PCGO: “Uso ilegal de agrotóxicos na alimentação bovina ocorre há anos”
Operação Carne Tóxica inspecionou casas rurais e verificou indícios de continuidade da prática. Metrópoles denunciou fato recentemente
atualizado
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Goiânia – A venda e uso ilegal de agrotóxicos na alimentação do gado em Goiás ocorrem há três anos, pelo menos, segundo a Polícia Civil de Goiás (PCGO). Ao deflagrar a Operação Carne Tóxica nessa terça-feira (6/7), a investigação constatou a continuidade da prática, nos últimos anos, e dará prosseguimento ao caso, numa segunda fase da apuração.
O Metrópoles mostrou, com exclusividade no dia 27/6, como inseticidas da categoria extremamente tóxicos e com uso autorizado somente em lavouras vêm sendo misturados ao sal e à ração do gado para combater a mosca-do-chifre, que pode provocar doenças nos animais.
Os efeitos para a saúde do rebanho e para quem consome os produtos derivados do gado são imensuráveis, segundo o delegado da Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra o Consumidor (Decon), Webert Leonardo Lopes.
A operação atuou em cinco lojas agropecuárias em Goiás, sendo quatro em Goiânia e uma na cidade de Jaraguá, região central do estado. A polícia tinha conhecimento do caso, desde 2018, quando foi feita uma denúncia anônima, com vídeos e áudios que mostravam a venda sem receituário agronômico ou veterinário, e a subsequente recomendação indevida de vendedores e técnicos dessas lojas para uso das substâncias na alimentação bovina.
Os inseticidas
Os agrotóxicos em questão são o Dimilin, TrulyMax e o Copa, todos do princípio ativo diflubenzuron. Na inspeção nas casas rurais nessa terça-feira, os agentes encontraram, além de grande estoque desses produtos, documentos que indicam vendas em grande volume.
Proprietários, responsáveis técnicos e até os produtores rurais poderão responder criminalmente pelo uso irregular desses inseticidas. Pelos menos 10 pessoas foram intimadas para serem ouvidas na próxima semana. Elas são investigadas por associação criminosa e crimes contra as relações de consumo.
Sanção administrativa
As lojas inspecionadas possuem responsáveis técnicos, segundo a investigação. Ou seja, cada uma delas tem um veterinário e um engenheiro agrônomo que respondem tecnicamente pelo estabelecimento. Diante da evidência de ilegalidade, eles poderão responder, ainda, administrativamente, nos respectivos conselhos de classe.
A Operação Carne Tóxica contou com a participação de representantes do Conselho Regional de Medicina Veterinária de Goiás (CRMVGO), do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO) e da Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa). Processos administrativos serão abertos para apurar a conduta dos agrônomos e veterinários. Eles podem ser alvos de advertência, suspensão e até exclusão dos registros profissionais.
Estabelecimentos conhecidos
As casas agropecuárias investigadas, até então, são estabelecimentos conhecidos, grandes e que revendem produtos para todo o estado de Goiás. As quatro lojas de Goiânia, por exemplo, ficam no Setor Coimbra, na região da Avenida Castelo Branco, conhecida pela concentração de lojas do tipo.
A possibilidade de reprodução da prática ilegal em outras casas rurais é algo que será apurado pela polícia. O delegado Webert acredita que outros locais também estejam vendendo e indicando ilegalmente a utilização desses produtos.
Em um dos vídeos ao qual o Metrópoles teve acesso e que foi publicado no dia 27/6, o vendedor chega a dizer que é “balela” o símbolo de veneno na embalagem do Dimilin. Em agosto de 2019, foi feita a reclassificação dos agrotóxicos no Brasil. De 702 tidos, até então, como extremamente tóxicos, a quantidade reduziu para 43, e mesmo assim o Dimilin e o TrulyMax seguiram nesse grupo.
Veja:
Venda camuflada
Uma das suspeitas da investigação é que os responsáveis técnicos das lojas agropecuárias alvos da operação praticaram venda camuflada. Sabendo da autorização de uso dessas substâncias somente em lavouras, eles teriam assinado receitas como se os agrotóxicos fossem direcionados para uso na agricultura, mas sabendo que o produtor rural, na verdade, iria utilizá-los na alimentação do gado.
Um dos motivos para o desvio de uso desses inseticidas seria a questão econômica. A investigação da PCGO apurou que eles custam 20% do valor dos medicamentos que deveriam ser utilizados e que são recomendados para o tratamento da mosca-do-chifre. A rentabilidade teria atraído o interesse dos produtores e incentivado a prática da venda ilegal.