No Rio, CTI do Hospital Ronaldo Gazolla tem rotina de estresse e drama
Metrópoles entrou no Centro de Terapia Intensiva da unidade – um dos maiores do Brasil e referência para infectados pelo novo coronavírus
atualizado
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Rio de Janeiro – Um dos maiores Centros de Tratamento Intensivo (CTIs) do Brasil, para aqueles que apresentam complicações por infecção pelo novo coronavírus, é carioca e fica no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, em Acari, na zona norte do Rio de Janeiro. A unidade de saúde recebe, diariamente, pacientes graves, de todas as regiões da cidade e até de outros municípios. A rotina no local é estressante para os profissionais e dramática para quem tem parentes internados.
“O número de CTIs cresceu muito e, apesar do aumento na complexidade do trabalho, a mortalidade aqui dentro está diminuindo. O número está em torno de 38%”, explica Roberto Rangel, diretor da unidade de saúde.
O Hospital Ronaldo Gazolla conta com 420 leitos: 207 de enfermaria e 213 de terapia intensiva. Para atender a tantos pacientes, o plantão reúne 3.248 profissionais de saúde, entre os quais há 548 médicos, 346 fisioterapeutas, 630 enfermeiros e 1.368 técnicos. A rotina e a rotatividade de pacientes na unidade já gerou cenas fortes, como a do engarrafamento de ambulâncias chegando com pessoas infectadas para receberem atendimento.
O médico intensivista Cláudio Chagas, de 41 anos, comandou por oito meses os hospitais Ronaldo Gazolla e o de Campanha, no Riocentro. “A principal mudança na minha vida com a pandemia foi entender que ‘eu não tinha mais família’. Foram meses de muito trabalho. Precisei improvisar recursos, adaptar equipamentos e, principalmente, absorver também a necessidade de cuidar dos médicos sob meu comando”, lembra.
Para conhecer a realidade do hospital referência da Região Metropolitana 1 (capital e municípios da Baixada Fluminense), o Metrópoles visitou a ala de terapia intensiva e encontrou o hospital cheio, com profissionais trabalhando intensamente para cuidar das pessoas. Atual diretor da unidade, o médico Roberto Rangel comemora melhora nos indicadores.
“O número de mortes e de casos segue alto, é notícia ruim toda hora. Estamos com o Hospital de Acari (Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, que, desde abril de 2020, é exclusivo para pacientes com Covid-19) completamente lotado”, lamenta o prefeito Eduardo Paes.
O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, atribui o bom funcionamento da unidade, mesmo operando na sua capacidade, à equipe de profissionais.
“Hoje são 400 leitos ativos. E não se abre leitos sem aumentar as equipes. Obrigado a todos os profissionais pela confiança! Não basta abrir leitos, tem que monitorar de perto para garantir a qualidade assistencial #trabalhoemequipe”, escreveu o secretário Soranz, em seu perfil no Twitter, antes da abertura de mais leitos.
A expansão dos leitos no hospital acompanha o crescimento da fila de pacientes esperando por atendimento. A lista de espera desta unidade é maior que a quantidade de leitos disponíveis na cidade. O centro cirúrgico, por exemplo, transformou-se em unidades de terapia intensiva e apenas um box cirúrgico seguirá ativo, para emergências ou procedimentos de maior complexidade. A mudança já foi concluída e os leitos novos já foram disponibilizados.
Até 27 de março, o hospital teve 823 altas, resultado de uma rotina intensa e da dedicação dos profissionais. A primeira avaliação acontece quando o paciente chega à unidade; em seguida, o doente recebe um leito adequado (enfermaria ou intensivo). Os protocolos seguidos à risca fizeram os atendimentos dispararem e a unidade bater recordes de atendimento nesta pandemia.
O contador aposentado Hélio Alves Lima da Silva, de 84 anos, não teve a sorte de deixar a unidade vivo. Segundo a filha do idoso, Mariana Lima da Silva, ele menosprezou o tamanho da pandemia e, por isso, não atendeu aos apelos da família para se proteger.
“Eu falava: ‘Pai, se cuida’, ‘Pai, lava as mãos’. Ele achava que Covid era coisa da imprensa. O meu pai era aposentado e ainda trabalhava, para complementar a renda. Ele andava de ônibus, pegava trem”, lembra. Hélio morava com a esposa no bairro da Abolição, zona norte, e morreu na noite de 8 de março.
O vereador Paulo Pinheiro (PSol), da comissão de Saúde da Câmara do Rio, acompanha o trabalho que vem sendo realizado na unidade, mas alerta: “O Hospital Ronaldo Gazolla está com toda a sua capacidade instalada em atividade. Os problemas mais graves no momento são os recursos humanos e insumos. É preciso agir, para que esses problemas não interfiram no cuidado dos pacientes”.
Para Chagas, a gestão dos recursos humanos é uma das tarefas mais difíceis para quem comanda um hospital. A esposa dele, que é dermatologista, entrou para a equipe do CTI e, assim, eles puderam passar mais tempo juntos. O casal, entretanto, passa o expediente inteiro preocupado com a filha, de 4 anos, que está em casa.
“É duro ficar longe dela, e tudo piora quando assistimos os pacientes morrerem, apesar do esforço de uma equipe médica integrada que atuou de forma hercúlea. Mas tento me confortar sabendo que me dediquei muito e fiz tudo o que pude. Além disso, eu sinto a dor das famílias, porque eu também perdi meu pai e entendo o efeito devastador do vírus”, conta o médico.