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Mulheres negociam barriga de aluguel em grupos de Facebook e WhatsApp

Quem se oferece para gerar o bebê de outra pessoa mediante pagamento incorre em crime. Ainda assim, prática é facilmente achada na internet

atualizado

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Pregnant woman
1 de 1 Pregnant woman - Foto: Goja1/iStock

Na busca pelo sonho de se tornarem pais, casais com algum problema de fertilidade recorrem às redes sociais para encontrar mulheres dispostas a encarar os nove meses de gravidez e gerar o filho deles. Em grupos de WhatsApp e no Facebook, nos quais o Metrópoles conseguiu entrar para apurar o mercado on-line que corre à margem da lei, há desde a oferta de bebês para adoção por parte de mães que não têm condições de criar a criança até a prática de inseminação caseira.

Mesmo sabendo que incorrem em ilegalidade, com penas de 3 a 5 anos de prisão, previstas na mesma legislação que proíbe a venda de órgãos e tecidos humanos – a Lei nº 9.434/97 –, mulheres de todas as regiões do país colocam o próprio útero à disposição. E cobram valores que variam de R$ 5 mil a R$ 75 mil.

Mas há também aquelas com intenções altruístas, que se voluntariam para gerar o filho de outra pessoa sem qualquer contrapartida financeira. É a chamada “barriga solidária”, única prática permitida pela legislação e por normativas do Conselho Federal de Medicina (CFM).

Nos anúncios, as pretensas mães de aluguel se descrevem como mulheres jovens – a maioria com menos de 25 anos –, saudáveis, sem vícios e com disponibilidade para viajar. Esse último critério é primordial para as candidatas, pois muitos interessados moram em outros estados ou países; geralmente, hospedam a pessoa que escolherem como “útero de substituição” durante toda a gestação e, não raro, nos primeiros dias do recém-nascido.

Casais, e mesmo mulheres e homens solteiros, que desejam ser pais costumam recorrer ao grupo à procura de barrigas solidárias ou de aluguel. Alguns, inclusive, se anunciam como doadores de esperma, utilizando-se de método totalmente caseiro, sem o intermédio de clínicas ou banco de doadores.

Confira alguns dos anúncios colhidos em dois grupos de Facebook, chamados “Quero ser barriga de aluguel” e “Barriga de aluguel, solidária e coparentalidade”

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Mulher publica anúncio se oferecendo para gerar filho para outras pessoas
Mulheres que não podem ter filhos também publicam anúncios procurando barrigas de aluguel
Mulher de 28 anos cobra R$ 20 mil para alugar o útero
Intermediário procura mulheres com características asiáticas para gerar filho de casal chinês
Homem procura barriga de aluguel para inseminação caseira
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Homem oferece sêmen para inseminação caseira em grupo de barrigas de aluguel

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Mulher publica anúncio se oferecendo para gerar filho para outras pessoas

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Mulheres que não podem ter filhos também publicam anúncios procurando barrigas de aluguel

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Mulher de 28 anos cobra R$ 20 mil para alugar o útero

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Intermediário procura mulheres com características asiáticas para gerar filho de casal chinês

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Homem procura barriga de aluguel para inseminação caseira

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Mulher procura "útero para a realização de uma gestação temporária"

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Outra cobra R$ 25 mil para servir de barriga de aluguel

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Em busca de uma mulher para servir de barriga de aluguel são oferecidos R$ 13 mil, "tudo via contrato"

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Mulher oferece serviço com "valor bem abaixo do mercado"

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No Facebook, convite para participar de grupo do WhatsApp

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Internauta em busca de um bebê

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Pedidos de doação de bebês também são comuns

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Negociação virtual
Após publicar um texto no grupo “Barriga de aluguel, solidária e coparentalidade”, Larissa*, 21 anos, foi procurada por vários casais para alugar o útero. As propostas iam desde a geração de um filho via inseminação caseira até um processo completamente profissional, em uma clínica especializada em reprodução assistida.

Moradora de Barão dos Cocais (MG), município com pouco mais de 30 mil habitantes a 100 km de Belo Horizonte, a jovem conta que, além da contrapartida financeira, sente vontade de ajudar outra mulher a viver a maternidade. “Eu já tenho uma filha, sempre quis passar por outra gestação e, quando me divorciei e comecei a ficar meio apertada, decidi unir o útil ao agradável. Não vou ser hipócrita dizendo que também não pesou a compensação financeira”, contou ao Metrópoles.

Formada em administração e funcionária de um restaurante na pequena cidade onde mora, a jovem tem interesse em se estabelecer em Belo Horizonte e recomeçar a vida por lá. “Para um deles, eu pedi R$ 8 mil. O outro não tinha compensação financeira direta. Eu ficaria com eles durante a gestação e teria moradia até eu me estabilizar na cidade. Ou seja, eles me dariam assistência até eu conseguir me virar por conta própria.”

A jovem e os casais com quem têm mantido contato conhecem cada artigo da legislação sobre o assunto, inclusive os meios de burlá-la. Durante as negociações com dois casais homossexuais, Larissa conta que faria um contrato de união estável com um deles e iria se passar por sua companheira durante toda a gestação. Segundo a jovem, um dos interessados queria o nome dela no registro. “No outro, eu simplesmente sairia de cena e a criança seria registrada sem mãe”, revelou.

Casal de chineses
A mineira também se candidatou para gerar o filho de um casal chinês. A proposta veio por meio de um intermediário no grupo de Facebook. Devair Gonçalves, que trabalha com moda no eixo Rio-São Paulo, publicou um post em nome do cliente à procura de “mulheres saudáveis, sem vícios, com idades entre 20 e 23 anos, pele clara, cabelos e olhos escuros”. Além disso, os chineses impuseram a condição de candidatas magras.

O objetivo, segundo Devair relatou ao Metrópoles, era encontrar mulheres com características semelhantes às da esposa de seu cliente, um empresário chinês também do ramo da moda, que não pode ter filhos. A recompensa pela gestação de aluguel é US$ 20 mil. Todos os exames e procedimentos seriam feitos na China, com o espermatozoide do empresário e o óvulo da candidata.

Das mulheres que se propuseram, infelizmente, nenhuma delas tinha o perfil que eles procuram. Duas estavam muito próximas do que eles buscam, mas foram descartadas por alguns motivos

Devair Gonçalves, homem que tentou agenciar uma barriga de aluguel para um casal chinês

Moradora de Luziânia (GO), no Entorno do Distrito Federal, Ana* também publicou anúncios nas redes sociais e chegou a receber várias ligações. Segundo ela, o preconceito de pessoas próximas a fez desistir do procedimento. Além disso, a idade dela fazia com que os interessados em contratá-la como barriga de aluguel desistissem e procurassem mulheres mais jovens. Aos 38 anos e mãe de três filhos, a luzianense pôs fim à ideia da barriga de aluguel após se casar, em 2018.

Ela pretendia cobrar R$ 50 mil pela gestação e também estava disposta a viajar e passar nove meses na casa de quem a contratasse.

“Eu queria por causa do dinheiro, iria me ajudar muito. Depois eu vi que as pessoas não estavam me levando a sério. Era cada coisa que me pediam que fiquei chocada. Também não concordavam com o valor que eu pedia, então achei melhor desistir”, revelou.

Entre as exigências, estava a inseminação caseira, que consistia em inserir o sêmen do homem em uma seringa e injetá-lo na vagina da contratada. “Onde é que já se viu isso? Para mim, é a mesma coisa que fazer sexo com o marido de outra”, disse.

Falsidade ideológica
Os meios utilizados por quem se vale do mercado on-line de barrigas de aluguel para burlar a legislação e as normas do Conselho Federal de Medicina são muitos, e quase todos envolvem a prática de falsidade ideológica. Há desde propostas de união estável, para que um dos membros do casal acompanhe de perto a gestação, até a utilização de documentos e carteirinhas de planos de saúde em nome das esposas. Tudo isso com o objetivo de evitar problemas em cartórios no momento do registro da criança.

Um ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) regulamenta o registro de pessoas nascidas por meio de reprodução assistida. O CNJ diz que, na hipótese de gestação por substituição, não constará no registro o nome da parturiente, sendo obrigatória a apresentação do termo de compromisso firmado pela doadora temporária do útero. No estado de São Paulo, há regulamento próprio, com a previsão de que filhos gerados mediante doação de gametas possa ser registrado em nome de outras pessoas, mediante autorização expressa.

Por meio de nota, a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen Brasil) informou ao Metrópoles que a permissão autoriza que o termo de consentimento possa ser feito por escrito por qualquer pessoa, o que fragiliza a segurança do ato, pois permite a redação de texto e a assinatura das partes sem a presença de um “profissional qualificado, bacharel em direito, detentor de fé pública do Estado”.

Adelino Amaral, membro da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do CFM, informa que a cobrança pela barriga de aluguel é encarada como uma prática totalmente ilegal pelo conselho.

A gente não tem poder de punir paciente, mas temos o poder de punir o profissional que, se for denunciado e estiver fazendo e concordando com essa prática, poderá ser submetido a um processo ético que pode ter consequências sérias: de suspensão a cassação do registro

Adelino Amaral, da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do CFM

Amaral cita as resoluções e requisitos mínimos para a cessão temporária do útero. “É autorizada para parentes de até quarto grau para um dos membros do casal. Quando não há esse parente, ela pode recorrer a uma terceira pessoa que, de forma voluntária, deve fazer um processo junto ao Conselho Regional de Medicina (CRM) do estado; e o CRM analisa se aceita ou não”, explica.

Prática comum entre casais brasileiros que preferem se submeter a legislações mais frouxas sobre o procedimento é a procura do serviço de fertilização em países asiáticos e no Leste Europeu. “Várias pessoas estavam indo usar úteros de aluguel na Índia, mas houve uma proibição do governo indiano e passaram a procurar países da antiga cortina de ferro da Europa”, afirma Amaral.

Ucrânia e Rússia são destinos comuns, mas há empresas especializadas em levar casais brasileiros para o exterior, com barrigas de aluguel disponíveis nos Estados Unidos, Israel e Grécia. Para evitar problemas com a Justiça, essas companhias vedam a contratação de brasileiras.

Inseminação
Para a Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA), a questão do combate à prática de cobrança de aluguel do útero é complexa de se combater e esbarra em alguns entraves da relação médico/paciente.

Quando alguém vem para a consulta médica, no cadastro não se pede a certidão de casamento nem se a pessoa que vem junto é a esposa ou tem contrato de união estável. A gente tem o comportamento ético de proteger o sigilo. No caso de problema ideológico, se descoberto, é uma questão que tem de ser resolvida pela Justiça, não pelo médico. A relação entre o médico e o paciente é baseada na confiança. Esse tipo de situação é uma exceção, e a exceção não pode ser a regra

Hitomi Nakagawa, presidente da SBRA

O alto valor de uma inseminação in vitro leva pessoas a práticas arriscadas, como a inseminação caseira, condenada pela SBRA, com riscos tanto para a mulher que se submete ao procedimento quanto para a criança, que nasce por meio desse processo. “Além do risco de doenças sexualmente transmissíveis, nesses casos não é possível saber o histórico familiar e possíveis doenças degenerativas. Nos bancos de doadores, tudo isso é rastreado”, diz Nakagawa.

Cada tentativa de inseminação costuma ter preços bastante individualizados, a depender das condições de fertilidade do casal. Pode variar de R$ 3 mil, quando o material genético é dos próprios interessados, até R$ 20 mil, em casos mais complicados ou quando a pessoa deseja, por exemplo, importar sêmen.

*Nomes fictícios a pedido dos entrevistados

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