metropoles.com

Matemáticos ajudam a entender o que funciona contra o coronavírus

Em vez de tratar pacientes e prescrever remédios, usam-se números e modelos estatísticos para entender como as doenças se espalham

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles

No fim de janeiro, quando a China começava a assustar o mundo pelo rápido aumento de casos de uma doença desconhecida, uma das primeiras medidas adotadas pelo governo foi banir as viagens da cidade de Wuhan – epicentro da epidemia – para o restante do país. A atitude continuou sendo tomada depois por vários países, como os Estados Unidos, na semana passada, que impediram a chegada de voos da Europa, agora que o continente se transformou na principal fonte da doença. Mas quanto isso de fato afetou a dispersão do novo coronavírus?

Dois estudos baseados em modelagens matemáticas divulgados nos últimos dias apontam que a medida pode ter reduzido a exportação da doença, mas foi insuficiente para conter a dispersão global – ou mesmo dentro da própria China. Em 23 de janeiro, quando as viagens foram canceladas, a covid-19 já tinha chegado a várias outras cidades.

“A quarentena de viagens apenas modestamente atrasou a dispersão para outras áreas da China continental”, concluiu um grupo de pesquisadores dos Estados Unidos, da Itália e da China, que publicaram o trabalho na revista Science. Eles fizeram a análise a partir de modelagens matemáticas da dispersão do vírus, que também indicaram que, se inicialmente o banimento até conseguiu reduzir a importação internacional de casos, o número de registros observados fora da China voltou a crescer depois de 2 a 3 semanas, originados de outros lugares.

Segundo os autores – liderados pelo italiano Alessandro Vespignani, do Laboratório de Modelagem de Sistemas Biológicos da Universidade Northeastern, nos EUA –, mesmo limitações adicionais de viagem de até 90% do tráfego aéreo teriam um efeito modesto, a não ser que fossem combinadas com intervenções de saúde pública e mudanças de comportamento que reduzissem a transmissibilidade. A mesma equipe agora tenta estimar o impacto de fechamento de escolas.

Um outro estudo sobre as restrições de viagens e medidas de controle em aeroportos implementadas em vários países chegou a conclusões semelhantes. Os autores, liderados por Alison Galvani, do Centro de Modelagem e Análise de Doenças Infecciosas, da Escola de Saúde Pública de Yale (EUA), também concluíram que as ações desaceleraram a taxa de exportação de casos da China para outros países, mas foram insuficientes para conter a dispersão global.

Eles estimaram que, sem a restrição de viagem, 779 casos de covid-19 teriam sido exportados na China até 15 de fevereiro, mas com os bloqueios o número caiu em mais de 70%. Eles consideraram ainda que dois terços dos casos exportados eram pré-sintomáticos, o que limitava a capacidade de detecção nos aeroportos. Para os pesquisadores, que publicaram na revista PNAS, foi possível atrasar a dispersão, mas medidas adicionais de contenção, como rastreamento de contatos e isolamento de vírus, são importantes.

Essas análises, que ajudam a estudar os efeitos potenciais de diferentes estratégias de intervenção contra a doença, foram conduzidos por especialistas em modelagens de epidemias. Matemáticos não têm bola de cristal para dizer que x pessoas serão infectadas e y vão morrer – ao menos não nessa etapa da epidemia, quando há ainda muita incerteza sobre o vírus –, mas já vêm ajudando a entender o que funciona ou não para tentar conter a dispersão do vírus.

“Não se trata de prover necessariamente estimativas de total de casos, até porque espera-se que a população altere seus hábitos diários”, afirma Marcelo Gomes, pesquisador em saúde pública do Programa de Computação Científica da Fiocruz. “Mas simular computacionalmente a evolução da doença em cada um dos cenários e comparar a evolução temporal em cada um deles – tanto para o total de casos quanto para duração e intensidade do pico –, é fundamental para analisar quais medidas são necessárias para promover o ‘achatamento da curva de incidência’, que é fundamental para evitar a superlotação dos postos de saúde.”

Ele explica que estudos assim são importantes, no Brasil, para entender a dispersão da dengue. Mas ele aponta que a mudança de hábitos é capaz de alterar as projeções.

O que já se sabe
Os epidemiologistas matemáticos usam estatística para compreender como as doenças se comportam de modo coletivo e quantitativo. Ao calcular valores como número básico de reprodução, intervalo serial e razão caso-fatalidade, eles podem estimar o impacto que uma doença pode ter.

Um dos passos fundamentais para descobrir o quanto uma doença pode se espalhar é descobrir o quão contagiosa ela é. Estudos preliminares indicaram que o valor estava entre 2 e 4 no mês inicial do surto de coronavírus na China. O da gripe comum, para comparação, é de 1,5. O do sarampo, é de 15.

O número básico de reprodução, porém, costuma se alterar ao longo de uma epidemia, por causa de melhorias nos métodos de diagnóstico e investimento em estratégias de contenção. Outra dimensão importante é o intervalo serial (SI), que é a quantidade de tempo que demora, na média, para que um novo infectado manifeste sintomas. Quando o intervalo serial é menor, a doença tende a se espalhar mais rapidamente, uma vez que leva menos tempo para que gerações do vírus se multipliquem.

Embora a capacidade de contágio do novo coronavírus seja maior do que a dos vírus da gripe, demora mais para que os sintomas apareçam na nova geração de infectados. O SI do coronavírus é de 4,4. O da gripe é de 2,8 e o do sarampo, de 11,7.

O parâmetro que mais preocupa é a razão caso-fatalidade: o porcentual de pessoas, entre aquelas com casos confirmados da doença, que morrem. A fatalidade da covid-19 varia bastante entre diferentes faixas etárias e dispara nos grupos de risco. Em fevereiro, o Centro de Prevenção de Doenças da China calculou que a taxa é de cerca de 2,3% na população em geral.

Quais assuntos você deseja receber?

Ícone de sino para notificações

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

Ícone de ajustes do navegador

Mais opções no Google Chrome

2.

Ícone de configurações

Configurações

3.

Configurações do site

4.

Ícone de sino para notificações

Notificações

5.

Ícone de alternância ligado para notificações

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?