Gilmar Mendes desempata votação e absolve Michel Temer no TSE
Com o voto do presidente da Corte, chapa Dilma-Temer é inocentada das acusações de abuso de poder político e econômico na campanha de 2014
atualizado
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Após quatro dias de um extenuante julgamento que entra para a história como o mais importante já feito pelo Tribunal Superior Eleitoral, a Corte absolveu a chapa presidencial eleita em 2014. Na noite desta sexta-feira (9/6), quando o plenário chegou ao empate por 3 x 3, coube ao presidente do TSE, Gilmar Mendes, votar contra a punição que tiraria Michel Temer (PMDB) do Palácio do Planalto. A decisão ainda poderia decretar a inelegibilidade tanto dele quanto de sua antecessora, Dilma Rousseff (PT), que sofreu o impeachment em agosto de 2016.
No entanto, contrariando os anseios populares, a maioria dos ministros do TSE entendeu que não houve crime de abuso de poder político e econômico na disputa eleitoral de 2014 por parte da chapa Dilma-Temer. Um fator crucial no julgamento foi a exclusão das delações de executivos da Odebrecht, feitas no fim do ano passado. Os quatro magistrados que absolveram Temer votaram pela impossibilidade de incluir na análise os depoimentos que desnudaram a corrupção da Petrobras. O dinheiro desviado foi usado para abastecer campanhas políticas, mas os juízes disseram que esses fatos foram descobertos muito depois do pedido de cassação da chapa apresentado ao TSE pelo PSDB.
Dessa forma, Michel Temer pôde comemorar a vitória, embora já precise reunir o arsenal para travar outra batalha. Desta vez, no Supremo Tribunal Federal. A partir da próxima semana, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve apresentar denúncia contra o presidente no episódio que envolve as delações da JBS. Segundo executivos da empresa, Michel Temer foi destinatário de propina — e de outras regalias — repassada pelo grupo. O peemedebista é suspeito ainda de prevaricação, ou seja, ouvir supostos relatos de crimes por parte do presidente da JBS, Joesley Batista, em um encontro secreto no Palácio do Jaburu e não tomar providências.
O voto de Minerva
Antes de proclamar o voto que livrou Temer da Justiça Eleitoral, Gilmar Mendes já vinha anunciando que a crise política brasileira não seria resolvida no TSE. E, no momento de votar, confirmou a tendência: “Não se substitui um presidente da República a toda hora. Ainda que se queira”.
Mais cedo, os ministros Napoleão Nunes Maia, Admar Gonzaga e Tarcisio Vieira votaram pela absolvição da chapa Dilma-Temer. Em contrapartida, o relator do caso, Herman Benjamin, Luiz Fux e Rosa Weber defenderam que o presidente da República deveria perder o mandato.
Primeiro a discordar do relator, Napoleão Maia disse que “é melhor inocentar um culpado do que condenar um inocente”. Em seu voto, o magistrado minimizou a denúncia ao afirmar que “abuso de poder político tem em toda eleição”.
Na sequência, o ministro Admar Gonzaga iniciou seu voto. Para o magistrado, não há, nos depoimentos apresentados pelo relator, “prova robusta” de que recursos desviados da Petrobras foram destinados à campanha eleitoral de 2014. “É preciso prova de que valores desses esquemas teriam sido dirigidos com aquela rubrica específica para campanha de 2014”, afirmou.
Fux e Rosa Weber votam pela condenação
Luiz Fux foi o primeiro ministro a concordar com o relator, e demonstrou contrariedade em relação aos colegas que votaram pela absolvição da chapa Dilma-Temer. Para ele, “a sociedade vive um pesadelo pelo descrédito das instituições e a hora do resgate é agora”.
Fux acredita que a resposta deveria vir do TSE, uma vez que “os fatos são gravíssimos e insuportáveis”.
Será que eu, como magistrado que vou julgar uma causa agora com esse conjunto [de provas], com esse quadro, sem retoques, de ilegalidade, vou me sentir confortável de usar instrumento processual para não encarar a realidade? A resposta é absolutamente negativa
Luiz Fux, ministro do TSE
Em uma fala contundente, na qual criticou os demais ministros sem citá-los nominalmente, Fux afirmou que “direito e realidade não podem ser apartados”.
Na sequência, foi a vez de Rosa Weber. Colega de Fux no Supremo Tribunal Federal (STF), ela disse que “não há como não endossar a leitura dos autos feita pelo relator”. Segundo a ministra, os ilícitos apurados com base em depoimentos da Odebrecht, “ainda que possuam elementos que os difiram dos demais também são ilícitos da espécie abuso de poder econômico”.
De acordo com ministra, há prova “robusta” no processo de que houve “relação espúria” entre empreiteiras e a diretoria da Petrobras.
“Constrangimento”
No fim da tarde, antes do voto de Tarcisio, o ministro Admar Gonzaga disse ter sido vítima de um “constrangimento”. Ele se referia ao polêmico pedido do vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, que queria o impedimento do ministro por já ter advogado para a ex-presidente Dilma Rousseff.
No momento do pedido de Dino, o ministro Luiz Fux pediu a palavra e afirmou que não há contaminação por impedimento. Votou pela rejeição do pedido e foi seguido pelos demais integrantes da Corte. O presidente do TSE, Gilmar Mendes, criticou a ação de Dino e disse que Ministério Público Eleitoral deve se pautar “pela lealdade processual”. “Desde 2013 eu não atuo mais em causas eleitorais”, sentenciou o ministro Admar, que foi apoiado pelo presidente. “Estarei aqui na defesa do tribunal”, destacou Gilmar Mendes.
Reprovação
O relator do caso, Herman Benjamin, foi ao socorro do vice-procurador-geral eleitoral, destacando que não houve má-fé em sua atitude. “Mas a questão poderia ter sido levantada anteriormente”, enfatizou. A sessão seguiu com o ministro Napoleão Nunes Maia comentando um episódio ocorrido mais cedo, no qual seu filho tentou lhe entregar um envelope com fotos de uma criança, mas acabou barrado pela segurança da Casa por não estar trajado conforme as regras do tribunal. O problema foi resolvido com o ministro indo ao encontro do rapaz em outra área da Corte.
Napoleão Nunes Maia também criticou notícias veiculadas pela imprensa de que ele fora citado em delação premiada da OAS. “Nunca falei, nunca participei de reunião nenhuma com ninguém da OAS”, rebateu o ministro, que estava muito alterado. Ele também repudiou a informação de que o advogado brasiliense Willer Tomaz de Souza, preso na Operação Patmos, teria citado uma combinação que o envolvia. “Tenho 30 anos de juiz e agora vêm essas pessoas desfazer minha reputação?”, bradou.
Visivelmente irritado, Napoleão disse que precisou se explicar para os fiéis da igreja que frequenta e, para isso, citou um provérbio islâmico: “Com a medida que medem serão medidos e, sobre eles, que caia a ira do profeta”. Ao ilustrar o que seria a “ira do profeta”, o ministro do TSE fez um gesto com a mão passando pelo pescoço, em alusão a uma degola.
Gilmar Mendes suspendeu a sessão por cinco minutos após o debate. Ao retornar, os integrantes da Corte continuaram a leitura de seus votos. Ficou acordado que cada um teria 20 minutos para votar, mas o ministro Napoleão já havia usado parte desse tempo para se defender.
Relator vota pela cassação
O voto do ministro-relator, Herman Benjamin, pela cassação da chapa ocorreu antes do intervalo para o almoço. Segundo ele, a dupla presidencial eleita em 2014 infringiu a legislação e cometeu abuso de poder econômico. Questionado se sua avaliação abrangia Michel Temer, foi categórico: “No Brasil, ninguém elege um vice-presidente. A chapa está unida pelo bem ou pelo mal. E os mesmos votos, contaminados ou não, que elegem o presidente, elegem o vice-presidente”, justificou.
“A simples não declaração ou utilização como caixa 1 [de recurso de propina], que foi exatamente o objeto da petição inicial, basta para a cassação dos mandatos. Os valores eram impressionantes”, argumentou o relator. De acordo com ele, “foi comprovado uso de caixa 2.”
Em uma crítica aos colegas que defenderam a exclusão dos depoimentos dos delatores da Odebrecht, o relator afirmou que não seria “coveiro de prova viva”.
Como juiz, eu rejeito o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas não carrego o caixão
Herman Benjamin
Durante a leitura do voto do relator, o vice-presidente do tribunal, Luiz Fux, e a ministra Rosa Weber mostravam que o seguiriam. “Magnífico magistrado que me orgulha muitíssimo de ser, além de colega de profissão, amigo”, disse Fux após a leitura do voto, ao abraçar Herman Benjamin.
O fator Odebrecht
Mais cedo, quatro dos sete ministros se manifestaram contra o uso dos depoimentos dos delatores da Odebrecht no processo, considerados essenciais para comprovar crimes na campanha de 2014.
Para o ministro-relator, no entanto, o “conjunto da obra” justifica a necessidade de votar pela cassação da chapa, pois essa é a jurisprudência do TSE. Desde quinta, quando começou a proferir o seu voto, Herman listou seis pontos para demonstrar que houve abuso de poder político e econômico por parte da chapa em 2014, três deles sem relação com a chamada “fase Odebrecht”.
Nesta sexta, porém, ele concentrou a sua argumentação no esquema montado entre a campanha, a empreiteira e o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura, chamado por ele de “triângulo financeiro”.
Para o relator, não há como investigar financiamento ilícito de campanha no Brasil sem investigar a Odebrecht. “Mesmo que a Odebrecht não tivesse sido citada nominalmente, nós não teríamos como esquecer a matriarca da manada de elefantes”, disse.
Ele afirmou ainda que o empresário Marcelo Odebrecht administrava um dos maiores esquemas de corrupção do mundo. O juiz lembrou que o empreiteiro relatou, em depoimento, ter disponibilizado R$ 150 milhões para a campanha presidencial de 2014 e que esse fato não poderia ser ignorado. “Marcelo Odebrecht não herdou só uma empresa, herdou uma cultura de propina e sofisticou essa cultura”, disse.
Herman também disse que o dinheiro da Odebrecht foi usado para comprar o apoio de partidos da base aliada nas eleições de 2014 com o objetivo de aumentar o tempo do horário eleitoral gratuito na TV da chapa Dilma-Temer.
Gráficas
Por fim, Herman tratou de gastos da campanha que estavam sob suspeita, especialmente em relação às gráficas utilizadas na eleição. Para ele, as empresas Rede Seg e VTPB não tinham capacidade operacional para produzir o volume de material gráfico contratado pela chapa.
O magistrado destacou que a coligação declarou gastos de R$ 22,898 milhões com a VTPB e que esse é um valor que não pode ser desconsiderado. “É impossível entregar milhões de reais a uma empresa que não existe. Não são valores ínfimos. São valores que podem mudar uma campanha eleitoral”, disse.
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