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Análise: com Aras na PGR, Bolsonaro deu nó na cabeça dos bolsonaristas

Ao indicar procurador com passado ligado a petistas, presidente confunde seguidores apegados à disputa ideológica com a esquerda

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1 de 1 38856410791_fec95b4060_o - Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

Os seguidores do presidente Jair Bolsonaro (PSL) vão precisar de algum tempo para entender a indicação de Augusto Aras (foto em destaque) para a Procuradoria-Geral da República. Anunciada nessa quinta-feira (05/09/2019), a escolha surpreendeu, principalmente, os mais radicais na disputa ideológica com as correntes situadas na faixa esquerda do espectro político.

Até pouco tempo atrás, Aras frequentava os mesmos ambientes e comungava dos mesmos símbolos dos adversários de Bolsonaro. Em pelo menos uma ocasião, fez referência positiva ao argentino Ernesto Che Guevara, símbolo da Revolução Cubana.

Um episódio de agosto de 2013 mostra a proximidade de Aras com o PT. Na ocasião, o procurador abriu as portas de sua casa para uma festa de lançamento de um livro do ex-deputado petista Emiliano José, ex-preso político da ditadura.

Com o título Galeria F – Lembranças do Mar Cinzento, a obra tem relatos de Emiliano do tempo de militância contra o governo autoritário. Outro livro do autor – Lamarca, o capitão da guerrilha -, de 1980, é uma das publicações mais simbólicas sobre os Anos de Chumbo.

A citação a Guevara aconteceu em abril de 2013. Um vídeo disponível no YouTube registra o momento em que Aras citou a frase mais famosa do argentino, “Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás (É preciso endurecer, mas sem jamais perder a ternura)”.

O revolucionário cubano foi descrito por Aras como “um pensador latino-americano que ousou sonhar com liberdade”. Para um bolsonarista dogmático, esse tipo de referência é suficiente para enquadrar o procurador na categoria de “comunista”, um inimigo a ser combatido.

Alguma coisa aconteceu nas conversas reservadas com o presidente para Aras merecer a indicação para o cargo máximo do Ministério Público. Certamente, não foi Bolsonaro que mudou as convicções sobre a esquerda. Pode-se apostar, então, que o procurador fez uma inflexão em suas preferências políticas e em seu rigor como fiscal do cumprimento da Constituição.

Para saber o tipo de metamorfose sofrida por Aras, os brasileiros vão precisar esperar para ver sua atuação à frente da PGR. Isso, claro, ainda depende da aprovação de seu nome pelo Senado, o que provavelmente deve acontecer.

Por enquanto, a escolha de Bolsonaro provocou um nó na cabeça de seus seguidores. Reações de representantes do Ministério Público e de integrantes da Operação Lava Jato revelam preocupação dos investigadores com o futuro da força-tarefa sediada em Curitiba.

Suspeita-se, por exemplo, que a opção do presidente tenha a ver com as acusações contra o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), envolvido nos rolos do ex-assessor Fabrício Queiroz. O capitão atua para livrar o filho das evidências de que seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) era usado para lavar dinheiro e apoiar milicianos.

Essa situação não seria, necessariamente, um problema para os bolsonaristas, que nunca demonstraram interesse em esclarecer as atividades de Queiroz. Mas, para amaciar as investigações contra Flávio, o presidente facilita também a impunidade dos políticos denunciados pela Lava Jato.

Quem votou em Bolsonaro com a convicção de que ele varreria a corrupção do país terá dificuldade para aceitar um eventual afrouxamento das investigações e das punições, principalmente contra os petistas – a menos que a indignação contra desvios de dinheiro fosse apenas uma retórica para chegar ao poder.

Para quem raciocina apenas com a raiva ideológica, fica difícil fazer um diagnóstico sobre as consequências do gesto do capitão. Só mesmo o tempo para desfazer esse nó.

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