Análise: com muita bagunça e poucos votos, governo tromba no Congresso
Desgastado pela divulgação dos áudios de conversas com Bebianno, presidente Bolsonaro sofre derrotas na Câmara e na Justiça
atualizado
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Os brasileiros tiveram nessa terça-feira (19/2) alguns exemplos do repertório de encrencas proporcionado pelo governo atual. No lance mais explosivo, a imprensa divulgou áudios de troca de mensagens entre o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o ainda ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gustavo Bebianno.
A exposição das conversas entre os dois revela o grau de bagunça do primeiro escalão. Os áudios mostram discussões mais parecidas com fofocas entre vizinhos e parentes do que contatos de duas autoridades federais.
No meio desse bafafá, o governo sofreu a primeira derrota na Câmara. Enquanto o país ouvia as gravações, os deputados derrubaram, em votação simbólica, o decreto presidencial que mudava a Lei de Acesso à Informação (LAI) para ampliar o rol de autoridades com poder para estabelecer sigilo de documentos.
Assinado pelo vice-presidente, general Hamilton Mourão (PRTB), o decreto restringia a transparência dos registros oficiais e abria brechas para medidas secretas. Como consequência, facilitava os atos dos que gostam de agir nas sombras.
Antes de ser levado ao plenário, o decreto teve a urgência aprovada por 367 votos contra 57. Embora esses números não reflitam o tamanho da base de sustentação do governo e da oposição, o resultado dá uma medida das dificuldades que o Planalto terá pela frente para aprovar suas propostas.
Para reverter o quadro insatisfatório e aprovar a reforma da Previdência, por exemplo, o governo tem o desafio de conquistar três quintos dos congressistas. Até agora, Bolsonaro e seus representantes não mostraram como pretendem realizar essa proeza em um Parlamento movido a fisiologismo.
Deputados e senadores acostumados ao toma lá dá cá agem com mais desenvoltura em governos fracos e desorganizados. A presidente Dilma Rousseff viveu esse drama até perder o mandato em 2016.
Cabe ao Palácio do Planalto e, em particular, ao presidente, passar imagem de organização e credibilidade para reduzir a margem de manobra dos que trocam votos por vantagens. Os fatos, porém, indicam que o governo ainda tem muito a aprender.
Frivolidades
Nesse sentido, causa espanto a frivolidade das preocupações de Bolsonaro nas mensagens para Bebianno, muito distantes do que se espera de um líder da Nação. A determinação do presidente de fazer valer a vontade do filho Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro pelo PSC, sobre os argumentos do então ministro assusta quem espera o mínimo de formalidade na cúpula do poder.
A falta de cerimônia de Carlos em Brasília também se manifesta na presença de seu primo Leonardo Rodrigues de Jesus. Sem cargo no governo, Léo Índio, como é conhecido o sobrinho do presidente, é frequentador assíduo do Palácio do Planalto e até participa de reuniões. Ninguém sabe o que ele faz lá.
Com tanto problema no governo para resolver, o presidente teve reveses também na Justiça. O Diário da Justiça Eletrônico dessa terça-feira publicou a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que rejeitou recurso de Bolsonaro contra condenação que sofreu por dizer que a deputada Maria do Rosário (PT-RS) não merecia ser estuprada.
Também no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o presidente foi derrotado na ação por danos morais que movia contra o ex-deputado Jean Wyllys (PSol-RJ) por tê-lo chamado de “fascista” e “burro”.
Desgastado pela crise em torno de Bebianno – e com derrotas na Justiça e no Congresso –, Bolsonaro terá de agir rapidamente para tomar as rédeas do processo político. A se julgar pelas primeiras semanas de governo, essa será uma tarefa difícil para o presidente.