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Aliados do governo querem avanço da pauta de costumes trancada no Congresso

Expectativa é de que, com novos presidentes da Câmara e do Senado a partir de 2021, terreno para agenda conservadora seja mais fértil

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Eleito com bandeiras conservadoras, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não conseguiu emplacar a agenda de costumes no Congresso Nacional nos dois primeiros anos de mandato.

Entre as justificativas para o travamento desses projetos, está a urgência para aprovação de pautas econômicas, tais como a reforma da Previdência, em 2019, e a pandemia de Covid-19, que tornou 2020 um ano atípico marcado pela votação prioritária de matérias de combate à crise sanitária.

Atuando de forma direta na sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na Câmara e de Davi Alcolumbre (DEM-AP) no Senado, Bolsonaro e aliados esperam ver a agenda avançar com maior celeridade a partir de 2021. São os presidentes das duas Casas os responsáveis pela definição da pauta. Como a maior parte dessas matérias está na Câmara, os freios são majoritamente creditados a Maia.

Para a ex-vice-líder do governo na Câmara, a deputada Bia Kicis (PSL-DF), nos dois primeiros anos a agenda de costumes ficou em “banho-maria” e agora é preciso colocar os temas em pauta.

“O que não pode é impedirem a votação. Nós não queremos colocar nada à força, apenas queremos ir para o voto, porque tenho certeza de que no voto a gente ganha”, afirmou a deputada.

Em duro discurso contra o governo em 18 de dezembro, Maia disse, em Plenário, que vai continuar atuando contra essa agenda, por considerar que ela divide o Brasil.

“Continuarei no mesmo lugar em que sempre estive, do lado da democracia, contra a agenda de costumes, que divide o Brasil, que radicaliza o Brasil, que gera ódio entre as pessoas. E como essa é a agenda do presidente, eu continuarei sendo um leal adversário do presidente naquilo que é ruim para o Brasil, e serei um aliado do governo, e não do presidente, nas pautas que modernizam o Estado brasileiro”, disse Maia.

Maia tenta fazer um sucessor contando com o apoio de partidos de esquerda, radicalmente contrários à agenda conservadora. O nome escolhido pelo bloco liderado por Maia é o de Baleia Rossi (SP), presidente nacional do MDB.

Projetos engavetados

Entre os projetos dessa pauta engavetados no Congresso, está o homeschooling (educação domiciliar), a escola sem partido, a flexibilização do porte de armas e o Estatuto da Família, que estipula que a família é a união entre um homem e uma mulher e exclui casais homoafetivos. Algumas dessas matérias já são discutidas no Congresso há muito tempo, como é o caso do Estatuto do Nascituro, proposto em 2007, que visa revogar as hipóteses atualmente previstas para aborto legal, como as gestações de fetos anencéfalos.

Para o autor de uma dessas matérias, o deputado Junio Amaral (PSL-MG), que propôs a proibição do uso do gênero neutro por instituições de ensino, há expectiva grande de que a pauta avance nos próximos dois anos. “O que o Maia fez, ignorando as pautas definidas pelo povo em 2018, foi canalhice”, classificou ele. Esse grupo de parlamentares acredita que a pauta conservadora foi vitoriosa nas últimas eleições gerais e impedir seu avanço é não respeitar o resultado das urnas.

O governo tenta emplacar parlamentares alinhados no comando das Casas, com especial atenção à Câmara. Bolsonaro atua abertamente em prol da candidatura do líder do bloco partidário conhecido como Centrão, deputado Arthur Lira (PP-AL). O entendimento é de que figuras mais próximas do presidente possam colocar menos barreiras para a discussão de temas da agenda de costumes.

Por outro lado, o líder da oposição, deputado André Figueiredo (PDT-CE), acredita que, independente do deputado que vier a comandar a Câmara pelos próximos dois anos, a pauta não irá avançar. “Não vejo em nenhuma hipótese esta pauta avançar, independente do Presidente que venha a ser eleito”, disse ao Metrópoles. Segundo o líder, nenhum candidato competitivo está se comprometendo com estas pautas.

A líder do Psol na Câmara, deputada Sâmia Bomfim (SP), afirmou que, apesar de o governo estar atuando para garantir a aprovação dessa agenda, a sociedade está mais organizada para responder a eventuais retrocessos. “Nós sabemos que o governo está jogando pesado para garantir a aprovação da pauta de costumes. A costura em torno do nome do Lira tem esse aspecto como decisivo”, pontuou ela.

“Mas a sociedade também está mais organizada para responder a retrocessos no enfrentamento ao racismo, machismo e lgbtfobia”, complementou.

Discussões prejudicadas

Além de ser contra muitos dos temas, a oposição defende que os assuntos não estão maduros para serem colocados em votação e precisam passar por mais discussões.

Em 2020, outro acontecimento inédito no Parlamento impediu o aprofundamento dos temas: a não instalação das comissões permanentes. Os colegiados, responsáveis por audiências com especialistas e estudos aprofundados dos temas, ficaram sem funcionar ao longo de todo o ano, já que seriam instalados em março, mês em que o Congresso decretou o estado de calamidade pública.

Tanto na Câmara quanto no Senado, as matérias foram votadas diretamente em Plenário, o que concedeu poderes ainda maiores a Maia e Alcolumbre. Os presidentes se comprometeram a votar apenas pautas de consenso, com prioridade às voltadas ao enfrentamento da pandemia.

A eleição de um nome mais alinhado ao governo também vale para impedir o avanço de outras matérias, como o PL 399/2015, que trata da legalização do canabidiol para fins medicinais. Sob relatoria do deputado Luciano Ducci (PSB-PR), o projeto está pronto para ser pautado no Plenário da Câmara desde setembro deste ano. Maia ensaiou colocar o texto em votação, mas a pressão de alguns parlamentares manteve o projeto na gaveta.

Aliados de Bolsonaro, como o coordenador da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família, deputado Diego Garcia (Podemos-PR), o deputado e ex-ministro do governo Osmar Terra (MDB-RS) e a bancada evangélica atuam para travar o avanço do projeto.

Bancada conservadora

A deputada Bia Kicis está reunindo assinaturas para compor uma frente parlamentar conservadora e ajudar a impulsionar a agenda preterida na primeira metade da gestão Bolsonaro.

Segundo ela, já foram colhidas 30 assinaturas no Senado e aproximadamente 80 na Câmara. “O que dificulta é o fato de estarmos trabalhando à distância”, considerou ela.

Para criar oficialmente o grupo suprapartidário, o mínimo necessário é um terço dos integrantes da Câmara e do Senado, o equivalente a 171 deputados e 27 senadores. A ideia é recolher as assinaturas até o fim deste ano.

Apoiam a iniciativa os ministros da ala ideológica do governo, como Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores).

Questionada sobre a possibilidade de a nova frente parlamentar entrar em choque com a bancada evangélica, já tradicional e atuante no Congresso, ela afirmou que não enxerga esse cenário de divisão, “afinal de contas, todo evangélico é um conservador”, disse. “Temos que nos unirmos para ganharmos mais força.”

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