Análise: Fux ajuda família Bolsonaro e reforça poder dos cariocas
Decisão do ministro do STF no caso Queiroz expõe presença de autoridades fluminenses nos principais cargos de Brasília
atualizado
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O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), expôs nessa quinta-feira (17/1) um fenômeno raro na composição da cúpula do poder em Brasília. Na segunda quinzena deste mês, dos quatro cargos mais importantes da República, três são ocupados por autoridades do Rio de Janeiro.
Plantonista do STF, o carioca Fux suspendeu a investigação criminal contra Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Assembleia Legislativa do estado. Observada de perto, a decisão tem forte componente regional.
Pai do parlamentar, o presidente Jair Bolsonaro nasceu no interior de São Paulo, mas se elegeu sete vezes deputado pelo Rio de Janeiro, onde tem residência desde o tempo em que era militar da ativa. No momento, exerce o primeiro dos 48 meses de seu mandato.
No Congresso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), aparece como favorito a mais um mandato no cargo. Se for confirmada sua terceira eleição para o posto, permanecerá por mais dois anos como terceira autoridade na linha sucessória no Palácio do Planalto. Para ser reconduzido, conta com o apoio do PSL, partido dos Bolsonaro.
Atual vice do STF, Fux ocupará a cadeira de Dias Toffoli na presidência da Corte a partir de setembro de 2020. Então, nos meses seguintes, confirmando-se a reeleição de Maia, três cidadãos fluminenses estarão na linha sucessória do país.
Das quatro cadeiras mais importantes do país, no final de 2020, apenas a presidência do Senado não deverá ter uma autoridade do estado como titular. Por enquanto, Renan Calheiros (MDB-AL) desponta como favorito. Na divisão do poder em Brasília, o parlamentar alagoano tem a marca do Nordeste, região historicamente influente no Congresso brasileiro.
Se a decisão de Fux chama a atenção por seu viés estadual, deve-se ressaltar um aspecto mais grave desse processo. Flávio Bolsonaro diz não ser alvo da investigação contra Queiroz, mas, ainda assim, alegou prerrogativa de foro para trancar a ação do Ministério Público do Rio de Janeiro. Ao suspender a apuração do caso, Fux corrobora com a estratégia, adotada pelos envolvidos, de adiar as explicações sobre as transações financeiras atípicas encontradas nas contas de Queiroz pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Esse tipo de interferência em processos judiciais lembra muito o comportamento dos políticos acusados de saques do dinheiro público em grandes escândalos, como os do mensalão e do petróleo. Mesmo que não tenham cometido crimes, Queiroz e seu ex-chefe se comportam como quem não têm explicações convincentes sobre o que fizeram.
“Jogo de compadres”
A ação do senador eleito no STF também contrasta com o discurso contra a corrupção feito por Bolsonaro e seus aliados nas campanhas eleitorais. No momento em que precisa negociar votações e verbas com congressistas – muitos deles enrolados na Justiça –, o presidente perde um pouco da fleuma de moralização exibida antes de chegar ao Planalto.
No mundo complexo dos poderosos de Brasília, as relações pessoais muitas vezes ajudam a remover obstáculos políticos que podem ajudar o país. Ao mesmo tempo, no entanto, as conexões entre as autoridades dos Três Poderes, com frequência, levam a uma espécie de “jogo de compadres” e à impunidade dos investigados. Nesse sentido, a decisão monocrática de Fux no caso Queiroz provoca certa inquietação.
Os próximos meses vão mostrar se o acobertamento de ações judiciais são uma tendência que veio para ficar no novo governo. Revelarão, também, o tamanho do poder da “república carioca” em Brasília.