PCGO investiga desmatamentos e retirada irregular de água no Araguaia
Curso natural de afluente está alterado, diante do desequilíbrio gerado pela captação contínua. Polícia apura situação de 30 pivôs centrais
atualizado
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Goiânia – A Polícia Civil de Goiás (PCGO), por meio da Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra o Meio Ambiente (Dema), apura denúncias de desmatamentos e captações irregulares de água em um dos mais importantes afluentes do rio Araguaia, o rio Água Limpa.
Ao todo, 30 pivôs centrais foram catalogados e estão sob investigação, segundo o delegado titular da especializada, Luziano de Carvalho. Eles pertencem a várias fazendas localizadas em Jussara (GO), cidade que fica a 220 Km de Goiânia.
As propriedades estão nas margens do Água Limpa e numa das regiões onde mais se avança com a fronteira agrícola hoje no estado. “Jussara é o exemplo da ganância hoje. Temos que deixar claro que não somos contra o desenvolvimento econômico, mas o Água Limpa já teria secado se não fosse o Araguaia”, afirma o delegado.
Veja:
Em operação realizada no início deste mês, agentes da Dema verificaram a presença de tubulações e bombas que captam água diretamente do rio para irrigar extensas áreas de lavouras. Além disso, por meio de imagens aéreas, a investigação percebeu a recorrência de desmatamentos e abertura de áreas para pastagens em locais que deveriam ser de proteção permanente.
Alteração do curso natural da água
A situação, segundo Luziano, já gera desequilíbrios preocupantes. O natural, evidenciado por ele em um vídeo feito no exato local do encontro do rio Água Limpa com o rio Araguaia, seria as águas do afluente desaguarem no rio maior. Hoje, acontece o oposto.
Com a perda de força e captação constante no Água Limpa, o rio e os lagos naturais abaixaram, ao ponto de não terem resistência suficiente para desaguarem no Araguaia. As águas do Araguaia é que estão alimentando o afluente e subindo em direção contrária ao que seria usual.
“Já ouviu falar que água sobe para cima?”, questiona o delegado. Ele pondera que não se trata de uma “visão alarmista”, tampouco “utopia de preservação”, mas que “não é possível transpor limites traçados pela natureza”, e os avisos naturais são claros, segundo Luziano.
Avaliação da irregularidade
Os proprietários das fazendas já foram identificados e deverão ser intimados para prestar esclarecimentos. O delegado diz que ainda é cedo para falar em ilegalidade, referente aos equipamentos de irrigação, pois é necessário analisar as documentações de licenciamento e outorga para uso da água.
A suspeita, no entanto, é de que a quantidade de água retirada esteja fora ou acima do que está autorizado nos documentos. “O Água Limpa não suporta tantos pivôs centrais como o que tem hoje. Isso está comprometendo a vazão do rio”, alerta Carvalho.
Ele explica que o cálculo para autorização de uso e retirada de água estaria sendo feito a partir de uma média da vazão do rio, ao longo do ano, incluindo os períodos de cheia e estiagem. Durante a seca e alta temporada do Araguaia, no entanto, que correspondem aos meses atuais, o nível do rio reduz bastante, com vazão muito abaixo do que seria essa média.
O que Luziano pretende propor, se evidenciado isso nas documentações, é uma discussão e ponderação com o órgão ambiental responsável para reavaliar os cálculos e rever as autorizações de retirada. Caso contrário, o desequilíbrio ambiental presenciado na região tende a ficar ainda mais acirrado.
Degradação histórica
A região no entorno do Araguaia, considerado um dos mais importantes rios de Goiás e que percorre a divisa com o Mato Grosso, tem sido alvo de inúmeras investidas e degradações nas últimas décadas.
Além do avanço da fronteira agrícola, já ficou constatado pela Polícia Civil a prática de drenagem de áreas de nascentes para abertura de pastagens e aumento da presença de gado.
Em setembro de 2021, a reportagem do Metrópoles visitou Nova Crixás (GO), que é uma das cidades goianas por onde passa o Araguaia. Na região conhecida como Viúva, um canal inteiro do rio secou pela primeira vez na história, ficando totalmente na terra, sem qualquer sinal de água.
A preocupação de Luziano de Carvalho é que situações do tipo não só voltem a acontecer, mas que elas fiquem cada vez piores. “Não estamos prontos para isso”, avalia ele.