Governo quer “forçar” estados a aderirem à nova Previdência
Lei de Responsabilidade Previdenciária, costurada entre o Parlamento e a equipe econômica, pretende estabelecer benefícios a governadores
atualizado
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Passada a batalha da reforma da Previdência, que mudou a aposentadoria para os servidores públicos federais, governo e Congresso começam a traçar estratégias para forçar estados e municípios a também apertarem as regras para os funcionários. A proposta costurada pela equipe econômica e pelo deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), presidente da Frente Parlamentar Mista do Pacto Federativo, chamada de Lei da Responsabilidade Previdenciária, prevê estímulos para governadores e prefeitos que aderirem às novas regras da Previdência aprovadas na semana passada.
A ideia inicial defendida pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, sempre foi de que as mudanças propostas para a Previdência valessem também para estados e municípios. Mas, para que isso acontecesse, os parlamentares cobravam que governadores e prefeitos encampassem e defendessem em público as reformas. Como essa defesa nunca foi uma unanimidade, deputados e senadores acabaram aprovando as mudanças apenas para os servidores federais.
Uma nova proposta de emenda à Constituição levando as modificações também para estados e municípios começa a tramitar no Senado. Mas há muitas dúvidas se será realmente viável a aprovação. Por isso, governo e Congresso tentam achar uma forma para que governadores e prefeitos façam as mudanças por conta própria.
A Lei de Responsabilidade Previdenciária, prevista para ser apresentada em novembro, deve estabelecer, por exemplo, um prazo para que estados e municípios formulem um plano de equacionamento do déficit atuarial dos sistemas de aposentadoria. Quem não aderir à reforma aprovada no Congresso, terá apenas um ano para apresentar essa estratégia. Quem aderir, ganha mais tempo.
Quando há déficit atuarial, significa que todas as arrecadações futuras da Previdência serão insuficientes para bancar os benefícios previstos (já concedidos ou que serão pagos a quem ainda está na ativa). Estudo do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que faltariam R$ 4,7 trilhões aos estados e municípios caso eles tivessem de desembolsar hoje todas as aposentadorias e pensões devidas. Em 2018, governos estaduais tiveram um rombo de R$ 101 bilhões nas Previdências.
Um plano de equacionamento pode incluir um cardápio de medidas que vão desde o aporte de ativos (como imóveis, terrenos) até a elevação de alíquotas de contribuição (dos servidores ou patronal). Algumas prefeituras chegam a pagar mais de 20% de alíquota extraordinária para cobrir desde já o rombo futuro. “Quem aderir (à reforma) terá tratamento diferenciado”, diz Costa Filho.
A implementação dos planos será acompanhada pelo Conselho Nacional Previdenciário, órgão a ser criado pelo projeto. Nele haverá representantes das administrações públicas federal, estaduais e municipais e dos servidores, além dos Tribunais de Contas. O Conselho Nacional de Secretários de Fazenda também poderá ganhar um assento no órgão deliberativo.
Prêmio
A intenção, segundo o autor do projeto, é premiar quem ajustar a Previdência. Pela proposta, a situação de equilíbrio será recompensada com possibilidade de vender os direitos sobre créditos tributários (na chamada “securitização”) ou até flexibilizar endividamento. Também haverá uma “nota” de classificação da situação previdenciária, que pode servir de vitrine para investidores. “É como ir ao banco e receber um cartão com limite maior que o mau pagador. Vai gerar concorrência. Vai estimulando aquele que quer de fato trabalhar”, diz o deputado.
Eventuais punições para quem deixar de fazer o plano de equilíbrio serão discutidas mais à frente, afirma Costa Filho. “Não quero fazer uma perseguição a estados e municípios. Queremos que o bom gestor tenha benefícios da União. Os entes que não aderirem de certa forma vão perdendo, como uma nota de crédito, e começa a acender a luz amarela e vermelha. Isso prejudica o Estado em vários aspectos”, diz.
Impacto salarial
A Lei de Responsabilidade Previdenciária que está sendo costurada no Congresso prevê, entre outros pontos, que governadores e prefeitos poderão ser cobrados a apresentar estimativas de impacto que eventuais reajustes nos salários de servidores terão para seus regimes de Previdência.
A ideia é evitar que gestores concedam aumentos generosos de olho na popularidade e deixem uma herança de gastos sem receitas suficientes para bancá-los no futuro. Se houver desequilíbrio, um plano de ação precisará ser apresentado.
Governadores, prefeitos e o Executivo federal continuarão a ter independência para conceder ou não reajustes ao funcionalismo. A diferença é que haverá maior rigor na exigência dos cálculos de impacto para a Previdência.
No passado recente, estados como Rio de Janeiro, em grave crise financeira, concederam uma série de reajustes salariais a servidores, às vésperas do período eleitoral, e acabaram depois atrasando salários e aposentadorias.
“A ideia é criar a cultura do monitoramento da Previdência”, diz o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE). Para ele, o mecanismo pode incentivar boas práticas entre os gestores, que calcularão melhor quais pedidos ou não são possíveis atender. “Isso ajuda a criar uma cultura de pensar nas consequências.”