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Obra que funciona 24h em prédio tira sono e gera protestos em SP

A empresa Even, que constrói um edifício residencial de alto padrão, é alvo de reclamações de moradores da Vila Mariana, na capital paulista

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Obra em prédio da construtora Even na cidade de São Paulo
1 de 1 Obra em prédio da construtora Even na cidade de São Paulo - Foto: Reprodução

São Paulo – Moradores da Vila Mariana, bairro de classe média-alta da zona sul de São Paulo, estão revoltados com a construção de um edifício residencial. Eles acusam a construtora Even, responsável pelo empreendimento, de constantemente iniciar as obras às 6h e encerrar após as 21h.

A administradora de banco de dados, Karina Vaz, 41 anos, diz que os funcionários da empresa começaram a trabalhar em julho, quando foi acordada ao som de bate-estaca em um sábado, às 7h. Desde então, sua rotina tem sido modificada em meio à pandemia de Covid-19 aos sons de martelada, máquinas e vozes. Ela mora em um prédio de frente para a obra.

Karina afirma que desceu para conversar com os operários, que disseram ter um alvará entregue pela Prefeitura de São Paulo que permite a atividade 24 horas por dia. Ela e outros vizinhos da região entraram em contato com a Even, que informou “verificar o ocorrido”, mas não deu uma resposta.

Ela conta que as obras geralmente têm início às 6h; há dias em que os trabalhadores permanecem no local até depois das 21h. Karina relata que há descarregamento de material de construção na madrugada. A Even está construindo o conjunto residencial de luxo VM 303, onde antes eram casas e restaurantes, a partir de R$ 2,1 milhões a unidade. A previsão de entrega é setembro de 2022.

Caso de polícia

Sem uma resposta efetiva, Karina e outros moradores registraram, em outubro, um boletim de ocorrência por perturbação do sossego. Cerca de um mês depois, a construtora entrou em contato e sugeriu a criação de um grupo no WhatsApp com integrantes da ouvidoria e do departamento jurídico da empresa.

Nele seria avisado, por exemplo, quando o horário de trabalho ultrapassasse as 18h. Na prática, não foi o que aconteceu. “A gente foi iludido porque nos disseram inúmeras vezes que esqueceram de avisar”, afirma ela. Além desse pedido, os vizinhos da obra querem que não haja obra aos domingos.

Insatisfeitos, os moradores entregar um abaixo-assinado à subprefeitura da Vila Mariana, que sugeriu levar o caso ao Ministério Público. Em janeiro deste ano, a Polícia Civil colheu o depoimento de cada um dos reclamantes. No entanto, Karina disse que não houve nenhuma resposta até o momento.

Prefeitura não fiscaliza obras

Na cidade de São Paulo, a lei do Programa de Silêncio Urbano (PSIU) fiscaliza bares, igrejas, bailes funk, entre outros. No entanto, a vistoria não é permitida em obras e residências.

Entretanto, a Lei de Zoneamento 16.402/2016, que trata do uso e da ocupação do solo na capital, proíbe a emissão de ruídos com níveis mais altos aos aceitos pela legislação municipal, estadual ou federal. O Decreto 57.443, de novembro do mesmo ano, sugere que empresas que descumprirem a regra serão orientadas a se adequarem, com possibilidade de multa.

Em zonas residenciais, de acordo com a NBR 10151, elaborada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o limite aceitável em áreas residenciais entre 7h e 22h é de 50 decibéis, equivalentes a uma conversa entre pessoas. Das 22h às 7h, cai para 45 decibéis.

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Panelaço contra o barulho

Para conseguir dormir, Karina comprou uma cortina antirruído que reduz o ruído em até 20 decibéis. Porém, nem mesmo o equipamento a impede de ser acordada com o som de marteladas diariamente. Ela vive sozinha e relata que o barulho das obras interfere não só no seu sono, como também no seu trabalho.

“A obra virou meu despertador, eu não consigo trabalhar com a janela aberta. Meus colegas de trabalho [em reuniões virtuais] brincam comigo, falam que eu trabalho dentro de uma obra e encho laje.”

No sábado (20/3), os moradores se voltaram contra o som de descarregamento de material de construção e iniciaram um panelaço às 20h. “Foi uma insatisfação geral de pessoas que estão muito incomodadas”, declara.

Cerca de meia hora depois, a Polícia Militar compareceu ao local e pediu que o trabalho fosse interrompido. No dia seguinte, nem sinal dos funcionários, relata a administradora.

À procura de um novo lar

Em razão da poluição sonora, a analista de mercado financeiro, Fernanda Pascoal, 35 anos, está à procura de um novo lugar para morar depois de cinco anos. No contexto de pandemia, em que ficar em casa é essencial para não espalhar o vírus, sua residência já não é mais o seu refúgio. Às noites, a iluminação da obra entra nos apartamentos da vizinhança juntamente com os ruídos.

“Como a prefeitura autorizou que uma construtora tenha poder de trabalhar 24 horas por dia? A gente está tentando só ter um pouco de paz, mas é caso de peixe grande, um problema maior do que a gente imagina. É como se eu estivesse enjaulada, a sensação é horrível. Essa obra não vai acabar tão cedo, quero sair do prédio”, lamenta Fernanda.

A reportagem entrou em contato com a prefeitura, que respondeu, em nota. “A Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) informa que a obra possui alvará regular junto à Prefeitura de São Paulo. O proprietário e responsável técnico pela obra devem respeitar os parâmetros de incomodidade estabelecidos no Quadro 4B da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo – Lei de Zoneamento (Lei nº 16.402/2016) e que determinam limites máximos de decibéis permitidos de acordo com cada zona de uso.”

Falta de equipamento contra Covid-19

Além das reclamações, os moradores apontam que os operários da Even não utilizam máscara de proteção contra a Covid-19. A reportagem teve acesso a vídeos que comprovam a afirmação. Karina Vaz detalha que, após o almoço, os trabalhadores descansam na calçada sem o equipamento facial.

Ao Metrópoles, a Even disse lamentar “qualquer transtorno” e “trabalha para amenizar os barulhos durante o descarregamento de materiais”. “Entendemos os impactos que a construção civil pode gerar no seu entorno e estamos atentos e preocupados em reduzir o transtorno gerado aos vizinhos das nossas obras, tomando todas as medidas para minimizá-lo”, informa (leia a íntegra abaixo).

De acordo com Karina, além do incômodo gerado pelos sons, os funcionários arriscam a saúde deles e a dos demais com a exposição ao coronavírus. Ela apresentou um pedido de instauração de inquérito ao Ministério Público do trabalho, que indeferiu a solicitação, conforme decisão do procurador Daniel Augusto Gaiotto.

“Eles trabalham demais, nunca vi uma troca de turno durante concretagem, me parece que eles estão à margem. Penso até que o meu problema com o barulho é o menor de todos”, finaliza.

Confira abaixo a nota da construtora Even:

Lamentamos qualquer transtorno que possa ter sido causado e esclarecemos que a Even cumpre todas as normas dos órgãos públicos quanto ao nível de ruído e funcionamento de suas obras.

A empresa expõe que, devido ao descarregamento de materiais e regras de circulação de transportes da prefeitura, em determinados momentos da obra, o barulho pode causar incômodo maior e atua para amenizá-los da melhor forma.

Entendemos os impactos que a construção civil pode gerar no seu entorno e estamos atentos e preocupados em reduzir o transtorno gerado aos vizinhos das nossas obras, tomando todas as medidas para minimizá-lo.

Informamos também que as leis trabalhistas de regulamentação de horário de trabalho são seguidas rigorosamente.

Ao longo de toda a pandemia de Covid-19, a empresa se manteve atenta aos protocolos de segurança sanitária seguindo as recomendações das autoridades, fornecendo EPI’s aos seus colaboradores, treinando e fiscalizando a sua utilização.

Em 2020 fomos reconhecidos pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo (Sintracon-SP) como empresa referência na adoção de medidas preventivas e recebemos a medalha “A Luta pela Vida – #ObrasSemCoronavírus” de reconhecimento à nossa conduta e solidariedade no combate à pandemia.

A empresa mantém seus canais abertos para quaisquer esclarecimentos.”

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