Bolsonaro diz que mudanças no marco temporal acabarão com agronegócio
Supremo Tribunal Federal debate tese que restringe direito de ocupação de terras indígenas a quem puder comprovar que estava na área em 1988
atualizado
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Em visita a uma feira do agronegócio no Rio Grande do Sul neste sábado (11/9), presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a afirmar que uma nova interpretação em torno das demarcações das terras indígenas no Brasil pelo Supremo Tribunal Federal (STF) vai representar o fim do agronegócio.
A corte discute há semanas a repercussão da tese do marco temporal, uma interpretação defendida por ruralistas e grupos interessados na exploração econômica das terras indígenas que restringe os direitos constitucionais dos povos originários. De acordo com a tese, essas populações só teriam direito a terra se estivessem sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
“Nós temos um problema pela frente que tem que ser resolvido: o Supremo volta a discutir uma data diferente daquela fixada há pouco tempo, conhecida como marco temporal. Se a proposta do ministro Fachin vingar, será proposta a demarcação de novas áreas indígenas que equivalem a uma região Sudeste toda. Ou seja, o fim do agronegócio. Simplesmente isso, nada mais do que isso”, disse Bolsonaro.
A fala ocorreu em almoço na casa da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), dentro do Parque de Exposições Assis Brasil, em Esteio (RS), região metropolitana de Porto Alegre, onde Bolsonaro fez uma visita à feira 44ª Expointer. As declarações foram transmitidas pela TV Brasil.
Lideranças de povos indígenas de todo o país estão acampados em Brasília há semanas para acompanhar o debate e protestar contra a tese do marco temporal e o garimpo ilegal. Esta semana, a análise pela Suprema Corte foi novamente adiada.
O governo federal é favorável à tese do marco temporal. O presidente Jair Bolsonaro já disse em outras ocasiões que se o Supremo mudar a interpretação, a agricultura brasileira será inviabilizada.
No discurso, após receber a Medalha Mérito Farroupilha, maior honraria da Assembleia Legislativa gaúcha, Bolsonaro ainda elogiou o agronegócio e um dos presidentes da ditadura.
“O agronegócio vai bem. Começou lá atrás com nosso presidente Emílio Garrastazu Médici quando ele colocou na agricultura Alisson Paulinelli e a revolução começou por lá e logo depois fizemos então invasão do centro-oeste. Centro-Oeste hoje que é uma marca na produção rural do nosso país.”
“O trabalho do nosso governo, em primeiro lugar, é não atrapalhar. É um governo que não cria dificuldade para vender facilidade. Deixamos o campo completamente livre, escolhemos uma excepcional pessoa para estar à frente do Ministério da Agricultura”, prosseguiu.
Na primeira viagem realizada depois dos discursos de 7 de Setembro e da nota em que recuou dos ataques, Bolsonaro evitou ataques diretos ao STF e defendeu que todos os poderes devem ser respeitados.
“Não é hora de dizer se esse ou aquele Poder saiu vitorioso, a vitória tem que ser do povo brasileiro, tem que ser de vocês, porque assim nós podemos viver em harmonia e sonharmos com um Brasil realmente bem melhor do que aquele que nós recebemos em janeiro de 2019.”
Entenda o marco temporal
Em 2013, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) acolheu a tese do marco temporal ao conceder ao Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (antiga Fundação de Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente – Fatma) reintegração de posse de uma área que está em parte da Reserva Biológica do Sassafrás, onde fica a Terra Indígena Ibirama LaKlãnõ. Lá, vivem os povos xokleng, guarani e kaingang.
Em 2019, o STF deu status de “repercussão geral” ao processo, o que significa que a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios. A pauta é considerada o julgamento do século para os povos indígenas.
O STF julga um recurso da Fundação Nacional do Índio (Funai) que questiona a decisão do TRF-4.
O caso começou a ser julgado no dia 11 de junho, mas foi interrompido quando o ministro Alexandre de Moraes pediu vista. O relator, ministro Edson Fachin, proferiu nesta semana seu voto contrário à demarcação do marco temporal.
Segundo Fachin, “a proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que (os indígenas) tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 05 de outubro de 1988 (data da promulgação da Constituição) porquanto não há fundamento no estabelecimento de qualquer marco temporal”.
A discussão deve seguir na corte na próxima quarta-feira (15/9), com a continuação do voto do segundo ministro a se manifestar, Kassio Nunes Marques.