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Ministério Etrom: a história da influencer acusada de racismo e ameaça

Ícone nas redes sociais, Lusimar Augustinho coleciona processos em diferentes regiões do país e se afastou da família após doença mental

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Montagem com foto colorida da Lusimar, menina do Ministério Etrom - Metrópoles
1 de 1 Montagem com foto colorida da Lusimar, menina do Ministério Etrom - Metrópoles - Foto: Arte/ Metrópoles

Lusimar Augustinho da Silva, de 53 anos, fugiu de um hospital psiquiátrico e responde a vários processos na Justiça por racismo, ameaça e difamação. Apesar disso, é mais conhecida como “A Menina do Ministério Etrom”, uma figura popular nas redes sociais, famosa por publicar vídeos nos quais agride verbalmente pessoas em locais públicos e faz discursos desconexos que misturam religião, sexo e mania de perseguição.

A reportagem do Metrópoles foi atrás do passado de Lusimar e descobriu que ela é acusada por crimes há quase uma década em pelo menos quatro diferentes unidades da Federação: Goiás, Distrito Federal, São Paulo e Rio Grande do Sul. Raramente as autoridades conseguem localizá-la para que responda às acusações.

Em 2024, Lusimar ganhou destaque na imprensa após cometer injúria racial contra um segurança em São Paulo e quando foi detida por stalking (perseguição) no DF.

As acusações contra ela, no entanto, não são recentes. Em 2020, Lusimar perseguiu e difamou estudantes de um colégio militar. No ano anterior, ameaçou uma mulher grávida e seu filho em vários comentários no Instagram. Em 2022, acusou falsamente um manobrista de estupro em um vídeo, forçando-o a se explicar ao chefe. Além disso, em 2015, ameaçou jornalistas.

Foto colorida de Lusimar a menina ministerio etrom - Metrópoles
Personagem famosa na internet, Lusimar é acusada de racismo e ameaça

Por outro lado, Lusimar virou um ícone nas redes sociais devido ao seu jeito excêntrico e acabou sendo lida como um personagem de humor. Ela costuma andar vestida sempre com a mesma roupa, uma jardineira jeans, e diz ter fundado a igreja Ministério Etrom (a palavra morte ao contrário), que lutaria contra uma seita chamada Saymonista.

Muitos seguidores comentam nas publicações de Lusimar em tom de brincadeira, como se fossem verdadeiros seguidores de sua religião. Parte deles envia ajuda financeira via Pix.

Fuga e pedido de socorro

Lusimar, natural de Montes Claros de Goiás – uma pequena cidade na divisa com Mato Grosso, com menos de 10 mil habitantes –, tem um único irmão, mais velho. Sua mãe faleceu durante o parto, e seu pai morreu quando ela ainda era criança. Criada pelos avós em Goiânia (GO), já falecidos, Lusimar teve uma juventude marcada pela discrição. Trabalhou numa ótica, evitava contato social e era uma frequentadora assídua da igreja, mas, com o tempo, sua postura mudou.

“Ela ficou bem agressiva e só ficava dentro do quarto. Tentamos ir atrás, mas ela não aceitou nossa ajuda. É muito difícil, já tentamos internar ela várias vezes. Acabou que a gente não tem mais forças”, relata um familiar que prefere não se identificar.

Processos públicos mostram que Lusimar fugiu do Hospital Psiquiátrico Casa de Eurípedes, na capital goiana, em 2007. Na época, ela foi dada como desaparecida por sua avó.

Lusimar fugiu de um hospital psiquiátrico em 2007

Um ano após fugir do hospital, Lusimar começou um blog na internet chamado Blog Neutro. Ela escreveu 7,8 mil publicações entre 2008 e 2017. As publicações foram ficando cada vez mais desconexas com o passar do tempo, mas o aparente sofrimento mental de Lusimar já aparecia nos primeiros textos.

“Urgente. Socorro. Minha pele está envelhecendo, minha saúde está se esvaindo, minha alimentação é errada, minhas emoções e meu ego são agredidos constantemente. Por gentileza, eu gostaria que não houvesse palavras, e sim a rapidez em me socorrer”, escreveu em 24 de setembro de 2008.

Ameaça a jornalistas

Foi por causa de uma publicação no blog que Lusimar acabou sendo denunciada para a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) por ameaçar jornalistas. Em 2015, ela incitou ameaças físicas contra um repórter de Brasília.

“Ceguem os dois olhos dele. Ele mandou um taxista tentar passar o carro em cima de mim. Deem um banho de urina no homem, bem fétido, e divulguem o vídeo na internet”, escreveu Lusimar.

Já uma outra jornalista também a denunciou por ameaça. Em uma das situações, Lusimar chegou a ir na sede do jornal em que a vítima trabalhava, carregando uma maleta de rodinhas e pedindo para ver a jornalista.

Veja o vídeo:

O caso da ameaça pelo blog acabou sendo arquivado depois que o jornalista desistiu de prosseguir com a acusação. “Foi algo pontual que, apesar do transtorno na época, não teve grandes repercussões na minha vida”, escreveu o repórter para o Metrópoles. As duas vítimas preferiram não se identificar.

Tanto no blog quanto em seus vídeos nas redes sociais, Lusimar faz muita referência a pessoas públicas e famosas. Ela fantasia situações em que teria sido prejudicada por celebridades e lança “castigos”, espécie de maldições, contra essas pessoas. Segundo a PCDF, há dezenas de boletins de ocorrência contra a mulher.

Racismo e homofobia

Outra característica recorrente em suas publicações é a presença de racismo e homofobia. Em diversos textos de seu antigo blog, ela se referia ao grupo supremacista branco Ku Klux Klan como “amada”.

Print screen do blog de lusimar menina ministerio etrom - Metrópoles
Blog tinha conteúdo de defesa do grupo racista KKK

Em novembro deste ano, Lusimar gravou um vídeo chamando o segurança de um shopping em Santos (SP) de “negro demônio” e “africano que veio para roubar os brasileiros”. Já em março de 2019, declarou em uma gravação: “Remove os negros da minha vida. Tire a umbanda da minha vida e os negros do Brasil e do mundo serão completamente destruídos, mortos, apedrejados”.

Diante de tantos casos, o promotor Bruno Orsini Simonetti, do Ministério Público de São Paulo (MPSP), ofereceu denúncia contra Lusimar por racismo, em novembro de 2022.

“A denunciada de forma voluntária e consciente, por diversas vezes, praticou preconceito e discriminação de raça, cor e contra homossexuais, por intermédio de meios de comunicação social e publicações”, escreveu o promotor na denúncia.

Não localizada

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aceitou a denúncia, e Lusimar se tornou ré por racismo. Mas assim como em vários outros processos, ela não foi encontrada nos endereços onde já morou, em Goiás, no DF e em São Paulo. Ela também não responde a mensagens pelas redes sociais e por aplicativos de celular.

Em agosto de 2019, a Polícia Civil do Rio Grande do Sul chegou a coletar imagens de câmeras de monitoramento de um posto de gasolina que ela frequentava em Porto Alegre (RS), na tentativa de localizá-la. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) determinou a quebra de sigilo da conta de Lusimar no Instagram.

Foto preto e branco de Lusimar camera posto porto alegre - Metrópoles
Polícia coletou imagens para tentar localizar Lusimar em Porto Alegre (RS)

A situação investigada à época era sobre uma série de ameaças feitas por Lusimar contra uma mulher grávida e seu filho. Nas redes sociais, Lusimar escreveu: “Você não vai ver o seu bebê e não vai tocar em seu bebê nunca, nem por um segundo. Agora, eu vou inserir uma pobreza miserável fortíssima em sua vida”, escreveu em uma das mensagens.

Lusimar foi indiciada por ameaça contra a grávida, mas o caso acabou sendo redistribuído para a Comarca de Goiânia porque o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) entendeu que a autora pode ter cometido o crime na capital de Goiás.

No começo de 2020, Lusimar perseguiu estudantes de um colégio militar em São Luís de Montes Belos (GO), onde vive parte da sua família, e começou a filmar as alunas e a dizer xingamentos contra elas.

“Você é uma puta. O meu deus vai te matar. Vocês estão com a bunda de fora”, gritou contra as estudantes, enquanto filmava.

Dessa vez, a Polícia Civil conseguiu localizar Lusimar, que foi interrogada, mas respondeu que usaria o direito de permanecer em silêncio, falando somente em juízo. O processo acabou em uma audiência preliminar, depois que as vítimas desistiram da queixa.

Sofrimento mental

Em um relatório da Polícia Civil do Rio Grande do Sul de agosto de 2019, Lusimar é descrita como alguém com “algum transtorno ou sofrimento mental, pendente de comprovação pelo competente procedimento”.

Psiquiatra há 22 anos, a médica Vanessa Luiz Gonçalves da Silva aceitou comentar o caso de Lusimar, ressaltando que não faria um diagnóstico específico. Ela explica que um paciente acusado de um crime deve ser avaliado por um psiquiatra perito da Justiça, que verificará se há alteração no juízo crítico, ou seja, se a pessoa é capaz de distinguir entre o certo e o errado.

A psiquiatra acrescenta que, em casos hipotéticos em que a pessoa cometa um crime e seja considerada inimputável, ela não poderá ser presa em um ambiente prisional comum, mas poderá ser obrigada a realizar tratamento médico.

Vanessa, que atua no Hospital São Vicente, em Brasília, pontua ainda que a exposição nas redes sociais pode ser prejudicial, caso Lusimar seja doente mental com perda do juízo crítico.

“Uma das formas de tratamento, além do medicamentoso e da psicoterapia, é tentar trazer essa pessoa para um eixo de realidade. Na medida em que ela recebe um monte de seguidores, está sendo reforçada a achar que o que está fazendo é certo e se afasta, cada vez mais, da possibilidade de se tratar”, avalia a psiquiatra.

Outro ponto que Vanessa coloca é o prejuízo moral sofrido pelas pessoas que são agredidas verbalmente por Lusimar. “Ela fala coisas que machucam as pessoas. Ninguém é obrigado a olhar para aquilo e identificar que pode ser uma pessoa doente.”

Vulnerabilidade

Ao mesmo tempo que atrai tantos seguidores nas redes sociais, Lusimar é uma mulher em situação de muita vulnerabilidade. Ela já passou pelo Centro Pop do Distrito Federal, que atende à população em situação de rua. Em suas andanças pela cidade, já foi atacada por um gambá com mordida no rosto.

Ela ainda não possui cadastro único, que é a forma de ter acesso a diversas políticas públicas federais ou do Distrito Federal.

A Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) do DF explicou ao Metrópoles que não pode revelar detalhes do prontuário de Lusimar por ser sigiloso.

A reportagem tentou contato com Lusimar e não teve sucesso. Em um processo no qual é acusada de difamação por um manobrista de Brasília, a Defensoria Pública avaliou que ela é uma pessoa desacreditada.

“Verifica-se que os comentários indicam que a requerida não é levada a sério pela sociedade, fato que aclara falta de credibilidade de seus atos no ambiente digital”, escreveu.

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