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STJ cassa decisão que considerou estupro apenas um “beijo roubado”

O relator do processo lembrou que estupro é um ato de violência, e não de sexo

atualizado

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Mulher violência Estupro
1 de 1 Mulher violência Estupro - Foto: Istock

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu recurso do Ministério Público de Mato Grosso e restabeleceu a sentença que condenou um rapaz de 18 anos por estupro de uma adolescente de 15.

Após a sentença haver condenado o réu a oito anos em regime inicialmente fechado, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso o absolveu por entender que sua conduta não configurou estupro, mas meramente um beijo roubado. As informações foram divulgadas no site do STJ (O número deste processo não é divulgado por causa do segredo judicial).

Para o ministro relator do caso na Corte, Rogerio Schietti Cruz, a decisão do Tribunal de Mato Grosso utilizou argumentação que reforça ‘a cultura permissiva de invasão à liberdade sexual das mulheres’. O relator lembrou que ‘estupro é um ato de violência, e não de sexo’.

“O tribunal estadual emprega argumentação que reproduz o que se identifica como a cultura do estupro, ou seja, a aceitação como natural da violência sexual contra as mulheres, em odioso processo de objetificação do corpo feminino”, afirmou o ministro

Rogério Schietti criticou a decisão que absolveu o réu e o mandou ’em paz para o lar’. Na opinião do ministro, tal afirmação ‘desconsidera o sofrimento da vítima e isenta o agressor de qualquer culpa pelos seus atos’.

Rogerio Schietti disse que a simples leitura da decisão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso ‘revela ter havido a prática intencional de ato libidinoso contra a vítima menor, e com violência’.

Processo
Consta do processo. “(…) que o acusado agarrou a vítima pelas costas, imobilizou-a, tapou sua boca e jogou-a no chão, tirou a blusa que ela usava e lhe deu um beijo, forçando a língua em sua boca, enquanto a mantinha no chão pressionando-a com o joelho sobre o abdômen.”

A sentença reconheceu que o rapaz ‘só não conseguiu manter relações sexuais com a vítima porque alguém se aproximou naquele momento em uma motocicleta’.

Mesmo com os fatos assim reconhecidos, afirmou o ministro, o Tribunal de Mato Grosso concluiu que eles não se enquadravam na definição de estupro, prevista no artigo 213 do Código Penal – ‘constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso’.

Segundo a informação divulgada no site do STJ, para o desembargador relator do acórdão do TJ de Mato Grosso, ‘o beijo foi rápido e roubado’, com ‘a duração de um relâmpago’, insuficiente para ‘propiciar ao agente a sensibilidade da conjunção carnal’, e por isso não teria caracterizado ato libidinoso.

O relator, ainda segundo o julgamento do STJ, afirmou que, ‘para ter havido contato com a língua da vítima, seria necessária a sua aquiescência’.

“Reproduzindo pensamento patriarcal e sexista, ainda muito presente em nossa sociedade, a Corte de origem entendeu que o ato não passou de um beijo roubado, tendo em vista a combinação tempo do ato mais negativa da vítima em conceder o beijo”, observou Schietti.

Pensamento patriarcal
Segundo o ministro, a prevalência desse pensamento ‘ruboriza o Judiciário e não pode ser tolerada’. Ele classificou a fundamentação do acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso como ‘mera retórica’ para afastar a aplicação do artigo 213 do Código Penal.

“Todos os elementos caracterizadores do delito de estupro estão presentes no caso: a satisfação da lascívia, devidamente demonstrada, aliada ao constrangimento violento sofrido pela vítima, revela a vontade do réu de ofender a dignidade sexual da vítima.”

Os outros ministros da Sexta Turma acompanharam o voto do relator.

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