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Os deputados evangélicos referem-se mais a Deus e mencionam mais termos religiosos do que os católicos, apurou o (M)Dados, núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles. Os dois grupos foram analisados por serem os maiores da Câmara dos Deputados. O levantamento faz parte da série Poder e Fé, que analisa a atuação dos parlamentares de acordo com a religião de cada um.
Por quatro meses, a reportagem apurou a religião de cada deputado. Dos 513 parlamentares, 501 responderam ao questionamento. Com essas informações, o (M)Dados usou a API da Câmara dos Deputados para obter todos os discursos feitos por eles em 2019 e identificou as palavras mais utilizadas por cada grupo.
Enquanto um parlamentar católico cita Deus a cada 5.525 palavras proferidas em seus discursos, um evangélico o faz a cada 1.322. Apenas um termo é usado mais do que “Deus” pelos dois segmentos. “Família” aparece uma vez a cada 930 palavras ditas pelos evangélicos e uma a cada 1.165, pelos católicos.
As maiores diferenças estão ao citarem a Bíblia – uma vez a cada 7,2 mil palavras pelos evangélicos e uma a cada 333 mil pelos católicos. “Religião” foi pronunciada uma vez a cada 59,6 mil pelos católicos e uma vez a cada 6,9 mil pelos evangélicos.
O professor de filosofia da Universidade de Brasília Agnaldo Portugal acredita que a atuação distante das duas igrejas se deve, em parte, à história de cada grupo. “Os deputados das igrejas neopentecostais não veem muita diferença entre a atividade política no mundo profano e a vida religiosa em um âmbito mais sagrado. Os católicos já perceberam que essa confusão é bastante perigosa para a própria religião”, avaliou.
Isso porque “a atividade política é desgastante, ela gera insatisfação em algum momento em algum grupo. E insatisfação política com religião muito ligada acaba gerando insatisfação religiosa”, acrescentou.
Outra diferença significativa nos discursos de congressistas das duas religiões está na referência ao aborto. O termo não foi usado por católicos e mencionado 16 vezes pelos evangélicos.
A única palavra mais utilizada por católicos que por evangélicos foi “católico”. Os primeiros a repetiram a cada 25,8 mil palavras, enquanto os outros uma vez a cada 33,5 mil.
O Metrópoles questionou a religião dos deputados federais com o compromisso de não identificar a fé de cada um. A informação serve apenas para alimentar a base de dados, que foi cruzada com os resultados de votações na Câmara e os discursos feitos pelos parlamentares, entre outros. Foi utilizada a linguagem de programação Python tanto para obter os dados do parlamento através de sua API quanto para levantar as informações e fazer as análises necessárias.
O resultado de todo esse trabalho pode ser lido na série Poder e Fé, do (M)Dados, lançada no último domingo (12/01/2020). Esta é a última de uma sequência de cinco reportagens publicadas diariamente.
Além de apurar qual grupo é mais governista, o levantamento também buscou descobrir se a Câmara representa fielmente a população quando a questão é a religião, qual grupo é mais coeso nas votações, como os diferentes grupos religiosos se dividem nas frentes parlamentares e quais temas estão mais presentes em seus discursos.