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Lula demarcou apenas 8 terras indígenas em 2023; faltam mais de 200

Marco Temporal, promulgado pelo Congresso e sob questionamento no STF, deverá atrasar mais o processo de demarcação de terras indígenas

atualizado

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Vinícius Schmidt/Metrópoles
Lula visita acampamento indigenas Brasilia
1 de 1 Lula visita acampamento indigenas Brasilia - Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) expressou, em abril de 2023, a meta de demarcar todas as terras indígenas em pendência até o fim de seu mandato, em 2026. No primeiro ano do novo governo, o chefe do Executivo conseguiu homologar 8 áreas, porém mais duas centenas aguardam receber o mesmo status.

Segundo dados da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), há 247 territórios esperando pela regularização: 132 estão sob estudo, 48 estão delimitados e 67 tiveram declaração como terra indígena. Outros 12 receberam homologação, a última fase antes da demarcação, e 477 finalizaram a regularização (entenda melhor o processo abaixo). Existem ainda 490 áreas reivindicadas por indígenas e sob análise inicial da Funai.

Além do elevado número de territórios sob espera, a promessa de Lula se tornou mais difícil quando o Congresso promulgou, em dezembro, o Marco Temporal. A tese prevê demarcar apenas as reservas indígenas que possam provar uso do território quando a Constituição foi promulgada, em 1988. No entanto, povos indígenas dizem que, em muitos casos, não podem fazer essa comprovação porque haviam sido expulsos por invasores.

Dinamam Tuxá, coordenador da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), avaliou que esse será “um ano bastante desafiador, com muita luta e, sem sombra de dúvidas, um cenário ainda de muita instabilidade para os povos indígenas em termos das demarcações, de direito territorial políticas públicas e de garantias de direitos”.

A Apib levou a tese do Marco Temporal para nova avaliação do Supremo Tribunal Federal (STF), após a Corte ter declarado inconstitucionalidade no ano passado, o que foi ignorado pelo Congresso. A entidade é apoiada pelo Psol e Rede na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). No entanto, os partidos PL, PP e Republicanos também recorreram ao STF para a manutenção do Marco Temporal. As ações estão sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, por sorteio.

Para o coordenador, o “cenário não é positivo, porque o governo não tem governabilidade sobre o Congresso Nacional”. Ele ainda criticou uma movimentação de parlamentares para “desmontar a política indigenista, enquanto o mundo cria medidas para conter a crise climática”.

“Com esse desmonte, a consequência é o aumento dos conflitos socioambientais e o desmatamento. O Brasil vai ser sede da COP30 [Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, em 2025], vai ser controverso”, alertou. A advogada Juliana de Paula Batista, que atua no Instituto Socioambiental (ISA), também apontou para o impacto direto na população de forma geral.

“As invasões aumentam e as violências também, assim como o desmatamento. Não deixa de ser uma medida que beneficia o crime organizado na Amazônia”, disse Juliana sobre o Marco Temporal.

Demora gera insegurança

Dinamam disse não entender o motivo da “morosidade” em demarcar mais terras e lembrou a meta da gestão petista de homologar 14 terras indígenas ainda em 2023 e cobrou o compromisso com os objetivos estipulados, além de criticar a demarcação apenas em “festividades”, em vez de ao longo do ano.

Nos primeiros 12 meses de governo, as homologações dos territórios ocorreram em duas datas marcantes: durante o Acampamento Terra Livre e outra em homenagem ao Dia da Amazônia.

“Foram pensadas ações emergenciais e, em algum período, essas ações foram desarticuladas, enfraquecidas, quando houve o retorno dos garimpeiros, e volta um cenário de violações de direitos”, completou o coordenador.

Veja os 8 locais homologados em 2023:

Imagem colorida do mapa do Brasil com as 8 terras indígenas homologadas em 2023 - Brasil
As 8 terras indígenas homologadas pelo governo Lula em 2024

Entenda o processo de demarcação

Juliana, advogada do ISA, explicou o processo “bastante complexo” para a finalização do território demarcado.

Tudo começa com um estudo, seguido de processo administrativo para antropólogos irem a campo, com o povo indígena interessado, para checar a área e sua produtividade e relevância cultural. Depois, é feito um relatório para delimitação e, se aprovado pela Presidência da Funai, é publicado no Diário Oficial da União (DOU) e do estado.

São oferecidos 90 dias para qualquer parte contestar essa demarcação, após a publicação no DOU. O processo, então, segue para o Ministério da Justiça, onde pode ser devolvido para diligências ou parte para a declaração de posse permanente dos indígenas.

Após isso, o presidente da República homologa a área por decreto e, o último passo, é o registro em cartório. A diferença entre territórios homologados e regularizados, então, é a documentação formal em cartório.

Marco Temporal tensiona os Três Poderes

A questão do Marco Temporal é um dos assuntos que causou conflitos entre os Três Poderes em 2023 e continuará como uma pauta de divergências no novo ano. Ainda em outubro, Lula deixou para o último dia possível para responder se vetaria ou sancionaria o projeto de lei a respeito do tema, porque, com a matéria aprovada no Congresso e rejeitada no STF, acabaria por desagradar algum Poder com sua decisão.

O presidente sancionou o projeto de lei, mas vetou justamente a tese do Marco Temporal e irritou parlamentares ligados ao agronegócio e conservadores. Os vetos de Lula sofreram derrubada pelo Congresso em dezembro e a matéria foi sancionada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O Chefe do Executivo antecipou uma “briga” contra a lei: “Quando chegou a minha mão, eu vetei tudo, mas voltou para o Congresso, e o Congresso derrubou meu veto. Agora, a gente vai ter de voltar a brigar na Justiça, porque a gente não tem maioria”.

Pela Advocacia-Geral da União, o governo deverá acionar o STF, já procurada pela Apib e partidos de oposição a Lula.

Demarcação não é o fim

Apesar de importante para garantir a segurança dos indígenas que vivem no território, a demarcação não é capaz de resolver todas as questões de um povo, como mostrado pela crise dos Yanomamis, em Roraima. A regularização da área ocorreu em 1992, após uma escalada de violência dos garimpeiros ilegais.

Esse problema, no entanto, continua até hoje. Há quase um ano, o governo Lula investiu em ações emergenciais de segurança e saúde, devido ao alto número de pessoas, especialmente crianças, infectadas por malária e em quadros de desnutrição.

Na última semana, o ministro Rui Costa, da Casa Civil, anunciou orçamento de R$ 1,2 bilhão para ações para os Yanomamis. As medidas incluem a presença permanente das Forças Armadas e Polícia Federal, além de pontos da Saúde, Educação, Funai e Ministério dos Povos Indígenas para oferecer suporte à população.

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