MPF, MPSP e MPT relatam em documento atuação da Volkswagen na ditadura
Segundo relatório, a empresa automobilística teria participado ativamente do aparato repressor durante o regime militar no rasil
atualizado
Compartilhar notícia
O relatório “Direitos Humanos, Empresas e Justiça de Transição: o Papel da Volkswagen na Repressão Política Durante a Ditadura Militar”, elaborado pelo Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), esmiúça o que seria a participação da empresa automobilística na repressão durante o regime militar vigente no Brasil de 1964 a 1985.
O trabalho foi iniciado em 2015 com representação feita à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), do MPF em São Paulo, e à Promotoria de Justiça de Direitos Humanos e Inclusão Social (PJDH), do MPSP, por 32 representantes, incluindo dez centrais sindicais, entidades, sindicatos e pessoas físicas.
Segundo eles, a Volkswagen teria participado ativamente do aparato repressor durante a ditadura militar. Foram abertos então dois inquéritos para apurar os fatos, aos quais posteriormente se somou um terceiro, do MPT.
Os três procedimentos resultaram em um termo de ajustamento de conduta (TAC), firmado no ano passado entre os órgãos ministeriais e a Volkswagen.
Com o acordo, a empresa deixa de ser alvo de possíveis ações judiciais desde que cumpra algumas condições: publicar uma declaração sobre os fatos na edição dominical de dois jornais de grande circulação em São Paulo, o que foi feito no último dia 14 de março, e destinar R$ 36,3 milhões para iniciativas de promoção de direitos humanos e para ex-trabalhadores da empresa presos, perseguidos ou torturados.
Dois pesquisadores externos colaboraram com as investigações. MPF e MPSP contrataram o cientista político Guaracy Mingardi, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Pela sede da Volkswagen na Alemanha, foi contratado o professor Christopher Kopper. Os dois trabalhos são mencionados no relatório que foi finalizado em outubro passado e divulgado agora, após o cumprimento do TAC.
Sem choro
“Não me lembro de chorarmos pelo desaparecimento da democracia”. Esta frase traduz o posicionamento da Volkswagen e foi dita por Carl Hahn em uma entrevista à emissora alemã Das Erst. Ele, que chegou a ser presidente do grupo Volkswagen AG na Alemanha, de 1982 a 1993, era diretor de vendas na época retratada pelo relatório.
A empresa chegou ao Brasil em 1955 e sempre contou com incentivos governamentais. Em 1964, era uma das maiores empresas do país e o então presidente da subsidiária brasileira, o ex-filiado ao partido nazista Friedrich Schultz-Wenk, demonstrava uma atitude de superioridade colonialista, embora houvesse se nacionalizado brasileiro.
De acordo com o relatório de Kopper, ele achava que os brasileiros eram desorganizados em geral e, em correspondência com o presidente do grupo na Alemanha, elogiou “a organização da revolta, que havia sido extremamente bem-preparada, considerando a situação local”.
Caráter violento
Ele também reconhecia a violência do governo militar. Ainda segundo a pesquisa de Kopper, “Schultz-Wenk não minimizou o caráter violento do golpe, chegou até a justificá-lo. A sua frase ‘Atualmente está acontecendo uma perseguição como nem sequer tivemos na Alemanha em 1933’ não expressa horror, mas sim respeito pela ação consequente dos militares contra a esquerda”.
“Com seu argumento ‘pode-se questionar, se tudo isso é certo, pois como sabemos, pressão sempre gera uma pressão contrária’, ele não criticou a violência em si, mas a, no seu ponto de vista, iminente revolta da esquerda. Schultz-Wenk confiava que o governo militar mantivesse sob controle a alta inflação com medidas impopulares, impondo uma estratégia de estabilidade firme à política econômica”, relata Kopper.
É nesse contexto que a Volkswagen se torna colaboradora ativa do governo militar no que diz respeito à repressão aos críticos do regime.
Sua atuação, de acordo com o relatório final, ocorreu em três eixos: participação da Volkswagen no golpe de Estado, (b) colaboração da empresa com os órgãos da repressão à dissidência política e (c) repressão à organização do trabalho.
Leia a íntegra do relatório:
Relatorio VW Final-d by Carlos Estênio Brasilino on Scribd
Com informações do Ministério Público Federal em São Paulo