Após desastre em Petrópolis, empresa ligada à prefeitura é multada em R$ 50 mi
Comdep é responsável por “bota-fora ilegal” criado em unidades de conservação que teria recebido mais de 350 mil toneladas de entulho
atualizado
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A Companhia Municipal de Desenvolvimento de Petrópolis (Comdep), cujo principal sócio é a Prefeitura de Petrópolis (RJ), foi multada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em R$ 50 milhões após transformar um “bota-fora” dentro de unidades de conservação em um “aterro clandestino”. A empresa nega irregularidades.
Petrópolis foi palco de um desastre ambiental que resultou na morte de mais de 230 pessoas em fevereiro deste ano. A chuva causou uma série de deslizamentos e enchentes em vários pontos do município.
Após a tragédia, foi criado um bota-fora para colocar o material proveniente dos deslizamentos e enchentes. O aterro emergencial fica próximo ao km 79 da BR-040, dentro da Área de Proteção Ambiental da Região Serrana de Petrópolis (APA Petrópolis) e da Zona de Amortecimento da Rebio Tinguá. No entanto, não possui autorização de órgão ambiental, segundo o ICMBio.
O ICMBio identificou que o local, além de servir de bota-fora dos resíduos coletados em consequência da tragédia de fevereiro, também tem recebido restos de construção e resíduos verdes (entulho e lixo verde). Em pouco mais de três meses, foram depositadas mais de 350 mil toneladas de resíduos no aterro improvisado, informou a própria Comdep.
O aterro colocaria em risco, explica o órgão ambiental, os recursos hídricos e o abastecimento de água na localidade, além de ter o potencial de causar danos ecológicos.
“O que não é empírica é a mudança na paisagem no local, visível por todos que transitam na BR-040, e o fato de uma atividade a princípio emergencial não possuir nenhuma autorização do ICMBio, e ter a sua finalidade desviada, ao receber entulho e lixo verde do município, que não possuem relação com os efeitos da tragédia de fevereiro”, afirma o instituto.
“Por não possuir nenhum critério ambiental, o bota-fora ameaça os recursos hídricos no local, degrada substancialmente a qualidade ambiental da área, contamina o subsolo, e impede a regeneração natural da vegetação e o estabelecimento das relações ecológicas primordiais para o provimento dos serviços ecossistêmicos esperados nas duas unidades de conservação afetadas”, acrescenta o ICMBio.
Uma equipe do órgão ambiental visitou o aterro em 4 de julho e constatou que, ao longo do dia, 66 caminhões entraram no local para despejar lixo. Desses, 47 eram veículos de empresas particulares, e apenas 19 da Comdep.
As atividades foram encerradas no dia seguinte à visita do ICMBio, em 5 de julho.
Outro lado
A Comdep foi procurada nessa quinta-feira (13/10) pela reportagem. A empresa não se manifestou. O espaço segue aberto.
No âmbito do processo, a companhia assegurou que o local estava sendo usado apenas para o despejo do material proveniente dos deslizamentos e enchentes que acometeram esta cidade em fevereiro de 2022.
“Após este evento de calamidade pública que assolou Petrópolis, foi determinado, através de reunião entre o Ministério Público Estadual e Federal, Inea, Seinfra, ICMBio, Prefeitura de Petrópolis e Comdep, como bota-fora emergencial a área da BR 040, kms 76 e 78, área 02, Fazenda Inglesa”, informou a Comdep, ao afirmar que o próprio ICMBio, que agora aplica a multa, teria autorizado a criação do aterro.
A companhia disse também que seria impossível fazer a separação do material recolhido.
“A Comdep foi responsável pela operação do bota-fora, juntamente com o Governo do Estado, não lhe cabendo fazer essa segregação. Entretanto, deve-se salientar que não foi despejado qualquer material poluidor no local, somente inertes”, alegou.
“Devemos observar que em momento algum foi aplicada à Comdep a punição de advertência para que pudesse sanar um possível dano que estaria ocorrendo, sendo aplicada, de forma arbitrária e desproporcional, uma penalidade superior a esta e com o caráter pecuniário no valor máximo, sem que pudesse ter a oportunidade de sanar eventual dano que pudesse estar ocorrendo no local”, acrescentou a empresa.