Análise: popularidade em queda tira força de Bolsonaro na Previdência
Faltam evidências de que o presidente conseguirá votos suficientes no Congresso para aprovar reforma que equilibre as contas públicas
atualizado
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Ao levar ao Congresso a proposta de reformulação da Previdência das carreiras militares, o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), conclui uma etapa importante do início de seu governo. Para os eleitores, o gesto (foto em destaque) representa o cumprimento de uma promessa de campanha. Do ponto de vista do mercado, significa o atendimento de uma expectativa criada pela equipe econômica ainda antes da posse.
Até agora, foi fácil. Bolsonaro dependeu apenas de acertos dos integrantes de sua equipe para costurar os textos enviados aos congressistas. Falta o mais difícil: entregar aos brasileiros e ao mercado a aprovação da reforma da Previdência para militares e civis.
Sem entrar no mérito da justeza das mudanças pretendidas pela equipe econômica, pode-se dizer que o jogo ainda nem começou. A tarefa mais complicada é convencer o Congresso a cortar benefícios e a exigir mais sacrifícios da população.
Observando-se o quadro político atual, fica difícil acreditar na capacidade de o governo formar as maiorias necessárias para a aprovação do pacote sem mexidas que descaracterizem o ajuste nas contas. O futuro da Previdência interessa a todos os cidadãos e cidadãs, e as pressões contrárias à revisão de privilégios vêm de todos os setores da sociedade.
Aliado inconteste da reforma, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alertou para a falta de interlocução prática entre o governo e o Parlamento para obter apoio às propostas. Deputado experiente, ele conhece bem os colegas e, no cargo que ocupa, tem melhores condições do que qualquer outro para avaliar as chances de tramitação da reforma.
Um problema adicional surge como complicador para o avanço das medidas preparadas pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes. As pesquisas de opinião apontam queda acentuada nos índices de popularidade de Bolsonaro e isso tem reflexo direto na sua força de negociação com o Congresso.
Desde janeiro, segundo números divulgados nessa quarta-feira (20/3) pelo Ibope, o presidente sofreu perda de 15 pontos percentuais entre os que consideram o governo ótimo ou bom. Agora, 34% dos brasileiros têm percepção favorável à administração federal – em janeiro, eram 49%.
Desgaste junto aos eleitores
Nenhum deputado ou senador fez campanha com a promessa de cortar benefícios da população. Por experiências anteriores, sabe-se que aprovar propostas com esse teor provoca forte desgaste junto aos eleitores, o que assusta os parlamentares, quase sempre, interessados em novos mandatos políticos.
Em circunstâncias normais, a liderança do presidente seria um fator decisivo para convencer os congressistas a desagradar quem os elegeu. Em começo de mandato, ainda sob o impacto das urnas, o titular do Planalto ganha força política para enfrentar obstáculos.
Fernando Collor de Mello, por exemplo, aprovou até um confisco das poupanças dos brasileiros no início de seu governo. Fernando Henrique Cardoso quebrou monopólios da Petrobras. Mas eles ainda desfrutavam de sólida imagem junto à opinião pública. Esse é um desafio adicional para Bolsonaro.
Outros percalços se levantam contra a reforma da Previdência, como o lobby das corporações, principalmente, o do funcionalismo público. Para superá-los o presidente vai depender da capacidade de seus negociadores políticos e do desprendimento dos parlamentares – boa parte deles, e de seus familiares, beneficiados pelas distorções que permitem privilégios de algumas dessas carreiras.
“Bala de prata”
Bolsonaro reconhece a importância do avanço das propostas no Congresso. Na segunda-feira (18), ele afirmou que “nós quebraremos” se não for feita uma “reforma robusta”. Pronunciada para pressionar os parlamentares, a declaração indica falta de alternativas da equipe econômica para equilibrar as contas.
Esse tipo de manifestação tem um precedente perigoso. Logo que assumiu, Collor afirmou que tinha uma única “bala de prata” para abater o “tigre da inflação”, que era o plano apresentado pela ministra da Economia, Zélia Cardoso de Mello – o mesmo que incluía o confisco da poupança.
A bravata de Collor deu em nada. A tal “bala de prata” falhou, e a inflação voltou poucos meses depois de perder força. Cabe a Bolsonaro demonstrar que, desta vez, o objetivo será alcançado.