Auditor do TCU confessa que pai militar repassou dados a Bolsonaro
Corregedor do TCU, ministro Bruno Dantas pediu à Polícia Federal abertura de inquérito e apuração do ato de auditor
atualizado
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O auditor do Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques confessou à chefia imediata no Tribunal de Contas da União (TCU) que foi ele o autor das análises que levaram o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a divulgar a notícia falsa de que o órgão questionava o número de mortes por Covid-19 no Brasil.
Conforme relato encaminhado à corregedoria do tribunal e divulgado pela colunista Monica Bergamo, da Folha de S.Paulo, o auditor disse ter comentado o teor de suas opiniões com o pai, que é militar e amigo pessoal de Bolsonaro. O funcionário da Corte de Contas informou que o pai teria enviado o texto ao presidente.
O corregedor do TCU, ministro Bruno Dantas, quer que a Polícia Federal (PF) abra um inquérito para apurar a suposta elaboração de análises que levaram o presidente Bolsonaro a questionar os registros de óbitos por Covid-19, segundo apurou Igor Gadelha, colunista do Metrópoles.
O pedido foi oficialmente feito por Dantas à presidência do TCU nesta quarta-feira (9/6), em despacho ao qual a coluna teve acesso. No documento, o ministro pede ainda a instauração de processo administrativo disciplinar e o afastamento preventivo do servidor do cargo de auditor, para não atrapalhar as investigações.
“As revelações que se tornaram públicas até o momento apontam fatos que, se comprovados, se revestem de extrema gravidade, na medida em que, além da possível infração disciplinar, atingem de maneira severa a credibilidade e a imagem institucional do Tribunal de Contas da União”, assinalou o ministro da Corte.
A expectativa é que a presidente do TCU, Ana Arraes, acate o pedido ainda nesta quarta-feira e peça à PF que instaure o inquérito. A magistrada também deve afastar Alexandre Figueiredo Costa Silva do cargo de auditor por 60 dias, impedindo-o de entrar no prédio da Corte e de ter acesso ao sistema interno.
No despacho, o corregedor afirma que, diante das informações apuradas até o momento, o auditor “pode ter utilizado de sua função de supervisor para tentar inserir no trabalho documento/questão que não guardava relação com o objeto da fiscalização”, sem o respaldo dos demais membros da equipe.
Entenda
No dia 6 de junho, o auditor Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques elaborou uma análise na qual pontuou que, como o número de óbitos serviam como parâmetro para que os estados recebessem repasses de recursos do Ministério da Saúde para o combate à Covid-19, poderia haver um superdimensionamento dos dados.
O auditor apresentou resultados de sua tese aos colegas de trabalho do TCU, que o teriam repreendido por considerarem que a intenção de Alexandre consistia em desqualificar o trabalho dos governadores estaduais e favorecer o discurso da gestão federal. Nenhum outro auditor do TCU teria endossado o “estudo”, por considerá-lo uma farsa.
A tese de que governadores e prefeitos inflariam, artificialmente, a quantidade de mortes para receber mais recursos federais é propagada pelo presidente da República. Na segunda-feira (7/6), o chefe do Executivo nacional afirmou que um relatório do TCU apontava que o número de mortes por Covid-19 em 2020 seria equivalente à metade do oficialmente registrado.
No ano passado, o país registrou 194.949 vítimas da doença, índice que foi ultrapassado em apenas cinco meses de 2021. No total, o Brasil contabiliza 473.404 óbitos por Covid-19, desde o início da pandemia.
O TCU prontamente desmentiu o presidente da República. O titular do Palácio do Planalto também reconheceu, na terça-feira (8/6), que a informação que passou ao público não era verdadeira, e afirmou ter divulgado dados que constavam em uma tabela que questionava a taxa brasileira de mortalidade por Covid-19, com base em um “acórdão” do TCU.
Afastamento do auditor
Alexandre atua na Secretaria de Controle Externo do TCU da Saúde e mora em Jundiaí (SP). O Metrópoles confirmou que o servidor tem ligação com a família Bolsonaro, é crítico do PSol e da imprensa.
O funcionário público também havia sido indicado a uma diretoria do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2019. A indicação, no entanto, foi barrada pelo próprio TCU, que justificou a decisão alegando conflito de interesses, já que o tribunal fiscaliza o banco.