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Líder da Comissão de Anistia sobre golpe: “Não pode passar a borracha”

Ao Metrópoles, a presidente da Comissão de Anistia criticou a postura do presidente Lula de evitar atos em alusão ao golpe

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Clarice Castro/MDHC
Eneá de Stutz e Almeida, presidente da Comissão de Anistia
1 de 1 Eneá de Stutz e Almeida, presidente da Comissão de Anistia - Foto: Clarice Castro/MDHC

“Falar sobre o golpe de 1964 não é remoer o passado. É falar sobre o presente e o futuro.” É assim que a presidente da Comissão de Anistia, Eneá de Stuz e Almeida, reage à postura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em relação aos 60 anos do golpe militar — que instaurou um regime autoritário no país por mais de 20 anos.

Na data em que se relembra o episódio de ruptura com a democracia, por parte do Executivo, o que impera é o silêncio. Além de afirmar não querer “remoer” o passado e, sim, olhar para o futuro, o presidente orientou os ministérios que não fizessem atos em alusão ao tema.

A presidente do colegiado, ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), viu a decisão do chefe do Executivo com perplexidade. Ela aponta incoerência do presidente ao invocar o Holocausto para repudiar as ações de Israel em Gaza, enquanto faz voto de silêncio sobre o golpe militar.

“Eu julgo que é muito acertada a posição dele em relação ao Holocausto. Não se pode esquecer, mesmo. Mas a gente também não pode esquecer e tem de falar [sobre a intervenção militar no Brasil]. Ainda tem muita coisa para fazer em relação ao golpe de 64” destacou Almeida, em entrevista ao Metrópoles.

Crimes contra a humanidade

Professora da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), Enéa preside a comissão responsável por julgar os processos de reparação a vítimas do regime militar. Enfraquecida e dominada por militares durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022, o colegiado acumula em torno de 7 mil ações a serem julgadas até o fim de 2026.

Ela ressalta que as violações cometidas durante os 21 anos (1964-1985) em que os militares estiveram no comando do país configuram crimes contra a humanidade. E que isso não pode ser esquecido.

“É um equívoco muito grave essa ideia de ‘vamos jogar a sujeira para debaixo do tapete'”. Não pode passar a borracha. Porque passar a borracha significa impunidade, e a sociedade brasileira não aceita mais isso”, critica.

A professora relembra que, no âmbito da responsabilização penal, “não se avançou nenhum milímetro” desde o fim do regime. Na avaliação da especialista, este seria o momento ideal para um pedido de desculpas, embalado pela negativa de comandantes em participar do suposto golpe de Estado planejado pelo ex-presidente Bolsonaro, sob investigação da Polícia Federal.

“Seria um momento mais do que adequado para as Forças Armadas reconhecerem o erro de 60 anos atrás e pedir desculpas. Porque isso (o pedido de desculpas) nunca aconteceu”, pontua Enéa.

Julgamento histórico

A Comissão de Anistia julgará, na próxima terça-feira (2/4), o primeiro requerimento de reparação coletiva da história. Estão na pauta dois casos, envolvendo os povos indígenas Guarani-Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, e os Krenak, de Minas Gerais.

O resultado do julgamento pode abrir portas para que outros grupos perseguidos durante a ditadura possam pedir compensação.

De maneira simbólica, a análise do pedido coincide com a semana que marca os 60 anos do golpe militar, e também com a abertura do Abril Indígena, mês dedicado a ações para celebrar os povos originários.

A sessão de julgamento será no auditório do Bloco A, no Ministério dos Direitos Humanos, a partir das 9h, e é aberta ao público.

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