Lava Jato: grupo criminoso liderado por Temer movimentou R$ 1,8 bilhão
Segundo investigações da força-tarefa, a organização praticou crimes de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro em órgãos públicos
atualizado
Compartilhar notícia
A força-tarefa da Lava Jato identificou que a organização criminosa liderada por Michel Temer (MDB) movimentou mais de R$ 1.800.000.000, com promessas, pagamentos ou desvios de recursos. Segundo as investigações, o grupo praticou diversos crimes envolvendo órgãos públicos e empresas estatais. A nova etapa da operação culminou na prisão do ex-presidente Michel Temer, do ex-ministro Moreira Franco (Minas e Energia) e de outras oito pessoas.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), a investigação revelou que diversas pessoas físicas e jurídicas ligadas ao grupo criminoso continuam recebendo e movimentando valores ilícitos, inclusive com verbas escondidas no exterior. As apurações mostram que quase todas as negociações feitas em troca de propina continuam em vigor, com muitos valores pendentes de pagamento ao longo dos próximos anos.
Temer (MDB) foi preso na manhã desta quinta-feira (21/3) na Operação Descontaminação. Ao longo do dia, a Polícia Federal cumpre oito mandados de prisão preventiva, dois de prisão temporária e 26 de busca e apreensão nos estados do Rio de Janeiro, de São Paulo e Paraná, além de no DF. A ação é oriunda da 16ª fase da Lava Jato, chamada Radioatividade, que identificou uma organização criminosa atuando na construção da usina nuclear Angra 3.
A investigação teria como base as delações do empresário José Antunes Sobrinho, ligado à Engevix, e do corretor Lucio Funaro. Sobrinho citou acordo sobre “pagamentos indevidos que somam R$ 1,1 milhão, em 2014, solicitados por João Baptista Lima Filho – o coronel Lima, que é próximo a Temer – e pelo ministro Moreira Franco, com anuência do então presidente, no contexto do contrato da AF Consult Brasil com a Eletronuclear.
Além de Temer e Moreira Franco, a pedido da força-tarefa, o juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, determinou a prisão preventiva do coronel Lima e de: Maria Rita Fratezi, arquiteta e mulher do coronel Lima; Carlos Alberto Costa, sócio da Argeplan; Carlos Alberto Costa Filho, diretor da Argeplan e filho de um dos envolvidos na operação; Vanderlei de Natale, sócio da Construbase; e Carlos Alberto Montenegro Gallo, administrador da empresa CG IMPEX.
Também foram deferidas as prisões temporárias de Rodrigo Castro Alves Neves e de Carlos Jorge Zimmermann. Segundo o MPF, a Polícia Federal realizou busca e apreensão nas empresas e nos endereços de todos os investigados, assim como nos de Maristela Temer, de Othon Luiz Pinheiro da Silva, de Ana Cristina da Silva Toniolo e de Nara de Deus Vieira.
O juiz Marcelo Bretas afirmou em decisão que “é convincente” a conclusão da força-tarefa da operação de que o ex-presidente “Michel Temer é líder da organização criminosa”.
Propinas
Os investigadores identificaram que a organização criminosa atuou na construção de Angra 3, praticando crimes de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. Os pagamentos ilícitos eram feitos a mando de José Antunes Sobrinho para o grupo liderado por Michel Temer. São apurados desvios da Eletronuclear na contratação das empresas Argeplan, AF Consult Ltd e Engevix.
Segundo a força-tarefa da Lava Jato, a Argeplan está ligada a Michel Temer e ao coronel Lima. Em 2014, teriam sido transferidos R$ 1 bilhão referente à propina da Alumi Publicidades à PDA Projeto e Direção Arquitetônica, controlada por Lima. De forma a camuflar a ilicitude, foram simulados contratos de prestação de serviço entre as duas empresas. O MPF revela que o empresário responsável pelo pagamento do valor afirmou ter prestado contas ao coronel Lima e a Moreira Franco.
De acordo com o Ministério Público, foi identificado um braço da organização especializado em atos de contrainteligência. Esse ramo do grupo atuava de forma a dificultar as investigações, com monitoramento das atividades da força-tarefa, a combinação de versões entre os investigados e a produção de documentos falsos.
“Barbaridade”
O advogado Eduardo Carnelós, que defende Michel Temer, considerou a prisão (veja o vídeo abaixo) de seu cliente “uma barbaridade”. A detenção ocorreu no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo, onde o ex-presidente vive. De lá, ele segue para o Aeroporto de Guarulhos e será levado até o Rio de Janeiro.
O ex-presidente é alvo de 10 inquéritos, cinco deles abertos quando o emedebista ocupava o comando do Palácio do Planalto. Os demais foram autorizados neste ano. Ele é o segundo ex-presidente a ser preso após condenação na esfera penal. O primeiro foi Luiz Inácio Lula da Silva, em abril de 2018.
Temer foi o 37º presidente do Brasil e chegou ao cargo em 31 de agosto de 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT). Antes disso, havia sido eleito deputado constituinte e, depois, foi eleito quatro vezes deputado federal, chegando a presidir a Câmara.
Por sua vez, Moreira Franco foi preso pela Polícia Federal na estrada. Imagens gravadas pelos agentes no momento da abordagem mostram que ele estava ao telefone e questionou a ação policial. Veja:
Polícia Federal
A Polícia Federal emitiu nota informando que a investigação decorre de elementos colhidos nas Operações Radioatividade, Pripyat e Irmandade deflagradas pela PF. Veja a íntegra da nota:
“A Polícia Federal deflagrou hoje (21/03) a Operação Descontaminação e cumpre 08 Mandados de Prisão Preventiva, 02 Mandados de Prisão Temporária e 26 Mandados de Busca e Apreensão nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná e no DF. A investigação decorre de elementos colhidos nas Operações Radioatividade, Pripyat e Irmandade deflagradas pela PF anteriormente e, notadamente, em razão de colaboração premiada firmada pela Polícia Federal. Os mandados foram expedidos pela 7° Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.”
Defesa de Moreira
A defesa do ex-ministro Moreira Franco afirmou que “causa estranheza” a prisão, já que o ex-ministro tem residência fixa conhecida e estaria colaborando com as investigações. Veja a íntegra da nota:
“A defesa de Wellington Moreira Franco vem manifestar inconformidade com o decreto de prisão cautelar. Afinal, ele encontra-se em lugar sabido, manifestou estar à disposição nas investigações em curso, prestou depoimentos e se defendeu por escrito quando necessário.
Causa estranheza o decreto de prisão vir de juiz de direito cuja competência não se encontra ainda firmada, em procedimento desconhecido até aqui.
Moraes Pitombo Advogados”
Nota do MDB
Em nota, o partido do ex-presidente disse “lamentar” a prisão. “Não há irregularidade por parte do ex-presidente da República Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco”, diz a nota. Confira na íntegra:
“O MDB lamenta a postura açodada da Justiça à revelia do andamento de um inquérito em que foi demonstrado que não há irregularidade por parte do ex-presidente da República, Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco. O MDB espera que a Justiça restabeleça as liberdades individuais, a presunção de inocência, o direito ao contraditório e o direito de defesa.”