores fracionados desperta a suspeita de ocultação da origem do dinheiro. Isso com base na circular do Banco Central que trata de lavagem de dinheiro: “a realização de operações que por habitualidade, valor e forma configuram artifício para burlar a identificação dos responsáveis e dos beneficiários finais”, diz a circular.
Outro lado
Ao Jornal Nacional, o MPRJ disse que recebeu os dados brutos do Coaf e se ateve aos fatos que indicavam possíveis irregularidades. Só depois dessa análise é que pessoas poderão ser investigadas. Segundo a reportagem, o MP esclareceu, ainda, que tomou cuidado para que nada fosse divulgado antes do processo eleitoral, para que nenhum parlamentar fosse prejudicado. E que deu prioridade a fatos investigados de acordo com a hierarquia das autoridades políticas e de servidores.
O senador alega que o Ministério Público do Rio se utilizou do Coaf para criar atalho e se furtar ao controle do Poder Judiciário, e que burlou as regras constitucionais de quebra de sigilo bancário e fiscal. O MP explica que não houve quebra de sigilo, e que o relatório de inteligência do Coaf apresenta, apenas, as movimentações consideradas atípicas.
O telejornal lembrou que decisões do Supremo e do Superior Tribunal de Justiça confirmaram que o MP pode obter informações do Coaf sem necessidade de pedido à Justiça, e se baseia, ainda, numa norma do Conselho Nacional do MP que permite a solicitação de relatório de inteligência ao Coaf.
O Jornal Nacional procurou a assessoria de Flávio Bolsonaro, mas não teve resposta.