Museu na Chapada dos Veadeiros retrata relação do fogo com o Cerrado
Projeto tem objetivo de educar sobre relação simbiótica entre fogo, vegetação e populações ancestrais do Cerrado, mas alertar sobre riscos
atualizado
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Goiânia – O fogo e o Cerrado têm uma relação muito próxima sob a ótica histórica. As queimadas naturais fazem parte dessa paisagem. O bioma é moldado pelos incêndios provocados por raios que antecedem as chuvas. As árvores com cascas grossas e troncos retorcidos precisam de muito calor para a germinação das sementes. Mas há, por outro lado, também, os incêndios provocados, criminosos. Assim, é necessário que haja prevenção e controle das ações.
Para se ter ideia, no ano passado, queimadas fora de controle provocaram devastação na região. Cerca de 28 mil hectares do Cerrado foram destruídos ao longo de duas semanas, inclusive no parque nacional. A situação levou, inclusive, ao indiciamento de quatro moradores de Alto Paraíso de Goiás por incêndio criminoso.
Com o objetivo de educar sobre a relação entre o fogo, a vegetação e as populações ancestrais, além de auxiliar no fortalecimento e disseminação de mecanismos de prevenção e controle de incêndios no bioma, Cavalcante (GO), na Chapada dos Veadeiros, terá um Museu do Fogo. Trata-se da primeira iniciativa do tipo no país e será inaugurada na próxima sexta-feira (23/9).
A unidade fica dentro de um casarão colonial do século XIX, denominado Vila Nômade, um espaço multicultural criado na cidade. A proposta de visitação inclui uma experiência multissensorial e tecnológica e trará aos visitantes a sensação real de estarem atravessando um trecho de floresta em chamas, com sons, luzes e simulação de fumaça.
Além do perfil da conscientização, o espaço pretende ainda atender a demandas locais, como a geração de receitas para a manutenção dos brigadistas, o fortalecimento da atividade turística e a entrega do primeiro espaço museológico no município.
Queimadas
De acordo com o idealizador do projeto, Renato Santos, a motivação da iniciativa foi a percepção da necessidade das queimadas. “Estou morando na Chapada há três anos. Tenho vivenciado o quanto o incêndio no Cerrado impacta na vida de todos. É muito assustador o quanto a fauna e flora sofrem, quando não é um fogo controlado. E aí o questionamento foi por que as pessoas provocam os incêndios sabendo desses riscos de que as chamas podem se alastrar?”, disse ele ao Metrópoles.
“Mas além da inquietação do questionamento, tenho a preocupação da conscientização. Muitas vezes as pessoas provocam o fogo, mas sem a intenção de queimar o Cerrado ou o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, por exemplo. Mas para isso precisamos explicar de maneira mais lúdica, mais clara e sensibilizar essas pessoas sobre como lidar com o fogo de forma adequada”, ressalta.
Segundo o diretor da Brigada Voluntária de Cavalcante (Brivac), Rafael Drumond, parceiro na implantação do espaço, “a intenção é ter um lugar de referência e debates sobre o problema do fogo no bioma, ajudar a entender melhor esse fenômeno e criar forma de proteger a biodiversidade, os recursos hídricos e as pessoas da região”.
Acervo
O museu também terá a participação e contribuição Kalunga, população negra que vive na região há séculos. Por meio de vídeos, eles narrarão a história do fogo no território e como os povos tradicionais faziam seu manejo de forma produtiva. A exposição terá artefatos antigos indígenas, além dos atuais usados pelos brigadistas, para completar a coleção.
“A Comunidade Kalunga tem importância fundamental no museu, pois é através deles e dos povos indígenas, tradicionais, que resgatamos a cultura adequada de lidar com o fogo. Foi com eles que nos inspiramos para todos os conteúdos do museu. Tem uma diferença absurda no trato que eles fazem com o fogo”, reforça Renato Santos.
Ainda de acordo com o idealizador do projeto, o museu ocupará um lugar estratégico na consolidação do Manejo Integrado do Fogo, um modelo inovador de planejamento e gestão que associa aspectos ecológicos, culturais, socioeconômicos e técnicos na execução, integração, monitoramento, avaliação e adaptação de ações relacionadas ao uso de queimas controladas.
O espaço multicultural terá ainda espaço gastronômico, antiquário, café, centro de convivência, coworking e loja de produtos locais.