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Má gestão da crise pode causar falta de combustível, afirmam analistas

Reajuste de 24,9% no diesel afeta todo o setor de transporte de cargas, que já trabalhava no limite. Crise transborda para outros segmentos

atualizado

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Myke Sena/ Especial para o Metrópoles
Posto de combustível no Distrito Federal
1 de 1 Posto de combustível no Distrito Federal - Foto: Myke Sena/ Especial para o Metrópoles

O último reajuste no preço dos combustíveis machuca ainda mais um setor que já opera sob forte pressão, o de transporte de cargas, e suas consequências trarão um efeito cascata sobre a economia – além de contaminar a política –, afirmam analistas ouvidos pelo Metrópoles. A reação política a esse aumento pode agravar ainda mais a crise, segundo os especialistas, e levar a um cenário de falta de gasolina e diesel que pode asfixiar o agronegócio, setor que tem ajudado a segurar os índices econômicos.

Cumprindo sua política de paridade com o preço internacional do petróleo, a Petrobras reajustou seus preços na semana passada, com aumentos de 18,8% na gasolina e 24,9% no diesel.

“O novo aumento nos preços dos combustíveis se soma aos consecutivos reajustes dos últimos meses e, também, aos problemas de demanda que tem sofrido a economia brasileira, em particular em razão da inflação e de um baixo crescimento. Trata-se de uma situação muito delicada para os profissionais e as empresas do setor”, afirma Gabriel Brasil, analista de riscos do escritório do Cone-Sul da consultoria internacional de gestão de riscos Control Risks.

“Para o setor de transporte e para a cadeia de suprimentos, as consequências da alta volatilidade dos preços dos combustíveis são muito negativas, especialmente para as empresas e os trabalhadores autônomos, que são maioria e não têm condições de repassar o aumento dos seus custos integralmente para a ponta da cadeia”, completa o analista de riscos.

E essa cadeia está toda trabalhando no limite, segundo o analista Rodolfo Rizzotto, coordenador do SOS Estradas – Programa de Segurança nas Estradas e editor do portal www.estradas.com.br. “É um golpe forte para todo o setor e difícil de assimilar, sobretudo no primeiro momento, porque a atualização no valor do frete é lenta, sofre a pressão dos donos de carga, que não querem pagar mais”, afirma ele, em entrevista ao Metrópoles. “E esse é apenas o início do problema”, complementa.

“As transportadoras [de cargas] já estão em situação difícil, endividadas e com dificuldade de tomar mais recursos no mercado. Isso faz com que elas fiquem inadimplentes com os postos. E os postos não conseguem segurar atrasos de meses, pois precisam pagar as distribuidoras em 48 horas. O ciclo ruim está formado”, afirma Rizzotto, que explica como a situação pode levar ao desabastecimento:

“Os problemas financeiros em toda a cadeia pressionam as distribuidoras de combustível a segurar os reajustes na medida em que conseguem. Os consumidores, sobretudo os grandes, também pressionam muito o governo, que responde repassando essa pressão às empresas que vendem o combustível. O Brasil não produz petróleo suficiente para sua demanda e precisa importar uma parte. Se há pressão para manter o preço abaixo do mercado internacional, a distribuidora evita importar e acaba usando seus estoques. Quando esses estoques são gastos e ainda não há condição de importar, começa a faltar combustível. E vai faltar primeiro para os clientes eventuais das distribuidoras, o que inclui parte do agro”, detalha ele.

“Resumindo, tentar interferir artificialmente no mercado vai sempre gerar uma distorção, como efeitos cada vez piores”, conclui Rodolfo Rizzotto.

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Presidente Jair Bolsonaro
Preço do diesel é uma das reclamações da classe caminhoneira
Ministro Paulo Guedes é contra grandes subsídios aos combustíveis
Caminhão sofre acidente no DF
Posto é abastecido por caminhão de distribuidora
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Novo preço dos combustíveis

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Presidente Jair Bolsonaro

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Preço do diesel é uma das reclamações da classe caminhoneira

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Ministro Paulo Guedes é contra grandes subsídios aos combustíveis

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Caminhão sofre acidente no DF

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Posto é abastecido por caminhão de distribuidora

Consequências nas estradas

Especialista em segurança no trânsito e autor de livros sobre o tema, como Acidentes não acontecem, Rizzotto afirma que os profissionais do volante, principalmente os autônomos, são os elos mais fracos nessa disputa e vão arcar com as consequências trabalhando mais para tentar evitar ganhar menos.

“O caminhoneiro autônomo não tem salário fixo ou proteções trabalhistas. Ele também não tem a força de uma transportadora na hora de negociar um frete, então, encontra maneiras de compensar a perda: aumenta a jornada de trabalho, roda mais rápido, reduz o descanso. E, para conseguir isso, alguns vão acabar usando drogas estimulantes, deixando as rodovias mais perigosas, com maior risco de acidentes de trânsito”, completa ele, que vê o aperto financeiro como um impeditivo para que a categoria entre em greve.

“Eventuais paralisações não vão partir do núcleo da categoria. O autônomo não tem condições de deixar de trabalhar para gastar ainda mais combustível protestando. Se houver pontos de paralisação, será, como na história recente, um movimento incentivado por transportadoras e por empresários do agronegócio, que usam alguns caminhoneiros para tentar baixar os próprios custos”, opina Rizzotto.

Consequências no mercado financeiro

Se o governo federal se render a pressões como a do agro e intervier no mercado de combustíveis com subsídios, além de risco de desabastecimento, o país poderá perder credibilidade perante o mercado financeiro nacional e internacional, avalia Gabriel Brasil, da Control Risks.

“Investidores ficam ansiosos com a possibilidade de a gestão de Jair Bolsonaro flexibilizar ainda mais os seus compromissos fiscais para amortecer a inflação no curto prazo. Isso empurraria o problema para os anos seguintes”, explica ele, que vê grandes possibilidades de essa intervenção acontecer.

“Politicamente, o tema da inflação e, especificamente, o aumento dos preços dos combustíveis, sempre foi muito saliente na América Latina. Isso se deve ao fato de afetar a classe média e os eleitores de menor renda de forma muito direta e evidente. É muito provável que sejam assuntos que estarão no centro do debate eleitoral. Consequentemente, é provável que o governo tome iniciativas para reduzir esse impacto ou mesmo transferir a sua responsabilidade para outros atores”, analisa ele.

As opções na mesa de Bolsonaro, para o especialista, são poucas. “No curto prazo, o governo tem poucas opções para endereçar essa crise sem criar outros problemas. Soluções estruturais – como aquelas voltadas para a melhoria do transporte público e a menor dependência de modais rodoviários – não são viáveis num curto período de tempo”, avalia Brasil.

“Alternativas inteligentes incluiriam subsídio focalizado, como para os usuários de ônibus, ou mesmo um reforço adicional no Auxílio Brasil. No entanto, tudo indica que o governo optará por uma solução mais horizontal, com algum tipo de subsídio menos focalizado. Isso não deve ser muito bem recebido pelo mercado, já que implica um impacto fiscal significativo com vistas explícitas nos prospectos eleitorais do próprio governo”, conclui o especialista.

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