MPF foi contra suspensão de investigação à Funai de Bolsonaro
Em decisão contrária ao parecer do MPF, desembargador suspendeu inquérito da PF contra dirigentes da Funai no caso das mortes de Dom e Bruno
atualizado
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O Ministério Público Federal (MPF) se manifestou por duas vezes contra a suspensão da investigação da Polícia Federal (PF) da cúpula da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) no caso dos assassinatos do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips.
Mesmo com as manifestações do MPF pela continuidade das investigações, o desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), determinou de forma liminar (temporária) a suspensão do inquérito da PF em relação aos dirigentes da Funai: o ex-presidente Marcelo Xavier e o ex-vice-presidente Alcir Amaral.
As decisões de Bello são de novembro e dezembro do ano passado. Os ex-dirigentes da Funai chegaram a ser indiciados por homicídio com dolo eventual (assumir risco das mortes) e as investigações ainda estavam em andamento.
“Eventual trancamento do inquérito policial, no estado em que se encontra, impediria o aprofundamento das investigações e sua conclusão, fulminando a possibilidade de o órgão ministerial apreciar os fatos investigados em toda sua extensão para correta formação de sua opinião”, escreveu a procuradora Jerusa Burmann Viecili, em parecer de agosto, sobre pedido da defesa de Marcelo pela suspensão da investigação.
Seguindo a mesma linha de Jerusa, o procurador do MPF Daniel Luís Dalberto também se manifestou contrário ao trancamento do inquérito no caso de Alcir. Os juízes federais da Subseção Judiciária de Tabatinga (AM), onde correm os processos, seguiram as manifestações do MPF e indeferiram os pedidos de trancamento do inquérito.
Trancamento em nova instância
A defesa dos ex-dirigentes da Funai recorreu da decisão e o caso foi parar no TRF-1. O procurador Silvio Pereira Amorim, do MPF vinculado ao TRF-1, também se manifestou pela continuidade da investigação.
Os procuradores usaram como jurisprudência uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que diz que esse tipo de trancamento de inquérito é “providência excepcionalíssima”, apenas em casos que investigação policial é considerada absurda, com “total atipicidade de conduta ou falta de elementos indicativos mínimos de autoria”.
Diferente dos procuradores do MPF, o desembargador Ney Bello entende que os dirigentes da Funai do governo de Jair Bolsonaro (PL) não podem ser investigados.
“O simples dever genérico de proteção e de zelo pelo quadro de servidores de determinada fundação de direito público não pode servir de justa causa para responsabilizar criminalmente o seu gestor pelos dois crimes de homicídio”, escreveu o desembargador na decisão que tranca a investigação.
Como a decisão de Ney Bello é liminar e monocrática, o caso ainda deve passar por análise do colegiado com votação de três desembargadores. A previsão é que isso ocorra em fevereiro.
Investigação continua
Na última quinta-feira (18/1) a PF prendeu mais um suspeito de envolvimento nas mortes de Bruno e Dom. A pessoa presa é Jânio Freitas de Souza, considerado braço-direito de Ruben Dário da Silva, o “Colômbia”, mandante do crime, segundo as investigações.
A parte da investigação que mira a cúpula da Funai permanece trancada por conta da decisão do desembargador. A PF avança a investigação no sentido do braço político da organização criminosa de “Colômbia”, que chegou a realizar doações para políticos locais.
Um dos documentos anexados na investigação era a ata de uma reunião de outubro de 2019, um mês após o assassinato do indigenista Maxciel Pereira dos Santos, na mesma região em que Bruno e Dom foram mortos em 2022.
De acordo com a ata, durante a reunião, Alcir disse que as denúncias de ameaça dos servidores não tinham materialidade e que uma investigação sobre as ameaças não traria resultado. Para a PF, esse documento é um forte indício de dolo eventual.
Bruno e Dom foram assassinados em junho de 2022 na região do Vale do Javari, em Atalaia do Norte (AM). Bruno era servidor da Funai e era perseguido por pescadores ilegais, por conta do seu trabalho de fiscalização e denúncia. Ele servia como guia do jornalista, que escrevia um livro sobre a Amazônia.