Lula enfrenta tropeços na Cúpula da Amazônia, mas insiste em cobrar países ricos na COP28
Resultados da Cúpula da Amazônia não foram os sonhados por Lula, mas ele pretende aproveitar o que houve de consenso para negociar recursos
atualizado
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Belém (PA) e Brasília – A ambição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com a promoção da Cúpula da Amazônia, que terminou na quarta (9/8), era conseguir o apoio de países que têm florestas para liderar um bloco em negociações com nações ricas por recursos para financiar uma transição ecológica da economia. O objetivo foi alcançado apenas parcialmente, porque não houve consenso sobre o que os países em desenvolvimento vão entregar em troca em termos de sustentabilidade.
Mesmo assim, o presidente brasileiro reforçou sua intenção de ir à próxima cúpula da ONU para o as mudanças climáticas, a 28ª Conferência das Partes (COP28), cobrar as promessas dos países desenvolvidos. “Vamos com o objetivo de dizer ao mundo rico que se quiserem preservar efetivamente o que existe de floresta, é preciso colocar dinheiro não apenas para cuidar da copa da floresta, mas para cuidar do povo que mora lá embaixo, que quer trabalhar, que quer estudar, que quer comer, que quer passear e que quer viver decentemente”, disse Lula, em declaração à imprensa no final da cúpula, sobre o evento da ONU, que acontece em novembro, nos Emirados Árabes.
No debate da Cúpula da Amazônia, os signatários da Declaração de Belém admitiram a necessidade de proteger a floresta e criar condições para um desenvolvimento econômico e social sustentável, mas os pontos que mais chamaram a atenção do mundo no acordo foram a falta de metas concretas.
Não se chegou a um acordo sobre uma meta para zerar o desmatamento e assim evitar um ponto de não retorno que está cada vez mais próximo. Nem houve consenso sobre deixar de explorar novos campos de petróleo.
A timidez do texto final frustrou ambientalistas, representantes de povos indígenas e tradicionais, e países que tinham mais ambições. Desses, o que mais se destacou foi a Colômbia, cujo presidente, Gustavo Petro, fez o discurso mais forte do evento, com um apelo aberto ao fim da exploração de petróleo na região amazônica diante do que vê como evidente contradição. “A floresta, que poderia nos salvar do CO², acaba por produzir CO² quando exploramos petróleo e gás nela”, criticou ele.
Um dos países a resistirem ao apelo colombiano foi o Brasil, pois o governo e a Petrobras não desistiram de procurar e explorar petróleo na costa do Amapá, apesar da resistência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O nosso país, por sua vez, não conseguiu convencer todos os vizinhos amazônicos a assumir a meta de zerar o desmatamento até 2030.
Planos de Lula para a COP
Em seus discursos, o presidente brasileiro não falou sobre os tropeços e valorizou a união dos países amazônicos e de outros convidados, da África, Ásia e Europa, em torno do que houve consenso. Lula insistiu nas cobranças de recursos para financiar países em desenvolvimento e projetou o que pretende dizer em novembro, nos Emirados Árabes.
Em reunião bilateral em Belém com o presidente da COP28, Sultan Ahmed al-Jaber, Lula falou, segundo sua comunicação oficial, sobre “o potencial de parcerias em torno de obras de infraestrutura com investimentos estrangeiros”. A intenção, ainda de acordo com o governo brasileiro, é que os países com reservas de florestas tropicais levem à COP28 posições e pedidos definidos em conjunto.
Apesar de expressar frustração com a falta de metas concretas na Cúpula da Amazônia, Camila Jardim, especialista em política climática do Greenpeace Brasil, avalia que, como bloco os países que participaram do encontro em Belém possam ir para Dubai “bastante articulados na demanda por financiamento e por medidas por medidas financeiras inovadoras, como, por exemplo, a conversão de dívidas em ação climática”. “Ao invés de os países pagarem suas dívidas internacionais externas com outros países, por exemplo, eles podem converter essa dívida em ação climática doméstica”, afirma ela, sobre uma das possibilidades de financiamento.
Com seu discurso sobre a urgência de ações sustentáveis e que promovam o desenvolvimento social, Lula fala em cobrar US$ 200 bilhões por ano, o dobro que que foi proposto em 2009, mas nunca cumprido.
“Não é o Brasil que precisa de dinheiro, não é a Colômbia, a Venezuela, é a natureza. O desenvolvimento industrial ao longo de 200 anos poluiu e estamos precisando que paguem a sua parte agora para recompor a parte do que foi estragado. A natureza é que está precisando de financiamento”, resumiu o presidente brasileiro, em seu discurso final em Belém.
O que há na Declaração de Belém
Além do presidente Lula, outros líderes e representantes da Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela participaram da Cúpula da Amazônia que aconteceu em Belém, capital do Pará. O encontro tinha como principal objetivo discutir questões ambientais entre países signatários do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
O evento também contou com a participação da sociedade civil organizada que busca mais protagonismo nas decisões governamentais sobre a proteção dos povos indígenas e no combate e controle do desmatamento ilegal no país.
Para finalizar o encontro, os países assinaram a Declaração de Belém que apresentou 113 intenções e compromissos para o desenvolvimento sustentável da região amazônica. O governo brasileiro, por exemplo, se comprometeu em instalar o Centro de Cooperação Policial Internacional em Manaus que irá contar com as polícias das oito nações para combater o narcotráfico e outros crimes na área.
Além disso, os países signatários acertaram a criação de um observatório da situação de defensores de direitos humanos, do meio ambiente e de povos indígenas. Nos últimos anos, a região amazônica foi marcada pelo avanço do desmatamento e do garimpo ilegal e por episódios de violência, como o assassinato brutal do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips que estavam em uma área de conflito entre pescadores ilegais e comunidades tradicionais.