Moradora do Recife: “Tudo o que construí em uma vida, perdi em um dia”
Sobreviventes da tragédia contam como foi ver a vida desabar em instantes. Tragédia provocada pelas chuvas já tem 56 mortos
atualizado
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Era madrugada quando Daniele Santana, de 39 anos, foi acordada pela irmã. “Pegue suas coisas, a água já está na sua casa”, avisava a mulher.
Daniele só teve tempo de resgatar os documentos e chamar os filhos, de 10 e 13 anos, antes de ver o teto da casa ser arrancado pela fúria de uma das chuvas que assolam o Recife há uma semana.
“Levantei completamente desnorteada da cama, fui atrás dos meus filhos e peguei os documentos. Esse foi o tempo que tive antes de ver tudo o que demorei uma vida para conquistar ser destruído”, lamenta a mulher, que é moradora do bairro de Iputinga, no Recife.
Não muito longe dali, Adriane Santana, primogênita de Daniele, também testemunhava o poder destruidor da tempestade. Aos 20 anos, a jovem viu sua casa ser levada em meio a uma enxurrada de lama causada por um deslizamento de terra. Assim como a mãe, Adriane só teve tempo de pegar os documentos e a filha, de 1 ano.
“Nós perdemos tudo. Casa, roupas, móveis, familiares. O que sinto agora é tristeza profunda. Dezenas de pessoas morreram nessa tragédia, que não é a primeira. Quantas mortes serão necessárias para que algo seja feito? O que queremos agora é que as promessas feitas em todo ano eleitoral sejam cumpridas”, desabafa Adriane.
As chuvas em Pernambuco já fizeram 56 óbitos, de acordo com levantamento divulgado neste domingo (29/5) pela Defesa Civil do estado.
Tristeza e incertezas sobre o futuro
Adriano Severino Lima de Souza, de 39 anos, uma das vítimas desalojadas, contou que a sensação é de absoluta tristeza.
“Não sei nem o que dizer. Perdi tudo. O tempo que tive antes da destruição da minha casa aproveitei para salvar alguns objetos pessoais. Agora estou no abrigo, mas não sei o que vai ser de mim depois daqui. Até meus instrumentos de trabalho foram levados pela chuva. Não sei como irei me reerguer”, declarou o homem.
Em uma tentativa de minimizar os problemas enfrentados pelas vítimas da tragédia, diversas instituições sociais têm se empenhado a oferecer ajuda à população. Uma delas é a Casa Amarela, que, através de ações, luta pela defesa, elevação e manutenção da qualidade de vida do ser humano e do meio ambiente.
Segundo Fausto Filho, de 39 anos, representante do Casa Amarela, só nesse fim de semana o projeto atendeu 500 pessoas que estão desabrigadas. “Todas as famílias que estamos auxiliando vivem em situação de vulnerabilidade social. A grande maioria delas é formada por mulheres e crianças, ou seja, mães solo. Neste momento, ao menos 200 crianças estão em abrigos temporários aqui na região”, afirmou.
Ainda segundo o homem, a instituição precisa de ajuda para continuar lutando por quem perdeu tudo por conta das chuvas. “Precisamos de alimentos, colchões, roupas, leite para as crianças, fraldas, produtos de higiene pessoal, agasalhos, etc. Qualquer tipo de ajuda é bem-vinda, inclusive de voluntários. Quem tiver interesse, pode nos contatar pelo Instagram @casaamarelasocial ou pelas demais redes sociais do instituto”, completou.
Chuvas intensas
De acordo com a Defesa Civil do Recife, só entre às 23h da última sexta-feira (27/5) e às 11h de sábado (28/5), foi registrado um volume de chuvas que equivale a mais de 70% do previsto para todo o mês de maio. Devido à gravidade da situação, o prefeito do Recife (PE), João Campos (PSB), decretou situação de emergência.
Para abrigar as famílias que tiveram de sair dos seus lares, a Secretaria Municipal de Educação abriu 14 escolas e creches da rede municipal de ensino. Ao todo, já funcionam 30 abrigos, que vão garantir alimentação, itens de higiene, colchões e lençóis.
Segundo o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), o estado solicitou o apoio das Forças Armadas para os municípios afetados pela tragédia e 92 novos soldados do Corpo de Bombeiros foram nomeados para atender a emergência.
Ondas de Leste
As chuvas que atingem o Grande Recife e regiões de Alagoas, Paraíba, Sergipe e Rio Grande do Norte desde a última segunda-feira (23/5) têm relação com o chamado Distúrbio Ondulatório de Leste (DOL), ou “Ondas de Leste”.
O fenômeno climático é comum nesta época do ano, mas foi agravado por uma circunstância específica: ele encontrou a temperatura das águas do Atlântico mais altas, por isso a intensidade das chuvas está maior do que o normal.