Análise: Bolsonaro gasta popularidade ao tentar impor agenda própria
Pesquisa MDA/CNT mostra como presidente perde apoio ao patrocinar pautas contra a preservação da Amazônia e indicar Eduardo para embaixada
atualizado
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A última pesquisa MDA/CNT (Confederação Nacional do Transporte) mostrou o tamanho da decepção de uma parcela da população com o presidente Jair Bolsonaro (PSL). Em seis meses, a faixa de brasileiros que avalia o governo como “ruim” ou “péssimo” saltou de 19% para 39,5%.
Nas consultas sobre o desempenho pessoal do chefe do Executivo, o índice de reprovação subiu de 28,2% para 53,7%. Os resultados das duas medições revelam que o desencanto com o presidente praticamente dobrou desde fevereiro.
Com 40 meses de governo pela frente, o presidente gastou boa parte da popularidade em tentativas de impor medidas rejeitadas por amplos setores da sociedade. Nessa direção, destaca-se a indicação do filho Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), deputado federal, para a embaixada do Brasil nos Estados Unidos.
Embora as intenções de mudar a política externa fossem conhecidas, ao escolher um filho sem preparo para um cargo de tal envergadura, o capitão surpreendeu até mesmo seus seguidores que discordam de práticas associadas ao nepotismo. A posse do inexplicável Ernesto Araújo no Ministério das Relações Exteriores parecia suficiente para ignorar o bom senso e contrariar as tradições da diplomacia brasileira.
Mas Bolsonaro dobrou a meta. Ao indicar Eduardo, o presidente expôs a ambição de usar a máquina pública para a projeção política da família. Essa cartada não estava prevista no programa eleitoral nem foi alardeada nos palanques. Para concretizar sua vontade, bata o Senado aprovar, com 41 votos, a indicação do deputado para a embaixada.
Também se deve considerar como fato negativo para Bolsonaro o confronto com líderes europeus em torno da destruição da Amazônia. Há mais de uma semana, o presidente ocupa o noticiário nacional e internacional pela postura adotada em relação aos incêndios na maior floresta do planeta.
Fiel ao discurso contra o meio ambiente e em favor dos setores mais agressivos do agronegócio, o capitão estimulou a degradação da mata desde a campanha. Depois da posse, o tomou medidas que desmontaram o delicado sistema de proteção e fiscalização da Amazônia. Em consequência, quando a floresta começou a pegar fogo, Bolsonaro automaticamente foi visto como o principal responsável pelas queimadas.
Entre outros efeitos, a queda brusca na pesquisa diminui a força do presidente para governar. O enfraquecimento do presidente pode ser observado na dificuldade de aprovar propostas no Congresso. Pautas como o pacote anticrime, por exemplo, patinam no Congresso.
A reforma da Previdência avança, mas o relativo sucesso na tramitação deve ser creditado, principalmente, ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que abraçou a causa e comandou a aprovação do texto pelos deputados. Bolsonaro tem praticamente nada a ver com isso, até por que, mesmo dentro do governo, esse é um assunto do ministro da Economia, Paulo Guedes – o Posto Ipiranga.
Pelo desenrolar dos acontecimentos, outro fator de desgaste afetará Bolsonaro nas próximas semanas. Os movimentos do presidente para proteger outro filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), das investigações relacionadas ao antigo gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) têm potencial para chamuscar ainda mais sua imagem.
Ao tentar proteger o filho, o capitão ameaça desmantelar a Operação Lava Jato. Por essa, seus eleitores não esperavam. O comportamento do presidente nesse caso se choca de frente com a retórica de combate à corrupção, usada contra os governos do PT na campanha eleitoral.
As referências ao comandante da força-tarefa de Curitiba, Deltan Dallagnol, como um “esquerdista” escancaram o distanciamento entre Bolsonaro e os investigadores. As próximas pesquisas, certamente, vão mostrar se esse tipo de manifestação prejudica a popularidade do presidente.