O doloroso primeiro Natal do pai de Henry sem o filho: “Muito difícil”
Em casa, o quarto do filho é um refúgio para Leniel. No local quadros, brinquedos e roupas que menino sequer havia conseguido usar ainda
atualizado
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Rio de Janeiro – Entre lágrimas e rodeado de lembranças, o engenheiro Leniel Borel, de 37 anos, ainda passa horas de seus dias no quarto do filho Henry, de 4 anos. Brinquedos, roupas que sequer foram usadas, sapatos, fotos e quadros guardam a memória do garoto.
O menino foi morto em 8 de março, e o laudo apontou 23 lesões. A mãe do menino, Monique Medeiros, e o padrasto, o médico e vereador cassado Jairo Souza dos Santos Júnior, o Dr. Jairinho, estão presos acusados do crime. A terceira audiência do caso foi marcada para 9 de fevereiro no 2º Tribunal do Júri, onde Jairinho e Monique serão ouvidos.
Apesar das investigações, há um período obscuro que não foi esclarecido pela Polícia Civil: o que ocorreu entre 19h, do dia 7 de março, e 3h, do dia seguinte. Mas Leniel não tem mais esperança em saber. “Ela [Monique] teve todas as oportunidades e não falou a verdade”, avalia Leniel, em entrevista ao Metrópoles, concedida na última segunda-feira (20/12).
Leniel detalha a rotina que mantinha com o menino, a paixão do pequeno pela dança e o prato predileto. “Ele adorava o Mario Bros. Gostava de montar lego. No nosso último almoço, comeu arroz, feijão, purê de batata e franguinho”, conta.
Na conversa com a reportagem, Leniel é envolvido pela emoção, clama por justiça e diz que o filho falou sobre a violência que sofria, mas que acabou acreditando na mãe.
“Tive que acreditar na mãe, não acreditei no meu filho”, lamenta. Leniel pediu à família para que passe o Natal em sua casa para enfrentar a celebração sem o menino.
O que você e o Henry gostavam de fazer?
Pegava o Henry todos os finais de semanas. A gente ia para casa dos meu familiares, íamos para onde tivesse crianças. Ele gostava muito de brincar com crianças e em parquinhos de shopping. Durante a pandemia, ele ficou recluso como todas as crianças. Se quisesse ficar com a avó, mãe da Monique, em Bangu, eu levava. Ele gostava muito de ficar com a avó.
Na véspera da morte dele, vocês foram a um parquinho.
Fomos a um parquinho aqui no Recreio [dos Bandeirantes]. Sempre ficava lá, não era um pai que deixava o filho. Ficava brincando com ele. Na verdade, fomos almoçar, primeiro, em um lugar que ele adorava. O Henry gostava de arroz, feijão e purê de batata, era a comida preferida dele. Nesse restaurante tem um prato que é arroz, feijão, purê e franguinho.
Desde que você se separou, você mora aqui, onde está preservado o quarto do menino?
Tenho esse apartamento desde 2007, 2008. A Monique veio morar aqui. Esse é o quarto do meu filho. Os brinquedinhos dele estão aqui. Tinha muito mais brinquedos, mas quanto a gente se separou, houve uma divisão, Monique ficou com a maior parte, assim como as roupas. Tem roupas aqui que ele nunca usou. Ele também tinha um quarto em Bangu, nos fundos da casa da mãe da Monique. Ele gostava muito de ficar com os pais da Monique, os avós.
Quais os brinquedos que estão aqui, o Henry mais gostava?
Ele gostava muito de lego e montar coisa. Montávamos na piscina que tem aqui. Tudo tinha um significado. Ele também gostava muito de dançar. Tem um sapo aqui que a minha mãe deu para ele. O sapo dança e o Henry adorava dançar. Ele gostava tanto do sapo que quebrou, mas ele ganhou outro da minha mãe. Era emocionante ver o Henry dançando.
Esse sapo tem um nome?
Esse, não. Mas ele deu o nome de Jorge a um urso que comprei no Ano Novo. O urso veio vazio, nós fomos juntos enchê-lo, a loja inteira parou para ver o Henry entrando até dentro do urso. Aqui no guarda-roupas ainda tem roupinhas que ele não usou. Ainda tenho a blusa do último dia que ele esteve comigo e usou. Tem outra ainda com a etiqueta. Não consigo dar, comprei para o meu filho. Mas está tudo aqui, o óculos de sol. Ele adorava o Mario Bros, temos várias coisas aqui.
O que esse quarto representa hoje para você?
A maior lembrança do meu filho. As coisinhas dele estão aqui. Uma das coisas que tenho pensado é sobre como ajudar outras vítimas, outras crianças. Criar uma ONG e levar essa coisas do Henry. É preciso prevenir a violência, a criança fala, o meu filho falou. Fui em cima da mãe, fui em cima do Jairo, e ambos falaram que nada estava acontecendo. Falei com a avó, com a babá e todos falaram que nada estava acontecendo.
Por isso, foi difícil de acreditar?
Na verdade, vou levar para sempre esse sentimento de impotência. Tive que acreditar na mãe, não acreditei no meu filho. Meu filho falou, falaram que era uma reação psicológica ao novo lar, ao novo tio, sou filho de pai separado, sei o que sofri. Me empenhei para ele ficar bem, tirei férias em fevereiro.
Não havia como prever tamanha violência.
Não tinha como. Quem estava lá era garantidora, obrigada a defender, resolveu não fazer por seus motivos próprios. Meu filho foi posto em um cenário de violência, de agressão, uma criança linda, sem possibilidade de defesa. O Henry era para estar aqui agora, brincado, pulando. O Henry poderia ter ficado comigo, como pedi.
Como era o ritual de vocês no Natal?
Henry ganhava tantos presentes que tinha uma hora que ele não aguentava mais abrir. Sempre fui um pai muito bobo. Um pai de dar, Monique também, muitas lojas de brinquedos conheciam o Henry. No Natal eram para mais de 20 brinquedos. Ele era grato, tinha zelo pelas coisas dele.
E como é para você enfrentar o primeiro Natal sem o Henry, uma data que simboliza o amor, o afeto?
Muito difícil. O Henry está sempre no meu coração. Choro todos os dias. Pedi para a minha família vir para cá nesse Natal, eu não consigo sair de casa, é muito difícil, é muito difícil sair da cama. Estou trabalhando em home office. Vai ser um Natal bem doloroso sem poder dar brinquedos para o meu filho, sem poder ver aquele sorriso inocente de uma criança ganhando um brinquedo.
Como foram os natais passados?
O irmão da Monique se vestiu de Papai Noel, ele ficou contente. O Natal passado peguei Covid uma semana antes. A Monique, por razões óbvias, disse que não podia ficar com ele. Fiz exames, fui no Barra D’or, mas [o resultado] não saía no dia, eu não podia sair, falei por call no Whatsapp. Em 2019, foi complicado, como trabalho como coordenador de projeto, o pai da Monique havia operado. Dois dias depois, consegui dar os brinquedos, brincar com ele. Passamos o Ano Novo juntos.
E como foi a comemoração do Natal passado quando você pôde encontrá-lo?
Consegui pegar dois dias depois do Natal. Aluguei uma casa em Arraial do Cabo, Região dos Lagos. Ficamos na praia brincado. Acho que o Henry chupou uns 10 picolés. As pessoas que conheceram o Henry ficavam: ‘que criança dócil, que criança mais linda’. Ele gostava muito do Homem-Aranha. Tinha um cara na praia vestido de Homem-Aranha e falei, quero que você fique aqui, do lado do meu filho. Ali foi meu último Natal e Ano Novo. Vimos a queima de fogos.
Apesar das investigações, há ainda uma parte obscura sobre o que houve, entre às 19h e 3h. Para você, quais perguntas ainda estão sem resposta?
A verdade sobre o que aconteceu naquela noite. Sou grato a Polícia Civil, a imprensa, as médicas, todos que contribuíram para que chegasse até aqui. Quero saber o que possa ter acontecido, meu filho teve 23 lesões. No hospital, ele estava todo inchado, cheio de marcas e eu perguntava para as médicas o que tinha acontecido. Elas falavam: ‘Papai, o seu filho já chegou aqui morto’.
O que você ouviu de Jairinho e Monique?
Primeiro, o Jairo falou que ouviu um barulho e foi lá e o Henry estava na cama. Então, o Jairo chamou a Monique e foram para o Barra D’or. Então, perguntei o por que não fizeram o procedimento de primeiros socorros. O Jairo foi me apresentado como médico. Ele foi dirigindo e a Monique tentando fazer respiração boca a boca, foi o que falaram. Achei isso muito estranho. Os médicos tiveram dificuldade em entubar meu filho porque já havia a rigidez cadavérica. Somente aqueles dois podem falar o que realmente aconteceu naquele apartamento.
Você acha que no interrogatório deles marcado para o dia 9 de fevereiro, a verdade vai aparecer?
Esperei muito que a Monique falasse a verdade à polícia, tinha todo o aparato, podia ser protegida. Pensei que ela tivesse sido coagida, oprimida, mas ali a gente viu que ela deu uma versão mentirosa. Depois, ela deu entrevista para um emissora de TV e não falou a verdade. Em carta, fala de tudo, mas não fala o que houve. Por isso, o delegado não quis ouvi-la. Por último, deu entrevistas dentro do presídio e ela não falou. Ela já teve todas as oportunidades.
Houve os depoimentos na Justiça dos familiares.
O meu filho amava muito a avó (Rosângela), mãe da Monique. A avó mentiu dizendo que não sabia que meu filho estava sendo agredido. Tem o vídeo do meu filho mancando. Neste episódio, a Monique não foi para o Barra D’or, foi para Bangu, falou com familiares. Falou comigo por telefone que o Henry tinha caído da cama em Bangu, o que era uma grande mentira. Todos sabiam, inclusive, o pai da Monique (já falecido), fala em um telefone, que todos nós poderíamos ter protegido e não fizemos. Ele fala isso em uma conversa com Monique.
Você é assistente da acusação.
Contratei perito. Tenho os meus advogados. O Henry morreu entre meia-noite e 1h da manhã. Aqueles dois ficaram ali montado um cenário do que iriam fazer após assassinarem meu filho. Não sei o que aconteceu na cabeça daqueles dois, é demoníaco. Mas, talvez, estaríamos aí falando em nova caso Isabella Nardoni porque teriam jogado meu filho pela janela e depois falariam que ele teria caído propositalmente.
O que você espera da Justiça?
Espero que a Justiça seja feita na proporção da brutalidade que aqueles dois criminosos fizeram, de forma exemplar, para que todo agressor de criança neste país saiba que ele vai ter esse tipo de pena. Espero muito com pai, que tanto a Justiça dos Homens quando a de Deus será feita. Quero aplaudir de pé. Hoje, estou aqui com essa camisa, violência contra a criança é covardia, é crime.