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Pandemia deixa mais de 40 mil advogados com dívidas em GO e no DF

Profissionais não conseguem pagar a anuidade da OAB. Muitos fecharam escritórios para trabalhar somente em casa e reduzir gastos

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Reprodução/Arquivo pessoal
Fabiana Adalgisa, advogada
1 de 1 Fabiana Adalgisa, advogada - Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

Apesar do aumento de demandas judicias na pandemia da Covid-19, mais de 40 mil advogados de cidades goianas e do Distrito Federal enfrentam dificuldades financeiras. Eles foram incluídos na lista de devedores das seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Goiás e no DF, por não conseguirem pagar a anuidade básica cobrada pela entidade que os representa.

Muitos advogados chegaram a fechar escritórios para trabalhar em casa com o objetivo de reduzir gastos.

O Conselho Federal da OAB analisa pedidos para que a advocacia seja dispensada da quitação financeira de anuidade para participar das eleições, que serão em novembro. O colegiado avalia, ainda, se vai estender sua decisão para que os votos on-line sejam permitidos em todo o Brasil, por causa do distanciamento social na pandemia, que já matou quase 400 mil pessoas no país.

No Distrito Federal, segundo o presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior, a seccional tem 68 mil inscritos, dos quais 45 mil estão em atividade. Do total dos advogados em situação ativa, cerca de 45% (20.250) estão inadimplentes com a anuidade da Ordem.

“Chegou determinado momento, em meados do ano passado, em que havia 75% de inadimplentes”, diz o presidente da OAB-DF, lembrando o impacto do endividamento na categoria.

Ao contrário do Distrito Federal, que registrou diminuição de devedores, a Ordem goiana confirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, o aumento de nomes na sua lista de inadimplentes desde o ano passado.

De acordo com a entidade goiana, “a inadimplência histórica é de 30%; em 2020, chegou perto de 50%”. Ao todo, de acordo com levantamento oficial da OAB-GO, repassado ao Metrópoles, 67.700 estão inscritos na Ordem no estado, mas só 40 mil deles seguem em atividade. Do total de advogados em exercício, os devedores representam a metade.

Valor da anuidade

Em Goiás, o valor bruto cobrado pela anuidade é de R$ 1.128,24, o segundo mais caro do país, atrás apenas da Ordem no Rio Grande do Sul (R$ 1.154). Já a mais barata é a do Distrito Federal, R$ 800.

A Ordem goiana confirmou que o valor da anuidade é de R$1.128,24, mas disse que, com descontos, pode diminuir até R$ 564,12. A OAB-GO informou, ainda, que a gestão da entidade, sem prejuízo dos serviços oferecidos, “reduz o valor da anuidade quando deixa de aplicar correções inflacionárias”. De acordo com a instituição, nos últimos seis exercícios, a anuidade da Ordem goiana sofreu reajuste em apenas dois deles.

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Presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior
Sede da OAB-GO
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Sede da OAB-DF

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Presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior

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Sede da OAB-GO

Divulgação/OAB-GO

 

“Preocupante”

A situação da advogada Fabiana Adalgisa de Oliveira (foto em destaque), 37 anos, é “preocupante”, como ela própria define. Considerada do grupo de risco da Covid – por ter diabetes, fibromialgia e Síndrome de Hashimoto, doenças autoimunes que atacam o organismo –, ela precisa driblar o coronavírus e a pressão das dívidas que não param de chegar.

Com três filhos (um adolescente de 17 anos, uma menina de 12 e o caçula de 7), a advogada não pagou a anuidade de 2020 e 2021 porque tem enfrentado dificuldades até para manter despesas básicas da casa e outros compromissos que ela considera essenciais.

“Meu marido é assalariado, e a maior parte das despesas é minha. Tenho três filhos de idades distintas, cada um com uma necessidade diferente. Tenho de pagar escola do mais novo, financiamento de imóvel e aluguel da casa onde moro”, conta.

A advogada atua nas áreas do direito do consumidor e do trabalho. “Quero participar das eleições da OAB-GO, mas, infelizmente, corro risco de ser barrada”, lamenta.

O advogado Pablo Gomes Felipe, de 30 anos, que atua na carreira há cinco anos em Goiânia, diz que não pagou nem a anuidade de 2020 nem a de 2021. Ele conta que não quitou o valor, pois está apertado no período da pandemia, assim como a maioria dos brasileiros.

“Está até pior porque o INSS está sem marcar perícia, e a gente fica aguardando decisão de laudo. Tem processos judiciais, mas a morosidade está grande porque o fórum está fechado”, afirma ele.

Segundo o advogado, as audiências presenciais não atendem às demandas a contento. “Tenho interesse em continuar na advocacia, mas o valor da anuidade está muito caro, principalmente por causa do contexto da pandemia”, reclama.

Além de fazerem malabarismo para pagar as contas, como as despesas básicas de saúde, de casa e do escritório, e também manterem a família, advogados correm risco de receber a mais dura sanção, até o momento, no que diz respeito à participação da categoria: perder o direito a voto nas eleições da Ordem. Isso porque os inadimplentes não podem participar do pleito.

Eleições virtuais

Autor dos pedidos apresentados ao Conselho Federal da OAB e à OAB-GO para dispensa da exigência de quitação financeira e que pede votação pela internet, o advogado Pedro Paulo de Medeiros destaca que os pedidos se justificam por causa da gravidade da pandemia. Ele observa que em abril foi o mais letal da pandemia.

“As solicitações são legítimas diante do cenário regional, nacional e mundial de calamidade pública ocasionado pela Covid-19, que impactou significativamente o exercício profissional da advocacia brasileira, reduzindo sensivelmente os ganhos financeiros, dificultando o pagamento da anuidade pela maioria das advogadas e advogados goianos”.

No documento, Pedro Paulo de Medeiros argumenta, ainda, ser imprescindível que toda a advocacia possa decidir e escolher os dirigentes que terão crucial função. “Não é apenas um exercício de democracia livre, mas de decisão de rumos e sobrevivência para a profissão e para as vidas dessas advogadas e advogados”.

Direito para todos

O Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/94) define que somente profissionais adimplentes poderão ser candidatos nas eleições da OAB. O pedido enviado ao Conselho Federal da OAB e à Ordem goiana solicita que a referida previsão legal seja excepcionalmente interpretada para permitir que mesmo os inscritos inadimplentes com a seccional do estado e os regularmente inscritos possam votar e ser votados.

“É salutar que esse mesmo reconhecimento ocorra para que os eleitores, advogadas e advogados que estejam devidamente habilitados e inscritos na OAB-GO, estejam aptos a votar, não se impondo a exigência de regularidade financeira para que possam exercer o direito a voto”, destaca Medeiros.

O Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento com repercussão geral, decidiu que impedir o exercício de direitos em razão da inadimplência ainda que em tempos ordinários é incompatível com a Constituição.

Na avaliação de Pedro Paulo, essa decisão, individualmente, já é suficiente para que se atenda ao pedido, já que ela não aceita meios indiretos de coerção ao pagamento de anuidades ao respectivo conselho profissional.

Eleições virtuais

Além do DF, sete estados já tiveram autorização do Conselho Federal para as eleições on-line: Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Tocantins, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. O sistema de votação eletrônica foi desenvolvido pela Justiça Eleitoral, e, portanto, tem chancela oficial que reduz, consideravelmente, o risco de fraudes.

“Os gastos com uma eleição presencial são muito altos. Trabalhamos essa hipótese [de voto on-line] desde antes da pandemia e, com a pandemia, se tornou ainda mais importante”, afirma ao Metrópoles o presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior.

Algumas Ordens de outras unidades da Federação realizarão eleições pela internet em 2021, e outras já as realizaram em pleitos anteriores, com sucesso.

No pedido analisado pelo Conselho Federal da OAB, há recomendação para que o Tribunal Regional Eleitoral e a Polícia Federal, com expertise em segurança cibernética e em eleições nacionais e regionais, possam auxiliar, inclusive durante os atos preparatórios da eleição, a execução e posterior contagem de votos.

O Conselho Federal não se manifestou até o momento da publicação desta reportagem.

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