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Mudanças no CTB não acabarão com “indústria da multa”, diz Denatran

Ao apresentar projeto, Bolsonaro disse que mudanças acabariam com cobranças excessivas. Diretor do Denatran não vê efeito nas autuações

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Foto: Kléber Lima/ Ministério da Infraestrutura/ Divulgação
Diretor-geral do Denatran, Frederico Carneiro
1 de 1 Diretor-geral do Denatran, Frederico Carneiro - Foto: Foto: Kléber Lima/ Ministério da Infraestrutura/ Divulgação

O diretor-geral do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Frederico Carneiro, avaliou, em entrevista ao Metrópoles, que o número de acidentes irá diminuir com as mudanças no Código Brasileiro de Trânsito (CTB), que começam a valer nesta segunda-feira (12/4). Ele também negou que as mudanças sejam capazes de impactar a arrecadação de órgãos de fiscalização, contrariando fala do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que disse, ao apresentar o projeto de lei (PL), que as alterações poriam fim à chamada “indústria das multas”.

Sancionada em outubro do ano passado, a Lei 14.071/20 altera pontos importantes do CTB, como a ampliação do prazo de validade do exame para renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e o aumento do limite de pontos para suspensão do direito de dirigir. O projeto foi apresentado por Bolsonaro, em 4 de junho de 2019, nas mãos do então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (sem partido).

Agora, a CNH de condutores com menos de 50 anos terá validade de 10 anos. Quem tem entre 50 e 70 anos precisará renovar a habilitação a cada cinco anos. Acima de 70 anos, a validade é de três anos. Até então, os prazos de renovação eram de cinco anos para quem tinha menos de 65 anos e de três anos para os acima.

Além disso, houve um aumento do limite de pontos para suspensão do direito de dirigir. Se antes o motorista precisaria atingir 20 pontos em um período de 12 meses para ser alvo de processo, agora poderá, a depender do histórico recente dele, chegar a 40 pontos.

“[Teremos uma] baixa do número de acidentes e uma maior efetividade na aplicação das penalidades”, assinala o diretor-geral do Denatran, que também é, até esta segunda-feira, presidente do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Com as novas mudanças, a presidência do Contran será exercida pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes, enquanto Frederico se tornará secretário-executivo – ele permanece como diretor-geral do Denatran.

Frederico nega impacto na arrecadação de multas com as novas mudanças, o que contraria anúncio feito pelo presidente Jair Bolsonaro um dia após apresentar o projeto de lei à Câmara dos Deputados. Em 5 de junho de 2019, o chefe do Executivo federal afirmou, em evento na cidade de Aragarças, em Goiás, que a “indústria da multa vai deixar de existir no Brasil”. Relembre:

“Essas medidas no Código [Brasileiro de Trânsito] não têm muita relação com isso [fim da indústria das multas]. A questão da aplicação das multas não está sendo tratada de alguma forma. As multas continuam as mesmas”, avaliou Carneiro, durante a conversa.

A seguir, leia a íntegra da entrevista:

A partir de segunda-feira, dirigir vai estar mais seguro?

A gente vai ter um processo gradativo de incorporação dessas mudanças nos órgãos de trânsito, que vão ter condições de oferecer mais serviços de fiscalização e de educação para o trânsito. A gente tem a questão que o recall passa a ser obrigatório. Aqueles proprietários de veículos vão começar a ter que comparecer às concessionárias para atender o chamado de recall. Na questão dos exames toxicológicos, agora vai existir uma previsão de infração por descumprimento. Os motoristas vão começar a realizar esse exame. Então, gradativamente, a gente vai ter incorporações de novas práticas e condutas que vão sim trazer resultados.

Que resultados seriam esses?

Baixa do número de acidentes e uma maior efetividade na aplicação das penalidades. Não adianta um código muito rigoroso, como é o Código de Trânsito Brasileiro – que é uma das legislações de trânsito mais rígidas do mundo, tendo, por exemplo, a tolerância zero para a combinação álcool e direção. Nós temos uma legislação muito rigorosa. Então, precisamos dar condições para os órgãos atuarem na fiscalização e, além disso, aprimorarem a educação para o trânsito.

Além da baixa do número de acidentes, também teríamos uma baixa na arrecadação do governo com multas de trânsito?

Não vejo relação direta com a arrecadação de multas, não.

Um dos pontos que foi apontado por era justamente para acabar com a chamada “indústria das multas”.

Mas essas medidas no Código não tem muita relação com isso. A questão da aplicação das multas, não está sendo tratada de alguma forma. As multas continuam as mesmas. Então, a infração que foi criada por ajustes no uso de capacete, alguma ou outra tornando um pouco mais rigorosa, como parar o veículo em uma ciclofaixa. Então, a gente tem alguns ajustes, mas não vejo impacto na arrecadação dos órgãos de trânsito.

Os prazos para renovação da Carteira Nacional de Habilitação foram ampliados. Agora, a CNH de condutores com até 50 anos, por exemplo, terá validade de 10 anos, o dobro do período válido até então. Quais os riscos dessa medida?

Isso não tem potencial para aumentar o número de acidentes. O limite de prazos foi ampliado por conta de uma adequação das mudanças nas condições físicas dos condutores de 23 anos atrás, quando o código foi estabelecido, para os dias atuais. Então, hoje um condutor de até 50 anos tem as suas capacidades que afetam a direção do veículo preservadas por mais tempo. Ou seja, a gente tem uma evolução médica desses condutores. No entanto, quando um condutor for submetido a um exame e o médico detectar alguma doença que enseja que ele realize esse exame em menos de 10 anos, em uma situação que comprove o risco de acidente de trânsito, por exemplo, uma doença degenerativa da visão… esse médico tem a capacidade, a prerrogativa, de estabelecer um período menor. O prazo de 10 anos regulamentar: sem problema algum. Essa medida foi até chancelada pela Abramed [Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica]. Caso o médico constate alguma necessidade de exame mais curto, em uma periodicidade menor, assim ele determina.

O número máximo de pontos para suspensão da CNH também foi ampliado. Na sua avaliação, o número de acidentes aumentará nos próximos anos por causa disso?

Não procede. A questão da gravidade das infrações foi mantida. Ou seja, aquele condutor que cometer duas ou mais infrações gravíssimas, o limite continua de 20 pontos. Se cometer uma infração gravíssima, esse limite foi ampliado para 30, e, caso não tenha cometido nenhuma infração gravíssima nos últimos 12 meses, esse limite foi para 40 pontos. Então há uma gradação em função da gravidade da infração cometida. Outra questão é a seguinte: um grande volume de processos, que chegavam no limite de 20 pontos, estava acarretando muita demanda para os órgãos, que não conseguiam instaurar os processos administrativos em tempo hábil. Acabava que o condutor não tinha o processo de suspensão instaurado e gerava, pelo contrário, uma sensação de impunidade. Na teoria, era 20 pontos, mas não tinha o processo instaurado. Com as novas regras, dá uma capacidade de atendimento e efetividade da aplicação da penalidade por parte do órgão de trânsito.

Por outro lado, o número de carteiras suspensas poderia diminuir com isso?

Deve diminuir.

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Agora, crianças menores de 10 anos que tenham atingido 1,45 metro podem ocupar o banco da frente. Como vai funcionar essa regra? E como será feita a fiscalização?

Essa regra é para que a criança com altura maior que 1,45 metro, mesmo que não tenha 10 anos, possa andar no banco da frente. A criança com menos de 10 anos e que não tenha atingido 1,45 metro continuará no banco de trás e vai usar um dispositivo de acordo com a idade e o peso. O agente de fiscalização vai ter que ter um elemento de medição, como uma fita métrica, uma trena, algum elemento nesse sentido.

O que muda no uso da luz baixa em rodovias?

Para motocicleta, nada mudou. Para motocicleta, é exigido o uso do farol acesso, durante o dia e em qualquer situação. Outros veículos que têm essa mesma exigência são os de transporte de passageiros, como os ônibus. Para os demais veículos, essa obrigatoriedade é apenas em rodovias, fora do perímetro urbano, da cidade, em rodovias de pistas simples, ou seja, de mão dupla (uma faixa em um sentido, e outra faixa no outro). Por que se restringiu a esses casos? Porque nessas rodovias é onde há possibilidade de colisão frontal. Então, se eu tenho uma pista com todos os veículos andando no mesmo sentido, o risco de colisão frontal não existe. Já naquela rodovia que a gente tem a possibilidade de choque, manteve a luz acesa mesmo durante o dia para chamar a atenção e melhorar a visibilidade.

Também não é mais obrigatório andar com a CNH em mãos, correto?

Ela [a CNH] pode ser dispensada desde que o agente de trânsito tenha condições de checar a validade dessa CNH e se o condutor está habilitado, se não tem nenhuma restrição. Então, no meio de uma abordagem, o condutor agora terá três maneiras de comprovar a habilitação: com a CNH física; com a CNH digital, por meio do celular; ou o agente pode consultar no sistema e verificar se o condutor está devidamente habilitado.

Qual a recomendação do Denatran para essa falta de obrigatoriedade de portar a CNH?

Corre o risco, em uma abordagem, de o sistema estar fora do ar, ou então você está em uma rodovia que não tem sinal, ou aquele agente é um policial militar que pode exercer essa atividade e não tem nenhum elemento para conferir o sistema na hora. Nesses casos, vai ser exigido o documento físico ou digital. Então, o que recomendo é que o condutor ande sempre com a habilitação. Se for no celular, precisa se certificar de que terá bateria no momento.

Houve um aumento da gravidade da infração para quem não reduz a velocidade ao passar ciclista. Como será feita essa fiscalização?

A lei prevê que o condutor que ultrapassar um ciclista em uma pista precisa dar uma distância de segurança de 1,5 metro. Além disso, quando ele não reduz a velocidade, a lei prevê agora uma infração gravíssima [anteriormente era considerada infração grave]. Mas a efetividade da aplicação dessa infração prevista no CTB é muito difícil. Na prática, é difícil de auferir se está se reduzindo ou não a velocidade. Esse também é um dos pontos passíveis de algum aprimoramento no futuro, a questão de melhor definição de como aplicar essa fiscalização.

Com todas essas alterações, existem legislações, na sua opinião, que ainda precisam ser aprimoradas? Quais, por exemplo?

Toda legislação precisa sempre estar sendo atualizada. Quando se fala em trânsito, e a gente tem muitos serviços sempre migrados para um sistema digital, essas atualizações, em curto espaço de tempo, serão necessárias. Por exemplo: a notificação por autuação. Antes, o código anterior, previa a possibilidade de um órgão autuador disponibilizar a notificação por um meio eletrônico. Agora, a lei 14.071 obriga o órgão a disponibilizar isso ao condutor. Porém a adesão por parte do condutor ainda é facultativa. Então a gente espera poder em breve apresentar uma nova proposta de alteração legislativa, tornando também obrigatório o envio de notificação por meio eletrônico para todos os condutores.

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