MPF aciona pastor Valdemiro por venda de “feijões mágicos” contra Covid-19
Líder da Igreja Mundial do Poder de Deus está sendo processado por “prática abusiva da liberdade religiosa”
atualizado
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O Ministério Público Federal (MPF) entrou, nesta segunda (3/8), com uma ação civil pública pedindo que o pastor evangélico Valdemiro Santiago e a Igreja Mundial do Poder de Deus sejam condenados a pagar pelo menos R$ 300 mil a título de indenização por danos sociais e morais coletivos em razão da veiculação de vídeos sugerindo o uso de sementes de feijão com “poderes de curar a Covid-19”.
Nos registros, o líder religioso incita seus fiéis a plantarem as sementes, vendidas pela agremiação por R$ 100, R$ 500 e R$ 1 mil, e chega a dizer que um laudo médico comprovou a recuperação de um paciente em estado terminal após contrair o novo coronavírus.
A Procuradoria sustenta que o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus incorreu em prática abusiva da liberdade religiosa, ao colocar em riscos a saúde pública e induzir fiéis a comprarem um produto sem eficácia comprovada.
“A dignidade da proteção constitucional que tutela a liberdade religiosa não constitui apanágio para a difusão de manifestações (ilegítimas) de lideranças religiosas que coloquem em risco a saúde pública, que explorem a boa-fé das pessoas, com a gravidade adicional de que isso ocorre com a reprovável cooptação de ganhos financeiros, pois ancorados em falsa premissa terapêutica, às custas da aflição e do sofrimento que atinge a sociedade”, ressaltaram os procuradores Pedro Machado e Lisiane Braecher.
O Ministério da Saúde, representado pela União, também foi incluído na ação por ter removido de seu site um alerta que desmentia a eficácia dos anúncios de Valdemiro. A publicação, incluída em uma lista de “fake news” a respeito da Covid-19, após pedido do MPF, ficou no ar durante poucos dias e foi removida sem explicações. Os procuradores pedem que a Justiça Federal conceda uma liminar obrigando o Ministério da Saúde a republicar a mensagem e apontar a autoridade que determinou a remoção do alerta.
Por fim, a ação do MPF requer a concessão de uma ordem judicial dirigida à Google Brasil, responsável pelo YouTube, para que que a empresa seja obrigada a preservar a íntegra dos vídeos, já removidos pela plataforma também a pedido do MPF, e forneça os dados cadastrais do usuário responsável pela publicação para inclusão no processo.
Nos vídeos publicados no YouTube, o pastor Valdemiro incentivava os fiéis a plantarem as sementes de feijão vendidas pela própria Igreja Mundial do Poder de Deus mediante “propósitos” em dinheiro.
No início do mês passado, a Procuradoria Federal acionou o Ministério Público de São Paulo pedindo a abertura de uma investigação por suposto crime de estelionato do pastor. De acordo com o documento, que deu origem à ação apresentada ontem, “o uso de influência religiosa e da mística da religião para obter vantagem pessoal” fica claro nas gravações.
Aliado de Bolsonaro, o pastor já participou de uma transmissão ao vivo do presidente no dia 12 de julho do ano passado – no mesmo dia, o líder religioso havia entregue ofício ao Itamaraty pedindo um passaporte diplomático. Quase um mês depois, o governo autorizou a emissão do documento ao pastor e sua mulher, Franciléia de Castro Gomes de Oliveira.
Em maio, quando a Procuradoria Federal encaminhou notícia-crime ao Ministério Público de São Paulo pedindo investigação do caso, a Igreja Mundial do Poder de Deus afirmou que “foi amplamente esclarecido em todos os vídeos que toda cura vem de Deus e que a semente é uma figura de linguagem, amplamente mencionada nos textos bíblicos, para materializar o propósito com Deus”. A igreja disse ainda que a oferta pelas sementes é “espontânea”, “dada de acordo com a condição e manifestação de vontade de cada fiel, não tendo nenhuma correlação com o comércio de qualquer produto e/ou serviço”.
A reportagem busca contato com o pastor Valdemiro a a Igreja Mundial do Poder de Deus.
Quando o Ministério Público Federal encaminhou notícia-crime ao Ministério Público de São Paulo pedindo investigação por suposto crime de estelionato cometido pelo pastor Valdemiro Santiago de Oliveira, a Igreja Mundial do Poder de Deus divulgou a seguinte nota:
“Em atenção à sociedade, em virtude de notícias veiculadas nesta quinta-feira (07) de maio de 2020, sobre a “venda” de semente com promessa de cura, a Igreja Mundial do Poder de Deus, vem esclarecer que:
1) Diferentemente do divulgado pela impressa, a campanha do mês de maio “sê tu uma benção” representado pela semente do feijão, não se refere a venda de uma “promessa de cura”, mas sim o início de um propósito com Deus, representado por um símbolo bíblico (a semente) que tem como princípio o início de uma colheita conforme a vontade de Deus (Lucas 8:11-15 e 2 Corintios 9);
2) Em relação a promessa de cura vinculada diretamente a semente, tem-se que foi amplamente esclarecido em todos os vídeos que toda cura vem de Deus e que a semente é uma figura de linguagem, amplamente mencionada nos textos bíblicos, para materializar o propósito com Deus (Genesis 26);
3) O valor da suposta venda divulgado, resta rechaçada veemente, haja vista ser a oferta espontânea, a qual é dada de acordo com a condição e manifestação de vontade de cada fiel, não tendo nenhuma correlação com o comércio de qualquer produto e/ou serviço.
4) Esclarecemos, ainda, que nossa instituição, ao longo de todos esses anos tem o único e exclusivo propósito de propagação da fé Cristã, onde todas as nossas atitudes se baseiam nos princípios bíblicos, na ética e na legalidade.”
A reportagem encontrou em contato com o Ministério da Saúde e aguarda resposta. O espaço está aberto a manifestação.