Enquanto o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes luta para fazer valer as multas aplicadas ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), que descumpre decisão judicial e se recusa, há semanas, a usar tornozeleira eletrônica, a Primeira Turma da Corte puniu um preso em regime semiaberto que saiu para trabalhar, por duas vezes, minutos antes do horário permitido.
Morador de Queimadas, no interior da Paraíba, o pedreiro de 36 anos estava no regime semiaberto há mais de dois anos, monitorado por tornozeleira eletrônica, e a sentença determinava que estivesse em casa das 19h às 5h, de segunda a sexta-feira.
No entanto, por duas vezes no início de fevereiro de 2020, o homem, que é pai de três filhos e mora de aluguel, saiu de casa para trabalhar às 4h40 e às 4h23, conforme registros da Secretaria de Administração Penitenciária da Paraíba. A Justiça não perdoou e apontou “falta grave”. Ele retornou ao regime fechado e, desde então, está na cadeia pública de Queimadas.
Inconformada, a Defensoria Pública da Paraíba levou o caso até o STF, que, no último dia 9, negou provimento ao agravo regimental.
Condenado a oito anos por estupro de vulnerável, o homem alegou que se atrapalhou nos horários ao sair de casa naqueles dois dias. Ele vinha cumprindo normalmente a condenação, segundo a defesa, desde que foi condenado, em maio de 2017. Segundo relatório da situação processual executória, ao qual o Metrópoles teve acesso, ele já cumpriu quatro anos e oito meses da pena. Restam ainda pouco mais de três anos.
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Daniel Lucio da Silveira, nascido em 1982, é um ativista pró-bolsonaro, ex-policial, youtuber e deputado brasileiro. Natural de Petrópolis, no Rio de Janeiro, ele é conhecido por colecionar polêmicas envolvendo temas políticos
Igo Estrela/Metrópoles
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De 2006 a 2007, Silveira trabalhou como cobrador de ônibus. À época, o homem foi acusado de ter entregado atestados falsos para justificar faltas
Hugo Barreto/Metrópoles
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Daniel Silveira quando atuava como policial militar
Reprodução/ Redes sociais
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Deputado Daniel Silveira no plenário
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Militar por sete anos, Silveira já chegou a admitir, em entrevista à revista Piauí, ter matado ao menos 12 pessoas, “mas dentro da legalidade, sempre em confronto”, segundo ele
Igo Estrela/Metrópoles
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Além de PM, o deputado é professor de muay thay e se define nas redes como “policial militar, conservador, bacharelando em direito, deputado federal, totalmente parcial e ideológico”
Reprodução
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Em 2018, se candidatou a deputado federal pelo Partido Social Liberal (PSL) e foi eleito ao cargo com 31.789 votos
Igo Estrela/Metrópoles
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Silveira busca associar sua imagem à do presidente Jair Bolsonaro, seguindo, inclusive, a mesma bandeira do chefe do Executivo. Em seu site oficial, Daniel diz ter “política de tolerância zero contra criminosos”; ser a favor do “aumento de penas para crimes hediondos”; atuar em “defesa da família” e que é “contra a administração pública”
Paulo Sergio/Câmara dos Deputados
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Antes de tomar posse, Silveira virou assunto ao ameaçar investigar o Colégio Estadual Dom Pedro 2º, em Petrópolis (RJ), por supostamente ensinar “marxismo cultural” aos alunos. O processo cível movido pela direção da escola resultou em sua primeira queixa-crime no Supremo
Aline Massuca/Metrópoles
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Silveira ficou conhecido no primeiro turno da campanha de 2018, quando ajudou a quebrar uma placa de rua feita em homenagem à vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada a tiros em 14 de março daquele ano
Reprodução/Twitter
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Em maio de 2020, Silveira retornou aos sites de notícias ao ser citado como propagador de fake news no inquérito que apura a divulgação de notícias falsas no Supremo. Um mês depois, apareceu como suspeito em outro inquérito, agora acusado de incentivar manifestações de rua que pediam o fechamento do STF e do Congresso
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Enquanto isso, o ministro Luiz Fux analisava uma outra notícia-crime contra o deputado, dessa vez apresentada pela deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), que o acusava de fazer apologia ao crime. Ela se referia a um vídeo em que ele ameaça “descarregar a arma” em “comunista” que tentasse agredi-lo durante as “manifestações antifascistas”
Jacqueline Lisboa/ Especial para o Metrópoles
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Em fevereiro de 2021, Silveira teve prisão decretada após publicar um vídeo atacando o ministro do STF Edson Fachin. Na gravação, Silveira ainda enalteceu o Ato Institucional nº 5, o AI-5, um dos mais repressivos atos da ditadura militar
Reprodução
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O ex-deputado federal Daniel Silveira
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Na cadeia, Daniel assinou ficha de filiação do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), deixando, dessa forma, o Partido Social Liberal (PSL). Tempos depois, o deputado conseguiu na Justiça o direito de cumprir pena em casa, utilizando tornozeleira eletrônica e proibido de utilizar as redes sociais ou ter contato com investigados no inquérito que apura as ameaças
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Contudo, após violar o aparelho, Silveira tornou a ser preso. Tempos depois, conseguiu novamente na Justiça o direito de responder em liberdade, mas também utilizando a tornozeleira eletrônica
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Recentemente, após a segunda recusa em utilizar a tornozeleira, Daniel Silveira ganhou os noticiários. Isso porque o deputado passou a dormir na Câmara dos Deputados para não ter que colocar o aparelho
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Para Silveira, por ele ser parlamentar, a medida judicial não pode ser aplicada contra ele dentro do Congresso, a não ser que a Câmara autorize
Rafaela Felicciano/Metrópoles
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Recentemente, o ministro do STF decidiu que a instalação do “equipamento de monitoramento eletrônico no réu Daniel Silveira, nos termos da medida cautelar imposta por meio das decisões de 25/3/2022 e 30/3/2022, deverá ser realizada no dia de 31/3/2022, às 15h, na Superintendência Regional da Polícia Federal no Distrito Federal"
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No documento assinado eletronicamente, o ministro pede que sejam intimados o superintendente Regional da Polícia Federal e o secretário de Estado de Administração Penitenciária para imediato cumprimento da decisão
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O ministro também caracterizou a conduta de Daniel Silveira, que pernoita na Casa para não ser detido, como “estranha e esdrúxula” e afirmou que o deputado usa o Parlamento como “covil de réus foragidos da Justiça”. Por fim, o deputado resolveu se apresentar para cumprir a decisão do STF
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Após ter o caso julgado pelo STF, o parlamentar foi condenado a 8 anos e 9 meses de prisão por estímulo a atos antidemocráticos e ataques a instituições da República. No entanto, logo após a decisão do tribunal, o presidente Bolsonaro concedeu indulto a Silveira. “Um decreto que vai ser cumprido”, disse Bolsonaro, em uma transmissão ao vivo nas redes sociais
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O relator do processo foi o ministro Alexandre de Moraes, cujas decisões têm sido ignoradas e desrespeitadas por Daniel Silveira. O parlamentar já participou até mesmo de uma festa na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, em 9 de abril. “Não há reparo a fazer”, assinalou Moraes, ao elogiar decisão do tribunal de origem, que afirmou que ʺtais faltas não podem ser relativizadas, sob pena de abrir precedentes muito mais complexos”.
Segundo a Defensoria Pública, esse retrocesso da pena ao fechado é totalmente desproporcional e sem a mínima razoabilidade. O órgão considerou a decisão do tribunal de origem, mantida pelo STF, “vergonhosa”.
“Totalmente antinatural, portanto, considerar falta grave a saída do paciente da sua casa para trabalhar pouco antes das 5 horas da manhã, considerar indisciplinado quem cedo madruga e que está se ressocializando pelo trabalho, até porque sair de casa pouco antes das 5 horas da manhã ou às 5 horas da manhã em ponto dá no mesmo, porque vai estar tudo escuro, e é comum a pessoa que tem responsabilidade acordar atordoada e se confundir nos horários, saindo antes para trabalhar quando poderia ficar em casa descansando mais um pouco”, afirmou a defensoria estadual.
A Defensoria narra que o apenado já estava em uma situação de extrema vulnerabilidade e precisava, especialmente em tempos de pandemia, “realizar milagres para conseguir algum trabalho e para retomar aos poucos a sua dignidade e a sua inserção no meio social”.
“Parece até piada: paciente deve ter sido motivo de caçoada… Foi recolhido ao regime fechado por sair para trabalhar na roça mais cedo quando poderia ficar de boa mais um tempo em casa descansando… Foi recolhido ao cárcere por excesso de responsabilidade com o trabalho, que é fator de sua ressocialização… Cara burro! É isso que vão dizer ao paciente”, afirmou o órgão.
A Defensoria Pública analisou também que a decisão desmotiva a ressocialização de presos.
“Qual o incentivo que este paciente terá agora para buscar sua ressocialização, se o próprio Poder Judiciário a obsta por causa de um excessivo rigor que, muitas vezes, a depender de quem esteja sendo julgado, é relativizado? Aliás, deveria o Poder Judiciário parabenizá-lo por acordar ainda durante a madrugada para buscar trabalho no campo, algo duríssimo, ainda mais em tempos de pandemia”, disse.
“Enfim, mais que determinar injusta regressão de regime, o que a Justiça faz com o paciente é inadmissível humilhação, concessa maxima venia”, prosseguiu.