No Setembro Amarelo, Osmar Terra e Damares erram dados sobre suicídio
Ministros participaram de simpósio sobre o tema na Câmara dos Deputados em 10 de setembro
atualizado
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O Setembro Amarelo tem ampliado os debates sobre prevenção do suicídio no país. Criada em 2015 pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), pelo Conselho Federal de Medicina e pela Associação Brasileira de Psiquiatria, a campanha promove atividades de conscientização ao longo de todo o mês. Na última terça-feira (10/09/2019), Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, três ministros do governo Bolsonaro compareceram a um simpósio na Câmara dos Deputados para falar sobre o assunto.
O ministro da Cidadania, Osmar Terra, chamou atenção para o fato de que o número de casos tem aumentado no Brasil. A ministra da Mulher, Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, aproveitou o espaço para falar sobre sua experiência e disse que o poder público se omitiu sobre o tema no passado. Por fim, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou que os idosos são os que mais atentam contra a própria vida.
A Lupa acompanhou a transmissão do evento e checou algumas frases ditas pelos ministros. Veja o resultado:
“A proporção é maior do suicídio conforme [cresce] o grau de instrução”
Osmar Terra, ministro da Cidadania, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
De acordo com os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do DataSUS, o maior índice de suicídio não está entre as pessoas que têm maior grau de instrução no país. A taxa cresce na comparação dos grupos de menor escolaridade – sem escolaridade e de um a sete anos de estudo -, mas cai nas faixas de instrução mais alta – de oito a 11 anos de estudo e de 12 anos ou mais.
Em 2017, dado mais recente disponível pelo DataSUS, o índice de suicídios ficou em 3,56 mortes por 100 mil habitantes entre os brasileiros que nunca estudaram. A taxa subiu para 6,65 casos por 100 mil no grupo que tem entre um e sete anos de estudo – o que equivaleria ao ensino fundamental incompleto.
Já na parcela da população com oito a 11 anos de estudo (que tem ao menos o ensino fundamental completo, o ensino médio incompleto ou o ensino médio completo), houve 4,37 mortes por 100 mil habitantes. No grupo com 12 anos ou mais de estudo, ou seja, o que tem maior escolaridade no país, o índice cai para 4,07 suicídios por 100 mil, nos dados sobre 2017.
Para chegar a esses números, foi feito um cruzamento dos dados do DataSUS com o nível de instrução dos brasileiros no 4º trimestre de 2017, medido pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua Trimestral do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Seguindo orientação do IBGE, a categoria “Ensino fundamental incompleto ou equivalente” da Pnad foi considerada equivalente à soma da escolaridade de 1 a 3 anos e de 4 a 7 anos do SIM do DataSUS, enquanto “Ensino fundamental completo ou equivalente”, “Ensino médio incompleto ou equivalente” e “Ensino médio completo ou equivalente” foram somados para corresponder ao grupo que tem entre 8 e 11 anos de escolaridade do SIM do DataSUS.
Procurada para comentar, a assessoria do ministro Osmar Terra não respondeu.
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“E o Rio Grande do Sul é o estado que tem o maior número de suicidas no Brasil (…)”
Osmar Terra, ministro da Cidadania, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
O maior número de suicídios do país em 2017 foi registrado em São Paulo, de acordo com os dados mais recentes disponíveis no SIM, do DataSUS. Houve 2.306 mortes por lesões autoprovocadas intencionalmente no estado. Isso representa 18,5% do total de 12.495 suicídios que ocorreram em todo o Brasil naquele ano.
O segundo colocado foi Minas Gerais, com 1.515 casos (12,1%). O Rio Grande do Sul, citado pelo ministro Osmar Terra, apareceu na terceira posição entre as 27 unidades da Federação, com 1.349 mortes (10,8%). Em quarto lugar estava o Paraná, com 774 casos (6,2%). Santa Catarina ficou na quinta posição, com 739 suicídios (5,9%).
Procurada para comentar, a assessoria do ministro Osmar Terra não respondeu.
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” (…)[O Rio Grande do Sul tem a] maior proporção de suicidas no Brasil”
Osmar Terra, ministro da Cidadania, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
O Rio Grande do Sul teve 11,9 suicídios por 100 mil habitantes em 2017, maior taxa registrada no país. O resultado foi obtido a partir do cruzamento dos dados do SIM, do DataSUS, com as estimativas populacionais do IBGE para cada uma das unidades da Federação naquele ano.
O Rio Grande do Sul tem registrado altas taxas de suicídio por 100 mil habitantes nos últimos anos. Em 2016, foram 10,3 casos por 100 mil habitantes, de acordo com boletim epidemiológico do Ministério da Saúde. Naquela ocasião, o estado foi superado por Roraima, com índice de 11 óbitos por 100 mil habitantes. Considerado todo o período que vai de 2011 a 2015, o Rio Grande do Sul ficou em primeiro lugar, com 10,3 suicídios por 100 mil habitantes, segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde de 2017.
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“[Está] Cada vez aumentando mais o número de suicídios [no país]”
Osmar Terra, ministro da Cidadania, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
Os suicídios têm aumentado no Brasil tanto em números absolutos quanto na taxa por 100 mil habitantes. Em 1997, o SIM, do DataSUS, registrou 6.923 casos, correspondentes a um índice de 4,34 mortes por 100 mil habitantes. O total de óbitos por lesões autoprovocadas intencionalmente chegou a 12.495 casos, ou 6,02 suicídios por 100 mil habitantes no país em 2017, último dado disponível.
Na série histórica que vai de 1999 a 2017, o total de casos teve redução apenas em dois anos (1999 e 2002) na comparação com o período anterior. Já na taxa por 100 mil habitantes, houve crescimento ano a ano desde 2009 (4,9 casos por 100 mil), com apenas uma pequena queda registrada em 2013 – 5,24 mortes por 100 mil, contra 5,32 suicídios por 100 mil em 2012.
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“O poder público, no passado, se omitia em relação a esse tema [suicídio]”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
O site do Ministério da Saúde mostra que houve várias iniciativas do poder público para prevenção do suicídio em governos anteriores. Em 2006, no governo Lula, a Portaria nº 1.876 instituiu as Diretrizes Nacionais para Prevenção do Suicídio. As medidas deveriam ser implantadas em todas as unidades da Federação, respeitadas as competências das três esferas de gestão. Ainda naquele ano, o ministério lançou um manual voltado aos profissionais das equipes de saúde mental para esclarecer questões relacionadas à prevenção do suicídio.
Em 2011, no governo Dilma, o Ministério da Saúde editou a Portaria nº 3.088, que instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para pessoas com sofrimento ou transtorno mental. Embora a portaria não cite especificamente o suicídio, o texto fala sobre cuidados em saúde mental e sobre os serviços de urgência e emergência (UPA 24 horas e Samu 192), necessários em casos de suicídio.
A pasta também editou a Portaria nº 1.271 em 2014. Ela define a Lista Nacional de Notificação Compulsória, que tornou obrigatória a notificação imediata das tentativas de suicídio e do suicídio em todo o território nacional. Um ano depois, o ministério começou uma parceria com o Centro de Valorização da Vida (CVV), que atende e auxilia pessoas que pensam em cometer suicídio. Essa parceria está vigente até o momento, tendo sido ampliada em 2017.
O Ministério da Saúde ainda lançou, em 2017, a Agenda de Ações Estratégicas para a Vigilância e Prevenção do Suicídio e Promoção da Saúde no Brasil. O documento traça objetivos para prevenção do suicídio de 2017 a 2020. A pasta cita ainda em seu site outras duas portarias lançadas em 2017 – Portaria nº 3.479 e Portaria Nº 3.491 – que também visam a prevenção do suicídio.
Procurada, a assessoria de imprensa da ministra informou que ela se referia ao protagonismo que o tema do suicídio tem atualmente no governo Bolsonaro, mas não destacou ações específicas.
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“Já que a gente tem observado um aumento do suicídio nessa faixa etária [criança e adolescente]”
Luiz Henrique Mandetta, ministro da Saúde, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
Os dados do SIM, do DataSUS, indicam que o número de suicídios entre crianças e adolescentes cresceu nos últimos anos. Em 2017, o sistema identificou o suicídio de 1.055 crianças e adolescentes de até 19 anos, uma alta de 16,9% na comparação com 2016, quando 903 pessoas desta mesma faixa etária morreram por lesões autoprovocadas. No período de 2010 a 2017, o aumento foi de 48,8%.
Um estudo realizado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) mostra que o suicídio de adolescentes cresceu 24% entre os anos de 2006 e 2015 nas seis cidades analisadas (página 3). A pesquisa reuniu os casos ocorridos em Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP).
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“Ainda são as pessoas acima de 65 anos as que mais sofrem com (…) suicídio”
Luiz Henrique Mandetta, ministro da Saúde, em simpósio na Câmara dos Deputados no dia 10 de setembro de 2019
Os dados do SIM, do DataSUS, mostram que a incidência de suicídios é maior entre os idosos (60 anos ou mais) do que em outros grupos etários. A taxa foi mais alta na parcela de maior idade da população entre 2015 – quando atingiu 7,76 casos por 100 mil habitantes – e 2017 – último ano com dados disponíveis, quando se registraram 8,19 mortes por 100 mil. Os índices ficam ligeiramente acima daqueles computados para a população adulta – 7,55 suicídios por 100 mil habitantes em 2015 e 8,19 mortes por 100 mil em 2017.
Os números vieram do cruzamento de dados do DataSUS com as projeções populacionais por faixa etária do IBGE. Foram consideradas como jovens as pessoas de 10 a 29 anos, como adultas as que têm de 30 a 59 anos e como idosas aquelas com idade de 60 anos ou mais. Depois disso, foi calculada a taxa de suicídios por 100 mil habitantes dentro de cada um dos grupos etários.
Quando analisada a incidência nas faixas etárias, o maior índice de óbitos por lesões autoprovocadas intencionalmente atinge a população que tem entre 60 e 69 anos. Em 2017, foram 4,68 mortes por 100 mil habitantes nesse contingente. Havia na época 26,9 milhões de idosos no Brasil. Na segunda faixa com incidência mais crítica estão os jovens de 20 a 29 anos, que tiveram taxa de 3,59 por 100 mil habitantes. Em terceiro lugar vieram os adultos de 30 a 39 anos, com 3,12 mortes por 100 mil.