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Lobo-guará perde espaço no Cerrado e busca abrigo em zonas urbanas

Desmatamento e avanços de áreas agrícolas estão entre fatores que promovem expulsão de espécie do habitat natural

atualizado

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Agência Brasil
lobo guará1
1 de 1 lobo guará1 - Foto: Agência Brasil

No dia 7 de maio de 2021, o Corpo de Bombeiros em Itajubá (MG) recebeu um chamado para resgatar uma fêmea de lobo-guará que havia sido atropelada e estava ferida na beira de uma estrada em Brasópolis, cidade vizinha a 27 km da corporação. 

Ao chegar ao local, os militares encontraram o animal com três fraturas nas pernas traseiras. Suspeitaram que tenha ficado estirado no asfalto por ao menos três dias, com fome e sede.

O que levou o lobo-guará a acabar nos arredores de uma zona urbana é o resultado de uma combinação de fatores, como o desmatamento para a criação de pastos, assim como o avanço de fronteiras agrícolas ou mesmo da urbanização. 

Maior canídeo silvestre da América do Sul e um dos símbolos do Cerrado brasileiro, o lobo-guará tem migrado para regiões próximas aos centros urbanos devido à supressão de seu habitat. 

Acostumado a viver em áreas abertas e com vegetação campestre, esta espécie tem ficado mais exposta em função da perda de seu território.

Segundo um levantamento feito pelo analista do ICMBio, o biólogo Rogério Cunha de Paula, que pesquisa há 25 anos o tema, estima-se que no Brasil existem pouco mais de 24 mil lobos-guarás. 

A maior concentração da espécie está no Cerrado, com cerca de 14 mil animais, que abrange os territórios de Goiás, Tocantins e Distrito Federal, além de trechos nos estados da Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Piauí, Rondônia e São Paulo.

O lobo-guará também é encontrado em outros biomas como a Mata Atlântica (9,5 mil), Pantanal (1,1 mil) e Pampa (11).

Em 2020, o Cerrado perdeu 734.010 hectares de vegetação nativa, uma área que corresponde a quase cinco vezes o tamanho da Grande São Paulo, sendo a plantação de soja um dos principais fatores responsáveis por esta alteração – segundo o estudo “Soja e carne por trás do desmatamento do Cerrado em 2020”, feito pelo Consórcio Chain Reaction Research, no qual se baseou nos alertas de desmatamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre outros dados.

Assista ao vídeo gravado um dia antes de Maia morrer.

Animal sob estresse

Rogério explica que o lobo-guará acaba sendo empurrado para situações estressantes e de risco. 

“Ao estudar a movimentação deles, percebemos que os bichos entram em repouso no momento em que a atividade humana está começando, e só voltam à ação no momento em que a atividade humana está acabando. Ou seja, é um animal que quer evitar o ser humano”, diz. “O bicho tem um alta percepção espacial e, na cidade, ela acaba se perdendo devido ao barulho e da intensidade de informações presentes ali”, completa o analista.

A fêmea de lobo-guará resgatada na rodovia da estrada de Brasópolis passou por uma cirurgia ortopédica e recebeu todo suporte necessário para o pós-operatório. 

Cerca de 15 dias após a cirurgia, ela já conseguia ficar em pé, o que foi um sinal de esperança para os veterinários. 

Contudo, no dia 10 deste mês, houve uma piora irreversível no estado de saúde e o animal morreu dois dias depois.

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Maia ficou três dias sem comida e água na beira da estrada, depois de ter sido atropelada
Maia durante as sessões de fisioterapia
A lobo-guará chegou a andar novamente
Lobo-Guará que vive na área em disputa pela Voa-SP e Mata Ciliar
O lobo-guará tem sido visto cada vez mais em meios urbanos devido a degradação de seu habitat
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Maia passou um pouco mais de um mês internada, após ter sido atropelada

Arquivo pessoal/Samia Coli
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Maia ficou três dias sem comida e água na beira da estrada, depois de ter sido atropelada

Arquivo pessoal/Samia Coli
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Maia durante as sessões de fisioterapia

Arquivo pessoal/Samia Coli
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A lobo-guará chegou a andar novamente

Arquivo pessoal/Samia Coli
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Lobo-Guará que vive na área em disputa pela Voa-SP e Mata Ciliar

Leandro Barbosa
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O lobo-guará tem sido visto cada vez mais em meios urbanos devido a degradação de seu habitat

Leandro Barbosa
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Lobo-guará passou a viver em cativeiro após ser resgatado

Leandro Barbosa
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Lobo-guará busca refúgio em uma construção

Reprodução
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Lobo-guará visto em área urbana de Vicente Pires, no DF

Reprodução/Vídeo
Atropelamentos e doenças

A aproximação dos lobos-guarás da cidade causam diversos transtornos à espécie, deixando ela suscetível a inúmeras doenças. “Quanto maior a degradada da área em que eles estão, maior é o nível de estresse que eles têm. Esse estresse pode diminuir a imunidade do animal e deixá-lo suscetível a doenças como a parvovirose, cinomose, sarnas”, explica Rogério.

Entre as doenças, a sarna tem sido muito recorrente nestes animais e desperta preocupação. “Eu tenho observado um número considerável de casos de sarna, inclusive em animais de áreas já monitoradas onde não haviam casos”, afirma o analista.

“A gente acredita que existe algum agente que possa estar diminuindo a imunidade dos lobos os deixando mais suscetíveis em alguns tipos de ambientes. Até agora a nossa hipótese é que isto acontece mais em lobos que usam áreas de pastagem. Talvez o ácaro que provoca a sarna seja mais resistente a essas áreas.”

Além das doenças, os atropelamentos, como o que ocorreu com a Maia, têm impactado a preservação do lobo-guará. Rogério frisa que das espécies ameaçadas, o lobo é uma das mais afetadas pelas estradas, sendo São Paulo a região com maior número de atropelamentos da espécie.

De acordo com um levantamento feito pela empresa de consultoria ViaFAUNA, anualmente, 156 lobos-guarás são atropelados nas estradas paulistas. A empresa aponta que as rodovias de São Paulo são um risco para os animais mamíferos: 39.605 deles são atropelados por ano no estado.

“Atualmente, as mortes por atropelamento de lobo-guará em rodovias é uma das maiores preocupações de perdas diretas de indivíduos. Precisamos urgentemente considerar o planejamento e construções de novas rodovias associado com medidas de prevenção e mitigação destes acidentes”, afirma a sócia diretora da ViaFauna, Fernanda Abra.

Contudo, Rogério ainda pontua: “O cerne das coisas é a modificação dos ambientes rurais que fazem os bichos circularem e cruzarem as estradas, por busca de áreas melhores e alimento. A gente fala muito das rodovias pavimentadas, mas tem muito bicho atropelado em estradas de terras, nas vicinais, que a gente não faz ideia do volume de animais feridos e mortos”.

O Metrópoles solicitou informações ao Governo de São Paulo quanto ao que tem sido feito para mitigar os atropelamentos nas rodovias do estado, mas até a publicação desta reportagem não houve resposta. O espaço segue aberto.

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