Partido de Bolsonaro cresce mais enrolado do que PRN, de Collor
Acusado de usar laranjas nas eleições e de envolvimento com milícias, PSL tem o desafio de sobreviver às denúncias
atualizado
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Em 1989, o ex-governador de Alagoas Fernando Collor de Mello se elegeu presidente da República pelo Partido da Reconstrução Nacional (PRN), legenda de pouca expressão no cenário político do país. Em pouco tempo, a sigla teve rápida ascensão – chegou a 40 deputados e cinco senadores –, seguida de imediato declínio.
O crescimento e a decadência do PRN acompanharam a efêmera passagem de Collor pelo Palácio do Planalto. Com o impeachment do alagoano, em 1992, o partido igualmente ruiu.
O presidente Jair Bolsonaro também chegou ao comando do país filiado a uma legenda pequena, o Partido Social Liberal (PSL). Mas a popularidade do capitão potencializou o desempenho da agremiação política nas urnas. Como resultado, a sigla conquistou 52 vagas de deputado federal e quatro de senador.
Semelhantes no súbito crescimento e, ainda, por abrigarem um presidente da República, os dois partidos também têm em comum a má fama de alguns de seus integrantes. Em certos aspectos, pode-se dizer que o PSL chega ao poder mais enrolado do que o PRN.
A edição desta semana da revista IstoÉ tem uma reportagem sobre Valdenice de Oliveira Meliga, funcionária no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL), filho do presidente, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) durante a campanha eleitoral de 2018. De acordo com a publicação, a assessora era uma das pessoas com procuração do parlamentar para realizar pagamentos em seu nome.
Operação Quarto Elemento
Nessa condição, Valdenice assinava cheques em nome de Flávio para pagar despesas de campanha. Embora não haja irregularidade nessa atuação, a funcionária de confiança do então deputado estadual chama atenção pelo fato de ser irmã dos gêmeos Alan e Alex Rodrigues Oliveira, presos durante a Operação Quarto Elemento sob a acusação de pertencerem a uma milícia.
Desde o ano passado, investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro identificaram pessoas ligadas a milicianos no gabinete de Flávio na Alerj. Agora, ele é senador da República, eleito com mais de 4 milhões de votos. Mas o filho do presidente chegou a Brasília combalido pelas denúncias centradas, principalmente, no ex-assessor Fabrício Queiroz, apontado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) como responsável por movimentações financeiras atípicas.
Dentro do gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Queiroz recolhia dinheiro dos funcionários, fazia negócios e abrigava parentes de milicianos, segundo as investigações do Ministério Público.
Também nesta semana, a revista eletrônica Crusoé mostrou que Valdenice era remunerada pelo gabinete de Flávio enquanto trabalhava na campanha eleitoral. Ou seja, foi paga com dinheiro público para trabalhar pela eleição do chefe para o Senado.
Essas são denúncias graves e, pelo menos até onde se sabe, não tiveram paralelo no PRN. É verdade que, antes de adotar essa sigla, a legenda de Collor se chamava Partido da Juventude (PJ) e teve o presidente nacional, Daniel Tourinho, preso sob acusação de estelionato.
Também é fato que o primeiro líder do PRN na Câmara foi o então deputado Renan Calheiros (AL), hoje no MDB e envolvido em mais de uma dezena de processos na Justiça. Na época, ainda no início da carreira, ele não tinha sua imagem ligada a denúncias de corrupção.
A derrocada do PRN se deu em torno das atividades do empresário Paulo César Farias, o PC Farias. Tesoureiro da campanha de Collor, ele manteve o fluxo de arrecadação durante o governo em troca de privilégios para grandes empresas.
Candidaturas laranja
No caso do PSL, as suspeitas de irregularidades também começaram na campanha eleitoral. Nesse campo, as últimas semanas foram ricas na produção de fatos negativos para o partido de Bolsonaro. As denúncias de candidaturas laranja do PSL em Minas Gerais e em Pernambuco, por exemplo, macularam na largada a bancada do partido no Congresso Nacional.
Em Pernambuco, quem comanda o PSL é o deputado Luciano Bivar, atual presidente nacional do partido. No ano passado, ele cedeu o posto ao advogado Gustavo Bebianno, representante de Bolsonaro na burocracia eleitoral da campanha.
Revelados pelo jornal Folha de S.Paulo, os repasses financeiros suspeitos para candidatas mulheres que tiveram baixa votação serviram de estopim para a demissão de Bebianno, no dia 18 de fevereiro, da Secretaria-Geral da Presidência da República.
Além do ex-ministro e de Bivar, o escândalo em torno de laranjas também atingiu em cheio o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (foto abaixo), eleito deputado federal com mais de 230 mil votos, recordista em Minas Gerais. Apesar das acusações, diferentemente de Bebianno, ele se mantém no cargo.
Com tantos problemas surgidos ainda no início da legislatura, o PSL encontra dificuldades para ocupar no Congresso um espaço político proporcional ao tamanho da legenda, principalmente na Câmara, onde divide com o PT a condição de dono da maior bancada.
Falta de experiência
Além das dúvidas relacionadas a desvio de dinheiro de campanha e envolvimento com milícias, o PSL enfrenta dificuldade para atuar por causa da falta de experiência da maioria de seus deputados e senadores (na foto em destaque, a bancada federal reunida com Bolsonaro). “Muitos dos nossos parlamentares estão no primeiro mandato e só se conheceram depois de eleitos”, afirma o líder do partido no Senado, Major Olímpio (SP).
Nesse contexto, menos de um mês depois de empossadas, as bancadas do PSL na Câmara e no Senado ainda não revelaram capacidade para atuar de forma organizada e coesa nas discussões políticas. Nos contatos com a imprensa, passam boa parte do tempo tentando amenizar os estragos causados pelas denúncias.
Os próximos meses vão mostrar se as confusões e suspeitas desse início de legislatura serão superadas pelo PSL. O desafio do partido é não repetir a curta existência do PRN.