metropoles.com

Análise: recuos ofuscaram avanços nos cem dias do governo Bolsonaro

Esse tempo também serviu para o capitão perceber a dificuldade de pôr em prática as promessas da campanha eleitoral

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Igo Estrela/Metrópoles
Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados. Brasília(DF), 04/09/2018
1 de 1 Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados. Brasília(DF), 04/09/2018 - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

Passados cem dias desde o início do governo, os brasileiros têm elementos suficientes para conhecer o estilo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) no Palácio do Planalto. Esse tempo também serviu para o capitão perceber a dificuldade de pôr em prática as promessas da campanha eleitoral.

No balanço deste período, percebe-se que os recuos do governo, em grande parte, ofuscaram as medidas prometidas ou anunciadas à população. Em muitos casos, deve-se registrar, a mudança de rumo representou uma aceitação da realidade do país pelo presidente da República.

Ficou evidente, por exemplo, um recuo de Bolsonaro em relação ao discurso da “nova política”. Com esse mote, na corrida eleitoral, o então candidato se propôs a quebrar a lógica das negociações com os tradicionais ocupantes do poder federal.

Depois de empossado, o presidente até ensaiou um novo tipo de relacionamento com o Congresso. Em vez de conversar com dirigentes partidários, tentou privilegiar os contatos com bancadas temáticas, como evangélicos e ruralistas.

Bastou a reforma da Previdência começar a tramitar no Congresso para ele descobrir que o processo democrático pressupõe diálogo com as legendas representadas no Congresso. Em consequência, desde a última semana, Bolsonaro começou a receber no Planalto os presidentes das legendas com potencial para proporcionar votos nas propostas do governo.

Entre os dirigentes partidários recebidos pelo chefe do Executivo federal estão próceres da “velha política”, por exemplo, o ex-senador Romero Jucá (MDB-RR), e o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB. Nada mais distante da retórica de campanha.

Bolsonaro também recuou na intenção de se comunicar com a sociedade sem intermediação da imprensa. Embora continue postando mensagens e anunciando medidas de governo pelas redes sociais – principalmente no Twitter –, ele passou a receber jornalistas de veículos tradicionais para conversas no café da manhã.

Outro movimento do presidente que contrariou suas promessas foi a desistência – pelo menos por enquanto – de mudar a Embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém. A repercussão negativa do plano de Bolsonaro, principalmente entre os exportadores para países árabes, forçou o governo a rever a decisão e instalar, apenas, um escritório comercial na cidade considerada sagrada por cristãos, muçulmanos e judeus.

Quedas de ministros
Na profusão de mudanças de rota do governo, destacam-se as demissões de dois ministros. O primeiro a cair foi Gustavo Bebianno, secretário-geral da Presidência da República, depois de desentender-se com o vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente.

Segundo integrante do primeiro escalão a perder o cargo, Ricardo Vélez, marcou sua passagem pelo Ministério da Educação por uma sucessão de medidas tomadas – e, em seguida, revogadas. Assim, por exemplo, desistiu de pedir que os professores filmassem os alunos cantando o Hino Nacional. Vélez trocou mais de uma vez o secretário-executivo do MEC, sem conseguir controlar as brigas internas.

Boa parte dos problemas dos primeiros cem dias tem a ver com os choques entre grupos que apoiaram a campanha de Bolsonaro. No MEC, brigam por espaço representantes dos evangélicos, dos militares e dos seguidores do escritor Olavo de Carvalho – guru de Bolsonaro.

Na área externa, as ideias de combate ao “marxismo cultural” do ministro da Relações Exteriores, Ernesto Araújo, surpreenderam a comunidade internacional. Divulgadas durante as viagens presidenciais para Estados Unidos, Chile e Israel, as formulações teóricas do chanceler repercutiram mais pela excentricidade do que pela viabilidade de implantação.

Busca de diálogo
Quando se faz a retrospectiva dos cem dias, repete-se um hábito praticado desde que, em 1933, o então presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt, pediu esse prazo para dar as primeiras respostas sobre as medidas que adotara para enfrentar a grande depressão econômica da época.

Em queda nas pesquisas de opinião, Bolsonaro dá sinais de que aceita rever algumas de suas ideias. Pode-se até avaliar que alguns dos avanços mais significativos de seu governo decorrem, justamente, de suas mudanças de postura. Isso se deu, notadamente, nos casos da busca de diálogo com os partidos e na melhora dos contatos com a imprensa.

Em vez de andar para trás com atitudes como a postagem de um vídeo erótico no Carnaval, o presidente aos poucos parece notar que fica mais fácil avançar rumo à meta quando se opta pelo caminho do entendimento. Assim, cria mais condições para aprovar propostas, mesmo que modificadas, no Congresso. Como teste, as votações da reforma da Previdência vão revelar se Bolsonaro fará seu governo deslocar-se para a frente em seus objetivos.

Por mais que segmentos apoiadores da eleição rejeitem essas aproximações com políticos e imprensa, a realidade demonstrou ao presidente que não se administra o país dentro de uma bolha de bajuladores. No cargo que ocupa, ensina a experiência, é preciso saber dialogar. Bolsonaro, aos poucos, parece aprender a ceder para governar o Brasil.

Compartilhar notícia

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?