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País fez 57 mil resgates por trabalho similar à escravidão desde 1995

Ministério comandado por Damares Alves tenta padronizar protocolo nacional para atender denúncias de trabalho análogo à escravidão

atualizado

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trabalho escravo
1 de 1 trabalho escravo - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

No campo e na cidade, em carvoarias, em garimpos, em comércios, em casas de família, em indústrias… Em diversas atividades do setor produtivo brasileiro o trabalho forçado e/ou em condições degradantes ainda é uma realidade 133 anos após a abolição da escravidão no país.

Em pouco mais de duas décadas, contadas a partir de 1995 até o ano passado, as autoridades brasileiras realizaram 57.644 resgates de trabalhadores em condições análogas à de escravo, mostram dados do setor de Inspeção de Trabalho do Ministério da Economia, que faz essa contabilidade.

São muitos casos e pouca repercussão, apesar da dramaticidade que acompanha a maioria das histórias. Um caso que ganhou atenção nacional recente foi o de Madalena Gordiano, uma mulher libertada pela Polícia Federal em novembro de 2020, em Patos de Minas (MG), após mais de três décadas de trabalho doméstico forçado e sem pagamento na casa de uma família.

O caso de Madalena, como a grande maioria, chegou ao conhecimento das autoridades graças a denúncias. No caso dela, a origem dessas denúncias foram vizinhos que tiveram acesso a bilhetes que ela passava por baixo da porta, com pedidos de socorro.

Para tentar fazer com que essas denúncias cheguem sempre às autoridades, o governo federal, por meio do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, está buscando os governos estaduais para tentar ampliar o uso de um protocolo ações a serem seguidas, o Fluxo Nacional de Atendimento às Vítimas de Trabalho Escravo.

De acordo com a pasta comandada por Damares Alves, 14 estados e o Distrito Federal já aderiram a essa ferramenta, lançada em 2021, e estão unindo esforços para sistematizar a política pública de combate ao trabalho análogo à escravidão.

Essa ferramenta foi desenvolvida pela Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) e regulamentada por uma portaria do governo federal. O plano cria rotinas de atuação desde o recebimento da denúncia, passando pelo planejamento da operação, resgaste, atendimento, e chegando até o acolhimento das vítimas em programas que buscam evitar que a pessoa passe novamente pela situação.

Nesse pós-resgate, o trabalho fica a cargo, principalmente, de órgãos e serviços da assistência social, que deverão acompanhar as vítimas e suas famílias.

Não é apenas o trabalho forçado

Jornadas exaustivas e sem pagamento regular; restrições à locomoção dos trabalhadores; retenção de documentos, como a Carteira de Trabalho, ou a imposição de condições degradantes também são características do trabalho análogo à escravidão.

Como denunciar

Vítimas, parentes ou cidadãos que suspeitem de situações de abuso de trabalhadores podem fazer denúncias a órgãos como as polícias Militar e Civil ou o Ministério Público local. O Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos também disponibiliza canais a nível nacional: os telefones 100 ou 180, o aplicativo Direitos Humanos Brasil (para Android e iOS) e o número 61 99656-5008, pelo qual é possível entrar em contato por WhatsApp ou Telegram.

Só no ano passado, segundo a pasta, foram recebidas quase duas mil denúncias de trabalhos análogos à escravidão; a maioria no estado de São Paulo (445), seguido por Minas Gerais (238), Rio de Janeiro (136) e Bahia (114).

Os números da vergonha

Os dados mantidos pelo Ministério da Economia não revelam quantos trabalhadores foram libertados nas 57.644 operações de resgate feitas entre 1995 e 2021, mas mostram detalhes geográficos das ocorrências. A cidade brasileira com mais operações registradas no período foi Confresa (MT), com 1.393 casos. Em seguida, aparecem duas cidades do Pará: Ulianópolis (1.304 casos) e São Félix do Xingu (1.140). No quarto lugar, está Brasilândia (MS), com 1.011 resgates, e, em quinto, Campos dos Goytacazes (RJ), com 982 resgates.

Comportamento paradoxal no governo federal

Apesar do esforço do ministério de Damares para melhorar o combate ao trabalho análogo à escravidão, o assunto não está pacificado nem no âmbito do governo federal. Em dezembro do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro criticou o esforço nesse sentido promovido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

“Olha as normas regulamentadoras, como era difícil ser um grande empresário, empregador, com aquelas NRs [normas]. O Marinho (Rogério Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional) fez um limpa naquilo. A altura da pia, maciez do papel higiênico, tudo isso era motivo de multa. Ele (Marinho) acabou com milhares de itens que atrapalhavam a vida de vocês”, afirmou Bolsonaro a uma plateia de empresários e integrantes do governo em um evento organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), no dia 7 de dezembro de 2021.

Bolsonaro também atacou, sem dar detalhes, uma operação do MPT no Ceará. Segundo o presidente, ele recebeu um telefonema no Palácio do Planalto do fazendeiro multado por expor trabalhadores ao trabalho escravo.

De acordo com o próprio Bolsonaro, os trabalhadores dessa fazenda não tinham dormitório, banheiro ou local adequado para comer. “Há pouco, um telefonema do interior do Ceará. Um cabra que ligou para alguém da Presidência, passou o telefone para mim: ‘Acabei de ser multado aqui, eu estava com meu pessoal colhendo folha de carnaúba. Chegou o MP do Trabalho e largou meia dúzia de multas em cima de mim”, relatou Bolsonaro, relembrando o diálogo com o infrator:

“Multou por quê? Porque não tenho banheiro químico. Eu estou a 45 graus e obviamente não tenho banheiro químico. O cara vai deixar de colher a folha ali, andar 500 metros, fazer um xixi e voltar? Meteram a caneta no cara. Também uma mesinha feita de forma rústica, com madeira da região, para servir o almoço. Não estava adequada aquela mesa. Também a questão do dormitório, o pessoal dormia em uma barraca. Multa em cima dele”, reclamou o presidente da República.

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