STF: ministros divergem e julgamento da guarda de animais é suspenso
Processo gira em torno de casal que manteve união estável em São Paulo por mais de sete anos e, ao se separar, discute cuidados com cadela
atualizado
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A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu a sessão de julgamento que analisa se um animal doméstico faz parte do núcleo familiar e se seus donos, depois de separados, têm direito à guarda compartilhada e a visitas, além de dividirem o sustento do bicho. O tema dividiu os ministros na sessão desta terça-feira (22/5) e o julgamento teve de ser interrompido após pedido de vista do ministro Marco Buzzi.
O caso tramita sob segredo de Justiça, mas trata da discussão se o instituto da guarda de menores pode ser aplicado na relação afetiva entre pessoas e bichos. Segundo a reportagem apurou, o processo gira em torno de um casal que manteve uma união estável em São Paulo por mais de sete anos.
O ex-marido, no entanto, recorreu à Justiça sob a alegação de que, após a separação, foi impedido de manter contatos com a mascote na casa da ex-companheira. Ele alega ter criado “verdadeiro laço afetivo” com o animal, ser o responsável pelos gastos da cadela e sustentando: o impedimento de vê-la lhe vem causando “intensa angústia”.
Antes de a sessão ser suspensa, três dos cinco ministros votaram. O relator Luis Felipe Salomão negou provimento ao recurso do ex-marido, sendo acompanhado pelo presidente da Turma Antonio Carlos Ferreira. A ministra Isabel Gallotti abriu divergência e deu provimento ao recurso. O ministro Lázaro Guimarães disse que aguardaria o voto do ministro Buzzi para manifestar o seu posicionamento quanto à questão.
Para Salomão, a discussão sobre a guarda compartilhada de animais não pode ser equiparada à tutela de bens. Na avaliação do relator, os bichos não podem ser tratados como objetos, “pois são seres com sensibilidade”. “Eu vejo necessidade desde logo de esta Corte se debruçar diante dessa situação. É um tema do momento pós-modernidade e o Judiciário necessita encontrar uma solução”, ressaltou o magistrado.
Pelo mundo
O ministro relator citou em seu voto que diversos países estabeleceram regulamentações específicas em casos de separação. Conforme lembrou aos colegas, animais são cada vez mais tratados como membros da família.
“Num futuro bem breve, qualquer separação de união estável ou separação de casamento deverá constar a partilha dos bens, regulamentação da visita e guarda dos filhos e um terceiro gênero. Não se pode brigar contra a realidade. Ela está nos números. Eu não inventei. Teremos mais cães, o dobro, do que crianças em casa”, ressaltou.
Segundo afirmou Salomão, a regulamentação da visita ao animal não é nova: “As pessoas faziam isso, foi crescendo e foram fazendo informalmente. O que é novo é trazer ao Judiciário”.
Contrária à tese defendida pelo relator, a ministra Isabel Galloti considera que a questão demanda atuação do poder Legislativo e não do Judiciário. Segundo ela, não há amparo no ordenamento jurídico atual para a questão, mas pode haver, eventualmente, caso seja editada uma lei sobre o assunto pelo Congresso Nacional.
“Não se alega que essa providência esteja sendo tomada para evitar à ré dar tratamento degradante ao animal. Pretende-se um direito de visitas, o que não há como ordenamento jurídico no Brasil, nem há previsão para tanto. Não se trata de uma lacuna legal, mas de uma consciente opção do legislador de não regulamentar a matéria”, disse.
“Havendo um projeto legislativo para tanto ele não teve andamento. Penso que escapa, portanto, a atribuição do Poder Judiciário de criar direitos não previstos em lei”, ressaltou Isabel Galloti.
Em sua rápida fala, o ministro Marco Buzzi pediu vista para “estudar o caso com mais cautela”. Antes, no entanto, concordou com a arguição da ministra Isabel Gallotti quanto ao Judiciário correr o “risco de ir além do que o legislador não quis fazer”. “Tem projeto de lei que não tem mais trâmite”, pontuou.