Carta de indígenas denuncia pressão de Damares para reduzir terra demarcada
Segundo documento, a reunião “supresa” contou com a presença de fazendeiros e de enviados da ministra ao sul do Pará
atualizado
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Um grupo de indígenas da etnia Parakanã, que vive na terra indígena Apyterewa, no sul do Pará, acusou o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH), comandado pela ministra Damares Alves, de intermediar e participar de uma reunião “surpresa” com fazendeiros para pressionar caciques a aceitar uma proposta de acordo que inclui a redução do tamanho da área destinada aos indígenas. As informações foram divulgadas primeiramente pelo jornal O Globo e confirmadas pelo Metrópoles.
De acordo com a reportagem, a informação está em uma carta divulgada no domingo e em depoimento feito ao Ministério Público Federal (MPF) aos quais o jornal teve acesso. Um índio, ouvido em depoimento, informou que que lideranças ficaram presas e sem comunicação externa em uma fazenda por três dias até concordarem com a redução das suas terras.
De acordo com o jornal, a pasta não respondeu aos questionamentos feitos pela reportagem. Também não houve resposta da Vice-Presidência e da Funai, órgãos também procurados.
Na tarde desta segunda-feira (30/11), a ministra criticou em suas redes sociais as informações divulgadas na matéria.
Matéria enviesada e mentirosa. Publicada sem nem ter nosso lado. Não quis saber. Fomos lá mediar, encerrar um conflito, pacificar com o objetivo de evitar confronto. E a pedido da PF. Queriam sangue de indígenas e agrários, é isso? Facilita o discurso ideológico? Francamente… pic.twitter.com/Krmi6ZqvF1
— Damares Alves (@DamaresAlves) November 30, 2020
Região é alvo
Localizada entre os municípios de São Felix do Xingu e Altamira, no sul do Pará, a terra indígena Apyterewa tem aproximadamente 773 mil hectares e foi homologada em 2007. A região é alvo de grileiros, fazendeiros e madeireiros.
Em maio de 2020, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acolheu um pedido da prefeitura de São Félix do Xingu para que fosse iniciado um processo de conciliação com os índios para a redução do tamanho do território indígena.
Na carta a Associação Tato’a, que congrega lideranças da etnia Parakanã, há relatos de que caciques foram surpreendidos por uma reunião iniciada no dia 18 de outubro, na sede de uma fazenda irregular, dentro da terra indígena. A reunião contou com a presença de fazendeiros e uma comitiva do MMFDH.
“A Associação Indígena Tato’a, que representa o povo e as comunidades Parakanã da terra indígena Apyterewa, sul do estado do Pará, vem ao público manifestar o repúdio à tentativa do Governo Federal de promover atos que, de forma assediosa e enganosa, visam forçar uma conciliação do nosso povo com os invasores da terra indígena, com objetivo de reduzir o nosso território tradicional”, informa o documento.
“Inicialmente, algumas das nossas lideranças foram chamadas para participarem de reunião na base de proteção da Funai, com objetivo de tratar da invasão da terra indígena. No meio do caminho, foram deslocados para sede de uma Fazenda na região do Paredão, na qual já se encontravam representantes do Ministério de Direitos Humanos, representantes dos invasores e da prefeitura de São Félix do Xingu. Neste momento, ficou claro o objetivo da reunião: pressionar as lideranças presentes para aceitarem a proposta de redução dos limites do território”, relata a carta.
A associação acusa o governo federal de atuar em conluio com os fazendeiros para prejudicar os indígenas. “Mais uma artimanha do governo federal, aliado com os invasores e com a Prefeitura de São Félix, para causar divisão interna e confundir as lideranças do povo Parakanã, com a eterna promessa de que a redução do território resolverá os conflitos e trará paz ao povo Parakanã”, diz outro trecho do documento.
De acordo com a reportagem, em depoimento prestado na semana passada ao MPF, um indígena que participou da reunião em outubro diz que as lideranças foram vítimas de uma “armadilha” presenciada e intermediada por ao menos um servidor do MMFDH. Ele informou ao MPF ainda que os indígenas ficaram “presos” na sede de uma fazenda ilegal por três dias até que algumas lideranças concordassem com a proposta de redução da terra.