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Bolsonaro: aposta na Previdência e 80 dias de “turbulências”

Após 3 meses, marca do governo do presidente Bolsonaro se divide entre agenda propositiva no Congresso e sucessão de fatos negativos

atualizado

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1 de 1 bolsonaro jerusalem - Foto: Alan Santos/PR

O presidente Jair Bolsonaro chega aos cem dias de governo com a marca de ter enviado para o Congresso uma reforma da Previdência e um pacote de medidas de combate à criminalidade, promovido a flexibilização das regras para a posse de armas e destravado os leilões de portos e aeroportos. Os três últimos são suas promessas de campanha. A agenda propositiva, contudo, se contrapõe a uma sucessão de crises. Levantamento feito pelo jornal Estado de São Paulo indica que, em pouco mais de três meses, Bolsonaro e sua equipe enfrentaram 80 dias de turbulência.

Sem medir as palavras e parecendo agir muitas vezes por impulso, o estilo do presidente preocupa até mesmo o núcleo militar do governo. No Legislativo, Bolsonaro não conseguiu formar até agora uma base de sustentação para aprovar os projetos de interesse de sua gestão. Logo na largada, ele comprou uma briga com o Congresso ao carimbar seus antigos colegas na Câmara como representantes da “velha política”, associando o termo à corrupção e ao toma lá, dá cá.

Pressionado, Bolsonaro indicou que partirá para negociações no varejo com partidos, mas a distribuição de cargos às siglas que integrarem a base de apoio foi batizada de “banco de talentos”. Até mesmo nas fileiras do PSL, partido do presidente, a expressão foi ironizada. “Tucanaram o apadrinhamento”, provocou o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP).

O vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que as crises em torno da articulação política estavam precificadas. “O governo sabia que ia encontrar dificuldades por ter montado um esquema diferente de lidar com o Congresso. Decidimos assumir o risco, que era um risco controlado. Os cargos já estão à disposição, só que precisam de pessoas técnicas”, disse. “As caneladas são coisa do passado”, complementou o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Após a queda de Gustavo Bebianno da Secretaria-Geral – ele bateu de frente com o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente –, Onyx passou a ser o único ministro civil a despachar no Planalto. Os demais são militares. A briga começou pelo Twitter, microblog que tem dado a maior dor de cabeça para os bombeiros do governo.

Após perder popularidade – sua aprovação caiu 15 pontos e foi de 49% para 34%, conforme pesquisa Ibope do dia 20 de março –, Bolsonaro também decidiu trocar o comando da Secretaria de Comunicação (Secom) e vai investir em uma campanha publicitária para a reforma da Previdência nas mídias tradicionais, com as quais se indispôs nos últimos tempos. Além disso, ele anunciou a criação de um Conselho Político, formado por representantes de partidos, com a missão de segurar crises.

O início tumultuado não é exclusividade do governo Bolsonaro. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje preso, enfrentou na largada uma crise provocada por colegas de partido que não aceitavam a reforma da Previdência. Lula enviou o texto ao Congresso 120 dias depois de assumir o cargo, gerando muitos protestos no PT e a expulsão de quadros históricos, como a ex-senadora Heloísa Helena e a ex-deputada Luciana Genro.

Fernando Collor apresentou o “Plano Collor” um dia depois da posse, confiscou a poupança e depósitos nos bancos. Fernando Henrique Cardoso também enfrentou conflitos na sua base aliada nos primeiros cem dias. A ex-presidente Dilma Rousseff escapou das crises nos primeiros cem dias do seu primeiro mandato. Em compensação, sete ministros caíram no primeiro ano, na chamada “faxina”.

Na avaliação do filósofo Roberto Romano, da Unicamp, a gestão Bolsonaro teve momentos “erráticos” por causa da falta de coesão. “Não há um cimento que garanta a unidade das ideias, das doutrinas e das práticas que compõem o governo”, afirmou. “Não é que sejam conflitantes, mas há interesses que não são conciliáveis.”

Para o cientista político Rodrigo Prando, do Mackenzie, a desenvoltura do vice-presidente é o principal diferencial da gestão Bolsonaro. “O vice assumiu a liturgia do cargo, dá declarações que tranquilizam o mercado, a classe política e até o núcleo militar.”

Na área econômica, o governo entregou ao Congresso a reforma da Previdência e bateu o martelo em leilões de 12 aeroportos regionais, 16 terminais portuários e o trecho da Ferrovia Norte-Sul, com investimentos previstos de quase R$ 7 bilhões nos próximos 30 anos. Com a queda das expectativas de crescimento do PIB para este ano, a equipe econômica prepara um pacote de medidas para aumentar a produtividade, o emprego e a atividade econômica.

Viagens

Às vésperas de completar cem dias, Bolsonaro já fez viagens a Davos, na Suíça, a Washington, a Santiago e a Tel-Aviv. Na Casa Branca, ele acertou com Donald Trump uma proposta de acordo para o uso comercial do Centro de Lançamentos de Alcântara.

Bolsonaro ainda saiu dos EUA com a promessa de apoio ao ingresso do Brasil na Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico. Mas não foi de graça: o País foi obrigado a abrir mão do “tratamento especial e diferenciado” na Organização Mundial do Comércio e dispensou os turistas americanos de visto, sem contrapartida.

O Planalto prepara uma cerimônia de comemoração dos cem dias de governo, que deve ser na quinta-feira. Muitas metas divulgadas pela Casa Civil como prioritárias para esse período, no entanto, não saíram do papel até hoje, como o programa “Alfabetização Acima de Tudo”. Mesmo assim, todos os ministros foram convocados para bater o bumbo sobre a agenda desse início de gestão. O titular da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, poderá cair antes disso.

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