Oposição quer processo contra Cristiane Brasil no Conselho de Ética
PT, PSol e PCdoB reunirão bancadas para estudar ação contra a deputada por passar Réveillon em hotel da FAB em Fernando de Noronha
atualizado
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Integrantes da bancada de oposição da Câmara dos Deputados prometem levar a candidata a ministra do Trabalho e atual deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ) ao Conselho de Ética da Casa. Cristiane passou o Réveillon em Fernando de Noronha (PE) e requisitou hospedagem ao hotel de trânsito da Força Aérea Brasileira (FAB) para ela e ao menos três amigas.
Antes mesmo de terminar o recesso parlamentar, pelo menos três partidos devem protocolar processos disciplinares na Comissão de Ética contra Cristiane Brasil, por quebra de decoro parlamentar. Lideranças de PT, PCdoB e PSol encaminham o assunto, nos próximos dias, para a discussão da bancada, que decidirá sobre o destino da deputada fluminense.
Para Glauber Braga, o fato de ser deputada exige de Cristiane Brasil o respeito a um protocolo. A reunião do PSol está marcada para ocorrer no próximo dia 1º, em Brasília.
O caminho do PCdoB deve ser semelhante ao dos aliados. Líder da bancada comunista, a deputada Alice Portugal (BA) vai levar o caso, ainda neste mês, para os integrantes do partido na Casa. “É despropositado se hospedar em hotel militar, que não é lugar para se estar com amigas. De fato, é algo que não se resume à questão moral”, afirma.
Segundo Alice Portugal, a bancada, composta por 17 parlamentares, estará reunida no dia 24/1, quando acompanhará em Porto Alegre (RS) o julgamento do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Por muito menos, pessoas foram hostilizadas. É realmente um comportamento amoral que precisa ser analisado não só pela Câmara, mas pela Força Aérea”, cobrou a deputada.
Já o PT afirma que a hospedagem no hotel da FAB deixa a parlamentar fluminense numa situação “vexatória” perante a opinião pública e, por consequência, arranha a imagem da Câmara. “Vou encaminhar o pedido à bancada no nosso próximo encontro, que deve ser em Porto Alegre, quando estaremos todos mobilizados”, confirmou o líder do PT, Paulo Pimenta (PT-RS). Atualmente, há 57 deputados filiados ao partido na Câmara.
Ex-presidente do Conselho de Ética da Casa, o deputado Ricardo Izar (PP-SP) ponderou à reportagem que a denúncia existe e deve ser investigada de forma isenta pelo órgão. “É uma situação realmente estranha, mas que precisa ser estudada com todo cuidado pelos integrantes da comissão, para que não transforme o caso em um ambiente propício para palanque político”, disse.
Procurada pela reportagem, a deputada Cristiane Brasil não retornou as ligações. A assessoria da parlamentar informou que, “até o momento, não foi informada da movimentação [dos partidos de oposição]”.
Hospedagem autorizada pelo Comando da Aeronáutica
Ao Metrópoles, a Força Aérea Brasileira confirmou a autorização da hospedagem para Cristiane Brasil, mas o deslocamento ao arquipélago, diz a corporação, ficou por conta da deputada. “A parlamentar enviou solicitação ao Comando da Aeronáutica, e o pedido foi atendido, pois havia disponibilidade de vaga”, informou.
A reportagem conseguiu a confirmação de que pelo menos outras três amigas da deputada também ficaram hospedadas na base militar do arquipélago. Elas postaram fotos nas redes sociais, de 27 de dezembro a 4 de janeiro.
Aliados defendem Cristiane
Para aliados de Cristiane Brasil, a indicação do nome dela para compor o ministério de Temer contribui para os pedidos de investigação, mas o fato de ser filha do delator do Mensalão, o ex-deputado e presidente do PTB, Roberto Jefferson, motiva a investida da oposição.
“Quem deu motivo para isso foi ela [Cristiane], que sabia estar sendo indicada para o ministério, mas só pensou na questão do resgate da imagem do pai dela. Quando você vira notícia, também vira vidraça. Ela não pensou nisso”, afirmou Arnaldo Faria de Sá, vice-líder do PTB na Câmara dos Deputados.
Ainda assim, o político afirma que o uso de hotel de trânsito da Aeronáutica pela parlamentar não justifica a reação, considerada “desproporcional” pelo correligionário. “Soa como vingança”, disse.
Mesmo nos bastidores, a opinião de Faria de Sá é compartilhada por aliados de outros partidos. Um experiente político, quem preferiu o anonimato, afirmou ao Metrópoles que Cristiane Brasil tem um temperamento forte, é explosiva e combativa, e isso a coloca sob os holofotes. “Está na cara que a turma do PT quer acertar o pai dela, porque denunciou o mensalão do partido”, contextualiza.
Favorecimento
O professor emérito de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer afirma ser preciso apurar se a parlamentar foi beneficiada em razão do cargo público que exerce. “A FAB favorece, de muitas maneiras, altos funcionários públicos. Nesse caso, uma deputada levou amigas que não são personalidades. É preciso checar se isso é uma prática comum com outros deputados.”
O especialista lembra que, a partir do pedido dos partidos, o presidente do Conselho de Ética pode decidir se aceita apurar a denúncia ou não. “Caberá ao presidente colocar em pauta o assunto. No entanto, se não aceitar, os partidos ainda podem recorrer ao plenário. Isso ocorreu diversas vezes no Senado, durante o julgamento de Aécio Neves, por exemplo”, lembrou.
Posse suspensa
A deputada federal Cristiane Brasil foi indicada para comandar o Ministério do Trabalho pelo PTB. No entanto, a parlamentar vive o suspense de não saber se poderá assumir o cargo, devido à liminar que impediu a posse.
A solenidade estava marcada para terça-feira (9), no Palácio do Planalto, mas foi suspensa em razão da decisão judicial. Após recorrer, o governo teve o pedido negado. O Palácio do Planalto submeteu outro recurso para o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), mas a Corte manteve a decisão na noite de quarta (10). O governo agora estuda levar o caso ao Supremo Tribunal Federal.
Cristiane Brasil foi condenada a pagar indenização a um motorista que prestou serviços para ela. De acordo com a sentença de 2016, a parlamentar devia ao ex-funcionário R$ 60 mil. Fernando Fernandes Dias trabalhou sem carteira assinada entre 29 de novembro de 2011 e 10 de janeiro de 2015.
O valor da indenização contempla os danos morais pela situação, mais direitos que foram suprimidos, como férias, 13º salário, gratificação natalina, FGTS, horas extras, além de juros e correção monetária.
Na opinião dos autores das ações que resultaram na liminar de impedimento para a posse, a pretensa ministra não reúne “condições morais” para assumir a pasta na Esplanada dos Ministérios. A própria deputada, no entanto, disse que não desistirá do cargo.