Destino turístico, Alter do Chão sofre pressão de grileiros
Investigação do MPF mostra danos a áreas de preservação ambiental; na região, brigadistas foram presos por suspeita de provocarem incêndios
atualizado
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As terras que cercam a vila de Alter do Chão, em Santarém (PA), passaram a ser alvo da cobiça de grileiros e especuladores imobiliários depois de se tornarem importante destino do turismo ecológico brasileiro, segundo o Ministério Público Federal (MPF). A região, banhada pelo Rio Tapajós, tem belas praias fluviais. As ações contra a ocupação e a venda de terras protegidas nesse pedaço do Pará remontam a 2004, quando operações da Polícia Federal prenderam quadrilhas que loteavam e vendiam terra grilada.
A região entrou no foco recente das atenções depois de uma operação policial que resultou em buscas nas sedes de organizações ambientais e na prisão de quatro brigadistas, acusados de provocar incêndios para obter recursos – eles foram libertados anteontem. O MPF chamou para si o inquérito estadual porque, desde 2015, investiga um esquema de grilagem, ocupação ilegal e especulação imobiliária em Alter. O procurador da República Luís de Camões Lima Boaventura afirma que os incêndios podem ser decorrentes das ações desses invasores.
Boaventura é autor de uma ação civil pública que tenta obrigar um dos grileiros, Silas da Silva Soares, a recuperar áreas degradadas em uma gleba de 410 hectares que ele loteou na localidade de Capadócia, à margem do Lago Verde, no interior da Área de Proteção Ambiental (APA) Alter do Chão. Soares teria vendido ao menos 40 lotes para forasteiros e pessoas da região, entre elas agentes públicos. Conforme o procurador, existe a suspeita de que os incêndios que destruíram ao menos 1.175 hectares, em setembro, tenham se iniciado no loteamento.
Soares foi condenado a 6 anos e 10 meses de prisão pelos crimes ambientais, mas está foragido. Em sua defesa, alegou que recebeu as terras como herança de seus pais e, além de construir uma moradia para sua habitação, cedeu parte da posse a parentes. Seu advogado, Raimundo Nonato Castro, disse que ele estava fora da cidade, em tratamento médico, quando aconteceram as queimadas.
A região da Capadócia, entre os igarapés do Areia Branca e do Camarão, às margens do Lago Verde, já foi alvo de outras ocupações irregulares, como denunciaram à prefeitura os moradores da comunidade do Caranazal. O município informou ter mandado fiscais para a região e analisa a documentação apresentada pelos ocupantes. Nesta quinta-feira, 28, adquirentes de lotes do empreendimento Chão de Estrelas, em Alter do Chão, procuraram a prefeitura após serem informados sobre possíveis irregularidades ambientais no loteamento.
Os futuros adquirentes teriam sido alertados de que os lotes estariam invadindo área de proteção federal à margem do Tapajós. Conforme a prefeitura, o empreendimento cumpriu os requisitos para se fixar na região. “Após análise da legislação, constatou-se que a atividade requerida constava como passível de licenciamento ambiental. Além disso, a área a ser ocupada pelo empreendimento está fora das áreas de proteção permanente”, informou a Secretaria do Meio Ambiente.
Histórico de invasões leva prejuízos à fauna e à flora
O histórico de ocupação humana, com consequentes desmatamentos, incêndios florestais e pressão de caça, já levaram a uma significativa redução na fauna da APA, criada em 2003 para ordenar a ocupação e promover a proteção ambiental.
Estudo da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), de dezembro do ano passado, assinado pelo biólogo Rodrigo Ferreira Fadini, aponta a extinção localmente de espécies como antas, queixadas, tamanduás-bandeira e tatus-canastra. O estudo foi feito a pedido do MPF. Florestas remanescentes e savanas, entretanto, ainda abrigam grande parte da fauna, incluindo mamíferos de grande porte, como onças-pintadas e pumas.
O Estado entrou em contato com o Conselho Gestor da APA, mas não obteve nenhuma resposta.
Jornal inglês apontou praia no Tapajós como a mais bonita de água doce do mundo
Alter do Chão é a primeira unidade de conservação municipal de Santarém. Com área de 16 mil, a APA foi criada em 2003 e se limita com a vila do mesmo nome, com 7 mil habitantes, englobando também comunidades tradicionais. O objetivo foi ordenar a ocupação das terras e promover a proteção dos recursos hídricos e biológicos. A vila é o principal ponto turístico de Santarém e se tornou refúgio dos moradores da cidade, que fica a 34 km de distância.
O jornal inglês The Guardian elegeu a praia no Tapajós a mais bonita de água doce do planeta. Há outras belas praias que ficam expostas de agosto a fevereiro, quando o nível do rio chega a baixar dez metros. A APA é banhada pelo Lago Verde, com 160 km2 de superfície. Durante as cheias, de março a julho, as florestas são inundadas e se formam os igapós. As pousadas oferecem passeios de barco pelo rio, lagos e igarapés. A reserva municipal faz divisa com a Floresta Nacional de Tapajós, unidade de conservação federal de 527 mil hectares, administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).